por Melkulangara Bhadrakumar
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Os Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Alemanha, a União Europeia e a Liga Árabe estão entre aqueles que pediram acção urgente.
Não surpreendentemente, o próprio governo sírio refutou fortemente a alegação chamando-a de guerra "suja" dos media, a qual reflectia a "histeria, desordem e colapso" dos rebeldes que sofreram uma série de derrotas militares devastadoras nos últimos dias e semanas.
O que é o plano de jogo? Uma pista vital está na nomeação do perito sueco Ake Sellstrom como o chefe da equipe da ONU que aterrou em Damasco três dias atrás. Sellstrom serviu no bando selecto dos inspectores de armas da ONU no Iraque...
A Reuters citou Sellstrom a apoiar o pedido de que os alegados ataques nos subúrbios de Damasco deveriam ser investigados e ele mesmo propôs um plano de acção. O secretário britânico dos Estrangeiros, William Hague, considerou a ideia de Sellstrom como excelente e disse: "Apelo ao governo sírio a que permita acesso à área à equipe da ONU actualmente a investigar alegações anteriores de utilização de armas químicas".
A França, Alemanha e Turquia concordaram de imediato. Curiosamente, a Casa Branca em Washington endossou o pedido europeu-turco: "Há hoje, quando falamos, sobre o terreno na Síria, uma equipe das Nações Unidas com a especialidade em investigar a utilização de armas químicas. Assim, vamos dar a esta equipe a oportunidade para investigar o que aconteceu exactamente e ir ao fundo disto de modo a que possamos responsabilizar aqueles que foram os responsáveis".
Na verdade, uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU já se havia verificado em Nova York. O conselho não pediu explicitamente uma investigação da ONU mas concordou em que há "forte preocupação entre os membros do Conselho" acerca das alegações e "um sentimento geral de que deve haver clareza sobre o que aconteceu" e que a "situação tem de ser seguida cuidadosamente".
Enquanto isso, o porta-voz de Ban Ki-Moon disse a jornalistas em Nova York que Sellstrom já está "em discussões com o governo sírio sobre todas as questões referentes à alegada utilização de armas químicas, incluindo este mais recente incidente relatado".
Em suma, a equipe de inspecção da ONU que está mandatada para estar na Síria até 14 dias – como acordado entre o governo sírio e a ONU – "com uma possível extensão" para investigar a utilização do alegado uso de armas químicas em Khan al-Assal e dois outros locais não revelados podem estar a acabar de obter um mandato prolongado.
Se assim é, isto torna-se uma espécie de golpe para as potências ocidentais e seus aliados do Médio Oriente, os quais têm estado persistentemente a procurar alguma forma de intervenção da ONU na Síria.
No fundo, Sellstrom pode estar numa missão ilimitada à procura de stocks dos armas químicas do regime de Bashar Al-Assad. Claramente, o camelo entrou na tenda de Bashar. Sellstrom agora começará a apresentar relatórios para Ban, o qual finalmente será obrigado a levar a notícia ao Conselho de Segurança e isso, por sua vez, poderia significar a abertura de um processo sírio em Nova York, o que o Ocidente sempre quis.
O que resulta de tudo isso? Três coisas emergem. Primeiro, o momento dos êxitos espantosos dos militares sírios sobre os rebeldes está quase certamente em vias de ser interrompido. O regime sírio precisará voltar sua atenção para a batalha diplomática que está pela frente. Isto é uma coisa.
Em segundo lugar, as placas tectónicas na geopolítica do Médio Oriente estavam começando a mostrar algum movimento nas últimas semanas com os desenvolvimentos no Egipto. A desarmonia entre os antigos aliados que estavam até há pouco a colaborar sobre o projecto da Síria estava a tornar-se demasiado óbvia para ser camuflada.
No mínimo, a controvérsia da arma química síria coloca um travão brusco nos movimentos incipientes de uma "recomposição" nos alinhamentos políticos no Médio Oriente. As potências ocidentais puseram os vagões em círculo e assinalaram aos seus inquietos aliados regionais que o projecto sírio é obra em curso.
Paradoxalmente, a controvérsia das armas químicas também proporciona uma bóia de salvação para o assediado Recep Erdogan, da Turquia, escapar de um isolamento agudo em relação ao Egipto. Erdogan está exasperado a enfrentar o problema curdo, o qual ultimamente tem estado a agitar-se como o motivo central do conflito sírio. Os curdos sírios desafiaram frontalmente a ligação encoberta de Ancara com filiados da Al-Qaeda, o que coloca Erdogan em apuros.
ENVOLVIMENTO DA ADMINISTRAÇÃo OBAMA NAS ARMAS QUÍMICAS
Em terceiro lugar, levanta-se uma questão tormentosa. As potências europeias – Grã-Bretanha e França em particular – e a Turquia estão evidentemente a encabeçar a controvérsia mais recente sobre armas químicas. Mas até onde foi e quão real é o envolvimento da administração Obama na mesma?
O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, gen. Martin Dempsey, declarou publicamente ainda na segunda-feira passada que a administração opunha-se mesmo a uma intervenção limitada na Síria porque acredita que os rebeldes combatendo o regime Assad não apoiariam interesses americanos se tomassem o poder agora. Ele escreveu com franqueza brutal numa carta dirigida ao congressista Eliot Engel (Democrata - Nova York): "A Síria hoje não está prestes a optar entre dois lados mas, ao invés, prestes a optar entre muitos lados. É minha crença que o lado que nós optarmos deve estar pronto a promover os seus interesses e os nossos quando o equilíbrio [de forças] mudar em seu favor. Hoje, eles não estão.
"Trata-se de um conflito profundamente enraizado e de longo prazo entre facções múltiplas, e lutas violentas pelo poder continuarão após o fim do domínio de Assad. Deveríamos avaliar a eficácia de opções militares limitadas neste contexto... A utilização de força militar estado-unidense pode mudar o equilíbrio militar. Mas não pode resolver as subjacentes questões históricas, étnicas, religiosas e tribais que estão a alimentar este conflito".
Dempsey concluiu que a política da administração Obama de centrar-se sobre assistência humanitária e promover a oposição moderada na Síria "representa o melhor quadro para uma estratégia eficaz dos EUA em relação à Síria".
De um modo geral, portanto, a controvérsia das armas químicas abre uma espécie de porta de saída para as potências ocidentais (e a Turquia) na Síria. As potências ocidentais têm estado a esquivar-se à questão do armamento dos rebeldes sírios depois de fazerem promessas verbais, enquanto as forças de Assad têm estado gradualmente a ganhar superioridade militar.
A oposição síria está numa confusão e a Irmandade, a qual domina a oposição síria, está sob o fogo pesado da artilharia saudita por toda a região. Em suma, a bússola do projecto de "mudança de regime" na Síria comutou em favor dos salafistas. Além disso, estes ainda são dias preliminares no Egipto e o que acontecer nas margens do Nilo no final das contas acabaria por reescrever a política do Médio Oriente.
Na presente situação, Assad negociará de uma posição de força inexpugnável na mesa de negociação "Genebra 2", o que é inadmissível para o Ocidente.
É aqui que a controvérsia das armas químicas e a abertura de um processo sírio no Conselho de Segurança da ONU oferece uma pausa para respirar e quebrar o ímpeto do exército de Assad e a insolência do Hezbollah e do Irão.
Será isto um prelúdio para um cenário tipo Iraque? Sem dúvida, Sellstrom está a andar na ponta dos pés perigosamente próximo rumo aos stocks de armas de destruição maciça de Bashar, ou de alguma coisa, a qual os EUA (e Israel) sempre quiseram segurar.
A única tarefa assinalada ao inspector de armas Sellstrom quando ele aterrou em Damasco três dias atrás com a sua equipe era inspeccionar três sítios específicos para determinar se foram utilizadas armas químicas na Síria. Ele não tinha um mandato mesmo para nomear a parte responsável. Agora tudo isso tornou-se história.
22/Agosto/2013
Ver também:
(A verdade proibida: Os EUA estão a canalizar armas químicas para a Al Qaeda na Síria, Obama é um mentiroso e um terrorista)
(Ataque de armas químicas sob falsa bandeira na Síria. Pretexto para guerra total?)
(Ministro russo dos negócios estrangeiros: Materiais que implicam governo sírio em ataque químico foram preparados antes do incidente)
(Peritos lançam dúvida sobre filmagem de armas químicas na Síria)
(Carla del Ponte: "Evidentemente rebeldes sírios utilizaram Sarin")
(Evidência preliminar indica que o governo sírio NÃO lançou um ataque com arma química contra o seu povo)
(Rebeldes sírios utilizam produtos químicos tóxicos contra tropas governamentais perto de Damasco)
(O alarde dos media acerca de "armas químicas" na Síria: pressionando pela intervenção militar) [*] Diplomata de carreira da Índia durante 29 anos, foi embaixador no Usbequistão (1995-1998) e na Turquia (1998-2001). O original encontra-se em www.strategic-culture.org/news/2013/08/22/the-west-strikes-back-in-syria.html Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ . |
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