sexta-feira, 15 de agosto de 2014

A frustrada Operação Margem Protetora de Israel



Ofensiva israelense contra a Faixa de Gaza, que já dura mais de um mês e deixou 2 mil palestinos mortos, não produziu os resultados pretendidos por Tel Aviv
A ofensiva israelense contra o Hamas na Faixa de Gaza foi frustrada. A operação Margem Protetora não produziu resultados. Com 2 mil civis mortos e milhares de casas demolidas, nem uma única missão foi completada; independentemente de os especialistas acreditarem que o Tzahal [Forças de Defesa de Israel] é a força mais potente do Oriente Médio. A liderança do Hamas e seu comando armado não sofreram perdas; os israelenses preferem não lembrar suas próprias declarações sobre a eliminação completa do grupo. O Hamas ainda tem a maior parte de sua reserva de mísseis intacta. O alcance dos mísseis se estende pela maior parte de Israel, incluindo o aeroporto internacional de Ben Gurion. A rede de túneis cavada sob o território da Faixa de Gaza foi destruída em parte e, provavelmente, será rapidamente reconstruída. Ao encontrar as primeiras áreas densamente povoadas, o Tzahal repentinamente parou e até retrocedeu... Então, uma grande parte do Exército israelense foi retirada. Pode implicar uma crise de governo. Israel está em uma encruzilhada frente à necessidade de agir urgentemente para corrigir a situação. Mas não há decisão final sobre o que fazer. Alguns ministros se lembram da experiência de lutar contra o Hezbollah no Líbano. Eles querem declarar “vitória” e depois concentrar os esforços em chegar a um armistício a qualquer custo. Outros, como Avigdor Lieberman, incitam que a guerra continue até que a missão seja realmente completada por um final vitorioso. O primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, ainda está hesitante.

Agência Efe

Operação Margem Protetora, conhecida em Israel como "Penhasco Sólido", já dura mais de um mês e deixou 2 mil mortos em Gaza
Jacob Kedmi, antigo chefe do programa especial Nativ  é um experiente analista e crítico político. Ele tentou explicar o comportamento do governo. De acordo com ele, antes da decisão de começar a operação, os membros do gabinete foram informados sobre as possíveis perdas no caso de uma ocupação completa da Faixa de Gaza. As previsões eram impressionantes, então os ministros nem precisaram votar. A esperança de minar o moral do Hamas era em vão.
O Exército israelense evidentemente tenta fugir da guerra urbana. Diz-se que o cenário de conquista completa da Faixa de Gaza, que foi apresentado ao gabinete de segurança no debate das táticas da próxima fase da operação, teria custado milhares de vidas de soldados israelenses e levaria a uma ocupação israelense de cinco anos para limpar o território de seus 20 mil terroristas e incapacitar sua máquina militar.

Inimigo interno

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A dificuldade de eliminar os numerosos túneis em Gaza foi confusa. Existe um mito de que os túneis levariam até as áreas povoadas de Israel para que atos terroristas fossem cometidos lá. Não é verdade, porque as cidades e vilarejos mais próximos estão situados entre 7 e 10 quilômetros de distância da fronteira do setor palestino; seria necessário um verdadeiro trem subterrâneo para atingir o destino. Há apenas deserto ou kibutzim com poucos trabalhadores, a maioria vinda da Tailândia, no lado israelense da fronteira. Os túneis são cavados e equipados há muito tempo. Incialmente, seu propósito era superar o bloqueio. As armas pesadas, principalmente, incluindo foguetes, não eram transportadas pelos túneis, mas usando rotas terrestres na época da agitação no Egito, enquanto se desencadeava a Primavera Árabe com o discurso do presidente Obama no Cairo. É a ele que os israelenses devem agradecer por terem tido suas cidades bombeadas. Aliás, o Exército israelense destruiu os túneis que levavam ao Egito e o fez com atraso. Cairo o fez antes porque estava seriamente preocupado com os laços próximos entre a Irmandade Muçulmana e o Hamas. De acordo com a imprensa israelense, o Exército foi surpreendido ao encontrar uma verdadeira cidade subterrânea em Gaza, algo que os serviços especiais israelenses falharam em informar.
Reprodução/Blog Refrator de Greens

Túneis subterrâneos e secretos em Gaza serviram de pretexto para Israel invadir o território palestino em julho
O longo histórico de impasses com os palestinos ensinou os israelenses a lutar efetivamente quando entram nas ruas estreitas com casas construídas próximas umas das outras e cercas altas, difíceis de escalar. Israel tem uma grande variedade de armas especiais e equipamentos para tal situação de guerra urbana. Por exemplo, escavadeiras blindadas para chegar ao local de destino pelo caminho mais curto, armas de cano controladas para atirar (tiros de canto) com segurança de esquinas, equipamento de coleta de inteligência pelo ar e pelo mar, radares terrestres que imediatamente oferecem a posição no caso de um alvo aparecer. Tudo isso foi inútil dessa vez. Os combatentes se movendo debaixo da terra podem chegar à traseira das posições inimigas sem seres detectados ou plantar explosivos no caminho como armaduras e desaparecer no subterrâneo. Os túneis que levam até Israel são cavados para permitir que os combatentes se aproximem dos postos e bases do Exército ao longo do perímetro de Gaza. Os especialistas israelenses dizem que os túneis são como um submarino debaixo da terra indo fundo até as posições inimigas.
Abu Leit, um dos comandantes das brigadas de Izz ad-Din al-Qassam, o braço militar do Hamas, disse que o grupo aprendeu bem a lição da operação Chumbo Fundido em 2008. Sob ataques aéreos israelenses, uma decisão estratégica foi tomada para realocar a campanha para o subsolo. O Hamas começou a usar temporizadores para lançar foguetes por meio de lançadores camuflados impecáveis. Para prevenir a traição, a maioria dos combatentes não conhece os demais. O Hamas tem uma força de 30 mil combatentes. Sua tática prevê ações com forças divididas em pequenos grupos. Só os membros do grupo sabem quem são os outros. Apenas alguns comandantes superiores, como Muhammed Deif, por exemplo, são conhecidos. Isso complica a missão da inteligência israelense. Mesmo se houver um traidor dentro do grupo, ele não pode fornecer informação sobre os membros de outros grupos. Apenas poucos engenheiros têm acesso a mapas secretos e sabem quantos túneis existem na verdade e até onde exatamente eles levam. A maioria dos túneis que passam debaixo das fronteiras da Faixa de Gaza são mantidos em segredo até o último momento antes da operação.
Normalmente, os especialistas acreditam que esse tipo de tática surgiu do estudo da experiência do Hezbollah no Líbano. Mas as ações de combate no Líbano foram só um começo. A arte militar evoluiu muito na Síria. Essa tática é usada efetivamente pela oposição contra Bashar al Assad. O Hamas aprendeu bem a lição. Aliás, na Síria, os rebeldes são aconselhados sobre a guerra subterrânea por instrutores do Ocidente, ou até de Israel. Aquele que semeia o vento colhe tempestade. Damasco levou anos para aprender a forma de combater as táticas, mas é muito cedo para dizer se há maneiras eficientes de travar a guerra subterrânea. Eu me pergunto quanto tempo Israel vai gastar para inventar medidas defensivas.
Não à toa, o Hamas não tem planos de se render nestas circunstâncias. É inflexível insistindo nas suas 10 condições para o cessar-fogo, incluindo:
1. Suspensão mútua da guerra e retirada dos tanques para as locações anteriores e retorno dos agricultores para trabalharem em suas terras nas áreas agrícolas de fronteira.
2. Libertação de todos os palestinos detidos desde 23 de junho de 2014 e melhoria das condições dos prisioneiros palestinos, especialmente os prisioneiros de Jerusalém, de Gaza e os palestinos internos [de Israel em seu território atual].
3. Suspensão total do bloqueio de Gaza e abertura das fronteiras para passagem de bens e pessoas, permitindo a entrada de todos os alimentos e suprimentos industriais e a construção de uma usina de energia suficiente para abastecer Gaza por completo.
4. Construção de um porto internacional e de um aeroporto internacional supervisionados pelas Nações Unidas e por países não-tendenciosos.
5. Expansão da zona marítima de pesca para 10 km  e fornecimento de embarcações de pesca e da carga maiores aos pescadores.
6. Conversão da fronteira de Rafah em uma fronteira internacional sob a supervisão das Nações Unidas e de países árabes e países amigos.
7. Assinatura de um acordo de 10 anos de cessar-fogo e envio de observadores internacionais às fronteiras.
8. Compromisso do governo de ocupação de não violar o espaço aéreo palestino e melhorar as condições dos fiéis na mesquita de Al-Aqsa.
9. A ocupação não vai interferir nos assuntos do governo palestino e não vai dificultar a reconciliação nacional.
10. Restauração das áreas industriais de fronteira e sua proteção e desenvolvimento.
As conversas correntes entre os palestinos e israelenses sobre a resolução da situação não traz grandes expectativas. Uma das pedras no caminho é a demanda de construção de um porto para ser operado pela Turquia e pela Noruega. Israel se posiciona como um “limite protetor” real no caminho da implementação de tais planos. Essa é outra razão indireta para instigar combates na região. Tel Aviv quer manter o monopólio da extração de gás natural no mediterrâneo oriental; não o dividirá com os palestinos. O desenvolvimento da área de plataforma de Gaza pode acarretar uma forte competição com Israel e dar impulso para o desenvolvimento econômico da Palestina. A Noruega tem uma experiência rica em explorar reservas de gás no fundo do mar. As divisões sobre o desenvolvimento do gás estão se tornando um obstáculo a mais no caminho do acordo de paz do Oriente Médio.
 
* Texto traduzido por Kelly Cristina e publicado originalmente, em inglês, no jornal online do Strategic Culture Foundation

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