por Chems Eddine Chitour
"Não compreendo estas reticências quanto ao uso do
gás. Sou fortemente favorável à utilização
do gás tóxico contra as tribos bárbaras... O efeito moral
será bom. Será difundido um terror permanente..."
Sir Winston Churchill a propósito dos rebeldes curdos. |
A história da utilização das armas químicas
Descrevemos numa contribuição anterior a história da utilização das armas químicas remontando aos fogos gregos que um certo Callinicus havia desenvolvido. O fogo grego baseava-se na associação de um comburante, o salitre, com as substâncias combustíveis, como as resinas. Bem mais tarde, é a Alemanha que utiliza primeiro as armas químicas em 1915-17: cloro líquido e fosgénio, depois gás vesicatório e asfixiante de mostarda (ou iperite). Em resposta, a Grã-Bretanha e a França produziram também elas este gás letal. O gás nervin Tabun, que provoca a morte por asfixia, foi descoberto em 1936 por investigadores da sociedade alemã I.G. Farben. Em 1930, a Itália utiliza armas químicas na Líbia e em 1936 na Etiópia.
Os países ocidentais que lançam urros de escândalo, devem lembrar-se que foram eles os inventores e os vendedores destas armas de morte trágica. Camus escreveu a propósito em Agoravox: "(...) Quanto à tragédia do gaseamento da aldeia curda de Halabja em 1988, conviria sem dúvida recuperar do esquecimento o que escrevia Barry Lando, da cadeia americana CBS, em Le Monde de 27/Outubro/2005, que era preciso recordar "que as armas químicas iraquianas eram fornecidas principalmente por sociedades francesas, belgas e alemãs, cujos engenheiros e químicos sabiam exactamente o que Saddam preparava. E que os Estados Unidos haviam anteriormente fornecido a Saddam imagens de satélite que lhe permitiam atacar as tropas iranianas com armas químicas". [1]
Quando Winston Churchill aprovava o gás de combate
Antes de se tornar o ícone da resistência ao nazismo, lê-se numa contribuição publicada no Guardian, Winston Churchill foi um fervoroso defensor do império britânico e um anti-bolchevique convicto. Ao ponto de preconizar o recurso aos gases que haviam sido o terror das trincheiras. (...) Churchill, então secretário de Estado da Guerra, afasta os seus escrúpulos com um gesto de mão. Desde há muito partidário da guerra química, está decidido a servir-se dos gases contra os bolcheviques na Rússia. Durante o Verão de 1919, 94 anos antes do ataque devastador na Síria, Churchill prepara e faz lançar um ataque químico de envergadura. Não foi a primeira vez que os britânicos recorreram ao gás de combate. No decorrer da terceira batalha de Gaza [contra os otomanos] em 1917, o general Edmund Allenby mandou atirar 10 mil obuses com gases asfixiantes sobre as posições inimigas. Entretanto, foi desenvolvido um novo gás extremamente tóxico, o difenilaminecloroarsine, descrito como "a arma química mais eficaz já concebida" [2]
Em 1919 Winston Churchill, então secretário de Estado da Guerra, decide utilizar os grandes meios. Lemos o que escreveu Camus: "Um programa executado ao pé da letra pelo tenente-coronel Arthur Harris que foi louvado nestes termos: "Os árabe e os curdos sabem agora o que significa um verdadeiro bombardeamento... Em 45 minutos somos capazes de arrasar uma aldeia e de matar ou ferir um terço da sua população". Vinte e cinco anos mais tarde, Winston Churchill, fiel a si mesmo, defendia ideias quase idênticas a propósito do Reich nacional-socialista (...) Acrescentemos por honestidade que a utilização britânica dos ataques aéreos com gás mostarda (iperite), nomeadamente em Suleimanié, no Curdistão, junto à fronteira iraniano-iraquiana, em 1925 – um ano após a assinatura do Protocolo de Genebra proibindo "o emprego na guerra de gases asfixiantes, tóxicos ou semelhantes e de meios bacteriológicos" – não foi uma prática totalmente isolada: os espanhóis no Rif marroquino [1921-1927] e os japoneses na China não se privaram de a eles recorrerem". [1]
A França e seu "savoir-faire" nas armas químicas
Tal como todos os países ocidentais, a França desenvolveu de modo intenso os gases de combate, nomeadamente a partir da Primeira Guerra Mundial. O seu know-how foi exportado para vários países. Apesar de todas as convenções assinadas, ela manteve na Argélia uma base de experimentações. Fabrice Nicolino escreveu a respeito: "A França gaullista esqueceu as armas químicas de B2 Namous . A França socialista esqueceu os 5000 mortos de Halabja. Em 16 de Março de 1988, Mirages made in France lançam sobre a cidade curdo-iraquiana de Halabja foguetes cheios de um cocktail de gás sarin, tabun e mostarda. 5000 mortos. (...) A urgência é apoiar Saddam Hussein, raïs do Iraque, contra os mulás de Teerão. E que se saiba, nem uma palavra de Hollande, nesse tempo um dos peritos do Partido Socialista. É verdade que tão cedo eles não darão explicações sobre a base secreta B2 Namous, antiga base de experimentação de armas químicas & bacteriológicas (...) De Gaulle tem a obsessão que se sabe: pela grandeza, pela potência. A nossa primeira bomba atómica explode em 13 de Fevereiro de 1960 na região de Reggane, no centro de um Saara então o francês. O que é menos conhecido é que o poder gaullista negocia a seguir com a Argélia de Ahmed Ben Bella para conservar no Saara bases militares secretas. Os ensaios nucleares franceses, passados a subterrâneos, continuaram no Hoggar, próximo de In Ecker, até 1966. A França assinou em 1925 uma convenção internacional proibindo a utilização de armas químicas, mas o que valem os pedaços de papel? Entre 1921 e 1927, o exército espanhol trava uma guerra de pavor químico contra os insurrectos marroquinos do Rif. E sabe-se agora que a virtuosa França havia formado os "técnicos" e vendido fosgénio e iperita Madrid. [2]
Fabrice Nicolino fala-nos a seguir dos acordos de Evian que permitem à França manter bases militares que eles devolveram no seu estado natural. "Além de Reggane e In Ecker, B2 Namous, um polígono de 60x10 quilómetros ao Sul de Béni Ounif, não longe da fronteira marroquina. Numa nota do estado-maior francês pode-se ler: "As instalações de B2-Namous foram realizadas com o objectivo de efectuar tiros reais de obuses de artilharia ou de armas de saturação como produtos químicos tóxicos persistentes, ensaios de bombas de aviação, pulverizações de agressivos químicos e ensaios biológicos". Em 1997, o ministro da Defesa Alain Richard declara: "A instalação de B2 Namous foi destruída em 1978 e devolvida ao estado natural". Em Fevereiro de 2013, o jornalista de Marianne, Jean-Dominique Merchet, revela que um acordo secreto foi concluído entre a França e a Argélia. Ele trata da despoluição de B2 Namous, "devolvida ao estado natural" trinta anos antes". [3]
A utilização de armas químicas pelos Estados Unidos
É impossível descrever as numerosas circunstâncias nas quais foram utilizadas armas químicas. Que nos basta informar a filosofia do maior apologista destas armas do horror. "Decididamente, lê-se no Agoravox pela pena de Camus, se fosse preciso estabelecer distinções abstrusas entre mortos despedaçados sob bombas convencionais ou asfixiados com gás de nervos. E depois os anglo-americanos deveriam começar por lavar a sua roupa suja ao invés de brincar de indignados e de santos inocentes. (...) Não foi Washington que se dedicou a uma impiedosa guerra química no Vietname entre 1961 e 1971 com pulverizações maciças – 80 milhões de litros – de Agente Laranja, um desfolhante com dioxina? Foram 2,1 a 4,8 milhões os vietnamitas afectados por este composto altamente mutagénicos cujos efeitos se fazem sentir ainda hoje". [1]
Massimo Fini interroga-se por sua vez quanto à autoridade moral dos Estados Unidos: "(...) Mas o que eu gostaria de compreender é de onde exactamente vem esta autoridade moral dos Estados Unidos que se permitem traçar "linhas vermelhas" sobre a utilização de armas químicas. Foram eles, contudo, que em 1985 abasteceram Saddam então no poder e em luta contra os iranianos, e a seguir contra os curdos. (...) Aquando da guerra contra a Sérvia, os EUA utilizaram bombas de urânio empobrecido. (...) Imagina-se facilmente o efeito deste "urânio empobrecido" sobre os civis sérvios e sobretudo sobre as crianças que andam a 1 metro do solo e estão habituadas a tocar tudo. Em 2001, para capturar Ben Laden, os americanos submergiram as montanhas do Afeganistão sob bombas de urânio e o ministro da Defesa, Donald Rumsfeld, declarou que "para apanhar os terroristas, nós utilizaremos também gases tóxicos e armas químicas". Vêem-se hoje os resultados. Um camponês afegão, chamado Sadiay, conta: "Um ataque da NATO destruiu a minha casa, matou minha mulher e três dos meus filhos. Mas quando vi nascer meu sobrinho sem braços e sem pernas, então compreendi que os americanos nos haviam roubado até o nosso futuro". [4]
O segredo dos gases israelenses
"Foram, escreve Thierry Meyssan, as investigações israelenses sobre as armas químicas e biológicas que historicamente pressionaram a Síria a rejeitar a Convenção proibindo armas químicas. É a razão porque a assinatura por Damasco deste documento arrisca-se a revelar a existência, e eventualmente o prosseguimento, de investigações sobre armas selectivas destinadas a matar apenas populações árabes. (...) Um documento da CIA descoberto recentemente revela que Israel também desenvolveu seu próprio arsenal de armas químicas. Responsáveis da informação em Washington estimam que o Estado judeu fabricou e armazenou secretamente armas químicas e biológicas desde há décadas para completar seu presumido arsenal nuclear. Num relatório secreto da CIA de 1983: Satélites espiões americanos detectaram em 1982 "uma fábrica produtora de gás químico e uma unidade de armazenagem no deserto do Negev". [5]
Para Jean Shaoul, a condenação pelos Estados Unidos da utilização de armas químicas não se aplica a Israel. Ele escreve: "Contudo,nenhuma obrigação moral desta espécie é mencionada em relação a Israel, país que detém o mais importante stock de armas químicas, biológicas e nucleares no Médio Oriente e que é o único Estado a não ter assinado o tratado de não proliferação nuclear. Como revelou o sítio web Foreign Policy em 9 de Setembro, não só os Estados Unidos sabem desde há dezenas de anos da existência das armas químicas israelenses como tem mantido silêncio a respeito. Não se trata simplesmente de Israel possuir um importante arsenal de armas químicas. Israel serviu-se delas contra os palestinos na Cisjordânia e em Gaza, contra o Líbano e Gaza durante os assaltos militares de 2006, e durante a operação "Chumbo endurecido" em Gaza em 2008-2009. (...) Um protocolo da convenção de 1980 sobre as armas convencionais proíbe a utilização do fósforo branco enquanto arma incendiária (...) O relatório do inquérito da ONU, o relatório Goldstone, reafirmou as conclusões de numerosos inquéritos internacionais respeitados, confirmado a utilização desproporcionada por Israel da força sobre os palestinos, e as acusações de crime de guerra contra Israel e o Hamas assim como "prováveis crimes contra a humanidade" incluindo a utilização de fósforo branco por Israel. Ali se afirma que as forças israelenses comportaram-se de modo "sistematicamente irresponsável" na sua utilização de fósforo branco nas zonas construídas, citando o ataque israelense contra o edifício da Agência de Cuidados de Saúde da ONU na cidade de Gaza, o ataque ao hospital Al Quds e ao hospital Al Wafa. [6]
Fala-se frequentemente da "Pax Americana" para designar a ordem resultante da hegemonia dos Estados Unidos. Esta posição de força não é uma garantia de equilíbrio e de paz à escala mundial. É assim que os Estados Unidos intervêm de modo crónicos em defesa dos seus interesses estratégicos. Pela história, isso começou em 1846: Guerra americano-mexicana, em que anexam a Califórnia. Foi também, sem ser exaustivo, a Guerra da Coreia (1950-1953), do Vietname (1968-1975). Isso continuou no período recente após a guerra do Vietname onde centenas de toneladas de agentes químicos laranja foram dispersos criando a morte e a desolação durante dezenas de anos, será a sequência da Guerra do Iraque (2003), o folhetim iraquiano da democracia aerotransportada à razão de dezenas de mortos por dia não se encerrou com o enforcamento desumano de Saddam Hussein. Em 2011 foi o saqueio da Líbia e o linchamento abjecto de Kadafi. No total, sessenta e seis intervenções externas, na maior parte sangrentas".
Charles de Gaulle escrevia na sua época que "as armas torturaram mas também moldaram o mundo. Elas cumpriam o melhor e o pior, dando nascimento ao infame e também à maior grandeza, alternativamente cravada no horror ou brilhante na glória. Vergonhosa e magnífica, sua história é aquela dos homens". A guerra de todos contra todos nunca é limpa, é de facto o fracasso da palavra desarmada que é a empatia para com a miséria dos fracos. Seguramente, a humanidade corre para a sua perda.
25/Setembro/2013
1. Camus, 17/09/2013,
www.agoravox.fr/...
2. www.courrierinternational.com/... The Guardian , 13/09/2013
3. Fabrice Nicolino, fabrice-nicolino.com/index.php/?p=1608
4. Massimo Fini, www.agoravox.fr/... , mai 2013
5. Thierry Meyssan, resistir.info/moriente/gas_israelense.html , 2013
6. Jean Shaoul, www.mondialisation.ca/...
O original encontra-se em www.legrandsoir.info/...
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
29/Set/13
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