por Adnan Abu Amer [*]
O exército israelense está a preparar-se para anexar a Margem Ocidental (Cisjordania) e para as reacções dos palestinos, embora seja provável que os apelos para que se tomem medidas contra o Estado de ocupação sejam inúteis nas circunstâncias actuais.
De facto, é pouco provável que os palestinos participem em actividades contra Israel por diversas razões, sendo as principais a recusa da Autoridade Palestina (AP) à resistência armada (o Presidente Mahmoud Abbas está disposto a frustrar os ataques contra o Estado colono), a má situação económica e o temor de Fatah de que o Hamas assuma o controle da Margem Ocidental. A contagem regressiva para a anexação começa no início de Julho, e os serviços de segurança israelenses crêem que se a anexação ocorrer será renovada a resistência armada tanto na Margem Ocidental como em Israel e isso poderia levar ao colapso da Autoridade Palestina. Poderia estourar uma nova Intifada. O exército e os serviços de segurança israelenses têm considerado, obviamente, a possibilidade de uma escalada posterior a anexação, e estão a treinar para fazer frente aos diferentes cenários que poderiam surgir nos territórios palestinos ocupados. Os israelenses estão muito preocupados com os custos dos planos do governo tanto em termos financeiros e económicos como em termos de segurança e escalada no terreno. Os especialistas em segurança e economia israelenses estimam que custará ao Estado cerca de 288 milhões de dólares fazer frente a oposição palestina à anexação. Em suma, baseado nos últimos dados, desestabilizaria a economia israelense. Ademais, no pior dos casos, o recrutamento de tropas adicionais necessárias no território custaria uns 28,8 milhões de dólares por batalhão; cada batalhão operacional custa 17 milhões de dólares ao ano, mais 11,5 milhões de dólares a título de salários. Durante a Operação Escudo Defensivo em 2002, só na Margem Ocidental, as Forças de Defesa de Israel haviam recrutado cinco divisões, três regulares e duas de reserva, e cada reserva tinha de 20 a 25 batalhões, com um custo de milhões e milhões de dólares. Além desses gastos, também estavam os custos da polícia de fronteiras. Quanto mais durar a Intifada, mais custará. Além disso, serão necessários milhões de dólares para melhorar a infraestrutura e proporcionar armas e munições específicas aos soldados e franco-atiradores para as demonstrações. O pesadelo de segurança israelense é que as forças de segurança palestinas estão a unir-se às operações contra os colonos ilegais e os movimentos do exército nas estradas principais da Margem Ocidental. Se isso ocorrer, os israelenses seriam obrigados, segundos os analistas, a mobilizar 10 batalhões de reserva para o final de 2020, porque nesse caso os palestinos não terão nenhuma razão para deter suas operações contra Israel. Entretanto, não são essas previsões que mais preocupam os israelenses que se opõem à anexação; todo o projecto lhes parece prejudicial, tanto do ponto de vista moral e político como do ponto de vista da segurança. Nada é gratuito na política e o plano de anexação logo se converteria numa dor de cabeça para Israel. O que mais preocupa é que poderia conduzir a um enfrentamento armado na fronteira norte do Líbano e a acções ofensivas dos cidadãos palestinos na própria Israel, como ocorreu no princípio da segunda Intifada (Al-Aqsa), o que seria ainda mais custoso. Também poderia ter consequências regionais. É preciso reconhecer que a AP não quer realmente cortar seus laços com Israel e não quer perder seu poder político e económico como resultado de uma escalada generalizada. Mas a principal ameaça para Israel não é a AP, e sim a opinião pública palestina. Esse é um verdadeiro desafio, e a AP terá dificuldades para cumprir sua promessa de que o cesse da cooperação em matéria de segurança com as autoridades de ocupação não será acompanhado de uma onda de escalada. A tensão na Cisjordânia e a morte de um soldado da Brigada Golani golpeado por uma pedra na cidade de Ya'bad, sugerem que estão se preparando operações de resistência armada, sejam ou não escaladas organizadas. O ataque ocorreu durante um período relativamente tranquilo para Israel, que experimentou muito poucos ataques hostis, embora tenha havido alguns lançamentos de pedras e cocktails molotov. Estes últimos incidentes enviaram uma mensagem a Israel de que qualquer confrontação com a resistência palestina levará a novas tensões e problemas de segurança. A relativa calma que tem prevalecido na Margem Ocidental durante o último decénio também levanta interrogantes sobre a cooperação da Autoridade Palestina com Israel e sua própria estabilidade económica. Apesar de do status quo político com Israel, a época presidencial de Abbas, que dura desde 2005, se caracterizou por crises persistentes: Israel lançou três importantes ofensivas militares contra Gaza em 2008-2009, 2012 e 2014; o "levante das facas" de 2015; a crise da mesquita de Al-Aqsa de 2017; a transferência da Embaixada dos Estados Unidos de Tel Aviv à Jerusalém em 2018; e os recentes acontecimentos dramáticos sobre o "acordo do século" e a crise do coronavírus. As advertências estratégicas de Israel pontuaram estas crises para evitar que degenerem num levante armado da magnitude da Intifada de Al-Aqsa de 2000 ou num terceiro levante popular da magnitude da Primeira Intifada de 1987. Mas a ameaça de uma nova intifada não se materializou. Isso nos leva a questionar o que poderia ser chamado de o estranho silêncio e o profundo ódio da AP à luta armada contra Israel, assim como seu temor de que o Hamas se fortaleça e assuma o controle da Cisjordânia. A ausência de uma autêntica resposta palestina à agressão israelense se deve em grande medida ao fato de que o povo já não confia em seus líderes. Em sua opinião, os altos funcionários da AP são corruptos e constituem um obstáculo para o renascimento das instituições políticas palestinas. As sondagens de opinião dão uma clara indicação dessa desconfiança, com mais de 60% dos palestinos esperando ansiosamente a saída de Mahmoud Abbas. A AP não pode mobilizar o apoio público às acções que promove e isso explica porque as reacções oficiais à anexação proposta por Israel são tão inconsistentes.
26/Junho/2020
[*] Dirige o Departamento de Ciências Políticas e Meios de Comunicação da Universidade de Educação Aberta Umma, em Gaza, aonde dá conferências sobre a história da causa palestina, segurança nacional e Israel. Tem um doutorado em história política da Universidade de Damasco e publicou vários livros sobre a história contemporânea da causa palestina e sobre o conflito árabe-israelense. Também trabalha como investigador e tradutor para centros de investigação árabes e ocidentais, e escreve regularmente para periódicos e revistas árabes. A versão em castelhano encontra-se em redroja.net/... Este artigo encontra-se em https://resistir.info/ . |
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