quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Michael Roberts / Os melhores livros de 2016

Os melhores livros de 2016

por Michael Roberts
Pensei em recordar, a mim e aos leitores do blog, o que me pareceu serem os melhores livros sobre teoria económica publicados este ano. Meu critério foi se o livro acrescentava qualquer ideia nova ou entendimento novo dos desenvolvimentos do capitalismo moderno ou da teoria económica marxista. Sim, sei que é aborrecido pois não há piadas ou historietas nesses livros.

Vamos começar com os livros que examinaram as actividades do capital financeiro e do imperialismo nas economias principais e globalmente. No seu excelente novo livro, Finance Capital Today , o marxista francês François Chesnais analisou em pormenor os desenvolvimentos chave na finança moderna e as causas do crash financeiro em 2008.

Como diz François num comentário ao meu blog , "Hoje não está a ser produzido suficiente valor excedente para relançar o processo de acumulação e o montante que o satisfaz para consolidar a acumulação de dividendos e activos com incidência de juros pelos bancos, fundos e indivíduos (acumulação financeira) e assim as exigências sobre este já muito insuficiente montante de valor excedente. Isto levou tanto ao beco sem saída do regime de taxa de juro a longo prazo a quase zero, o qual não é simplesmente o resultado da facilidade quantitativa, como aos infindáveis pequenos choques no sistema financeira global. Naturalmente, a dívida governamental e as resultantes políticas de austeridade pró rentistas e pró cíclicas só agravam esta situação mas elas não a explicam e a sua reversão não resolveria o problema básico do capitalismo". Tony Norfield apresenta uma revisão realmente abrangente e positiva do livro de Chenais no seu blog .

E em 2016 Tony publicou a sua própria análise do capitalismo moderno com The City: London and the Global Power of Finance . Norfield traz-nos percepções chave para o entendimento da natureza dos modernos sistemas financeiros e que papel desempenham no funcionamento (ou não funcionamento) do capitalismo. Tony define como imperialismo a situação em que um pequeno número de países domina os mercados mundiais através das suas corporações multinacionais, as quais tanto podem estar a fabricar coisas como proporcionar serviços ou financiamento, ou frequentemente todos os três. O privilégio financeiro é uma forma de poder económico, capacitando países imperialistas a explorarem recursos e valor criado alhures no mundo. A finança e a produção no capitalismo do século XXI são inseparáveis – "eles são parceiros íntimos na exploração". Norfield também revela    o vasto papel do capitalismo britânico no imperialismo . A Grã-Bretanha é o segundo, após os EUA, quanto à importância do seu sector financeiro globalmente e em algumas áreas como o comércio de divisas externas é o principal. A Grã-Bretanha é a maior economia rentista do mundo . Só por esta razão, a votação no referendo do Brexit coloca em perigo o futuro de Londres como centro do capital financeiro global.

Enquanto o livro de Tony Norfield encara o imperialismo moderno a partir do cimo do capital financeiro, John Smith, no seu Imperialism in the 21st century , olha-o do ponto de vista dos milhares de milhões que vivem sob o jugo do imperialismo no que se costumava chamar o Terceiro Mundo e agora chamado de economia "emergentes" ou "em desenvolvimento". Houve todo um debate no meu blog durante este ano sobre a visão de John de que foi a "super-exploração" de trabalhadores assalariados no "Sul" o fundamento do imperialismo moderno. O que ajudou a enfatizar a importância do livro de John.

O papel da finança como causada da instabilidade no capitalismo moderno foi o tema de livro fascinante de Jack Rasmus, Systemic Fragility in the Global Economy . Rasmus considera que a teoria económica convencional (mainstream) fracassou completamente em explicar esta fragilidade; ou prever quaisquer crises como a Grande Recessão; ou explicar a resultante depressão. Ele sustenta que as teorias heterodoxas de crise na economia mundial pós 1970s também estão em falta. Os keynesianos estão em falta porque eles perderam a essência da perspicácia de Keynes quanto à instabilidade e incerteza encontradas numa economia dominada monetária e financeiramente. O seu livro é certamente uma contribuição provocante para um entendimento da fragilidade do capitalismo moderno.

As várias teorias ou explicações da causa das crises sob o capitalismo numa perspectiva marxista ou radical foram reunidas numa colecção de documentos intitulada The Great Financial Meltdown , habilmente editada por Turan Subusat.

Turan apresenta uma excelente introdução e resumo das visões dos principais académicos marxistas. Isto inclui um debate entre David Harvey e eu próprio sobre a relevância da lei de Marx da lucratividade para as crises . Turan argumenta que as causas das crise sob o capitalismo e, em particular, o recente crash financeiro global e a subsequente Grande Recessão, podem ser considerados de três ângulos: ou há uma causa subjacente sistémicas das crise (a queda da taxa de lucro ou subconsumo); ou é conjuntural (cada crise tem uma causa diferente); ou é o resultado de decisões políticas (ex.: a agenda neoliberal, desregulamentação financeira, etc)?

O fracasso da teoria económica convencional em ter qualquer papel útil a desempenhar em tal discussão foi exposto por Ben Fine em dois volumes, chamados Microeconomics e Macroeconomics: a Critical Companion . Fine (juntamente com o co-autor Ourania Dimakou) apresenta uma crítica abrangente de todas as teorias e modelos económicos convencionais. Isto os faz um antídoto valioso ao veneno convencional da teoria do marginalismo e do equilíbrio geral; e da Lei de Say com a negação de crises ou quedas na macroeconomia.

Fine destaca que a teoria macroeconómica comutou de teoria para modelos. Modelos matemáticos substituem teoria, com modelos a serem testados ex-post. O que está errado com a modelação convencional é a falta de realismo nas suposições iniciais. Fine percorre de cabo a rabo o famoso modelo acelerador-multiplicador keynesiano que mostra a instabilidade do capitalismo mas não diz o porque. Fine prossegue na análise da contra-revolução contra o modelo mais radical de Keynes da instabilidade e de como a corrente convencional castrou-o num modelo que se move para equilíbrio dadas as suposições de quedas de preços e salários – na verdade, uma síntese com a teoria neoclássica. Modelos de crescimento estão divorciados de modelos de flutuação a curto prazo.

É interessante comparar a crítica de Fine com a de Paul Romer , um economista convencional, que também se estende ao estado da teoria macroeconómica no seu paper The trouble with macroeconomics . Romer diz que a explicação de crises sob o capitalismo como sendo apenas o resultado de "choques exógenos" a um processo inerentemente harmonioso é inútil. Se você se mantém a acrescentar possíveis "choque imaginários" para explicar mudanças drásticas numa economia, "mais variáveis tornam pior o problema da identificação". Como destaca Romer, "resolver o problema da identificação significa alimentar factos com valores verdadeiros que possam ser avaliados, mas a matemática não pode estabelecer o verdadeiro valor de um facto. Nunca pôde. Nunca poderá". 

Dois grandes livros sobre grandes questões do capitalismo moderno: o aumento da desigualdade e a queda da produtividade e do crescimento, foram produzidos por não-marxistas. No seu livro, Global Inequality , o antigo economista chefe do Banco Mundial, Branco Milanovic, mostra que a desigualdade global aumentou desde o início da década de 1980, quando a "globalização" começou. O aumento da desigualdade é o resultado do impulso do capital para reduzir a fatia do trabalho e aumentar lucro e para as recorrentes e periódicas diminuições (failures) da produção capitalista . O crescimento dos rendimentos tem estado concentrado na China e, em menor extensão e mais recentemente, na Índia.

O mais controverso livro de teoria económica entre os convencionais em 2016 foi o de Robert J. Gordon, The rise and fall of American growth . No seu livro, a acumulação da investigação ao longo da última década, Gordon conclui que o grande novos paradigma promotor da produtividade que supostamente está a vir da revolução digital realmente já está acabado e a futura explosão dos robots/inteligência artificial não mudará isso. Ao contrário, ao invés do crescimento económico e da produtividade, a economia capitalista mundial está a desacelerar em resultado da diminuição do crescimento populacional e da produtividade .

Em contraposição a Gordon há uma miríade de tecno-optimistas e economistas os quais consideram que o mundo está à beira de uma explosão de produtividade conduzida por robots, inteligência artificial, genética e um conjunto de novas "tecnologias disruptivas" – disruptivas no sentido de que empregos e funções tradicionais estão em vias de desaparecer e de serem substituídas por robots e algoritmos. Os optimistas argumentam que, desde o tempo de Thomas Malthus, eras de expectativas deprimidas como a nossa inspiraram previsões de ruínas que se demonstraram erradas quando as economias subiram poucos anos mais adiante.

A proporcionar uma visão equilibrada do impacto da tecnologia sob o capitalismo está um livro curto mas grande, The Bleeding Edge , de Bob Hughes. Hughes graficamente esboça numa série de capítulos que, se a tecnologia fosse controlada por uma organização pública e em comum (ou como ele prefere, seguindo Kropotkin, o pensador anarquista, numa "associação mútua"), então enormes avanços na inovação poderiam ser feitos. Ele apresenta uma série de exemplos para a resolução do aquecimento global, reversão da destruição do ambiente, redução da produção esbanjadora e protecção dos recursos naturais, incluindo flora e fauna.

Finalmente, mas não menos importante, vêm os dois grandes livros de teoria económica marxista lançados este ano. Anwar Shaikh diz que não é um marxista e sim um "economista clássico". No seu magistral Capitalism: Competitition, Conflict, Crises , com 1000 páginas, Shaikh explica que a sua "abordagem é muito diferente tanto da teoria económica ortodoxa como da tradição heterodoxa dominante". Ele rejeita a abordagem neoclássica que parte de "Firmas perfeitas, indivíduos perfeitos, conhecimento perfeito, comportamento egocêntrico perfeito, expectativas racionais, etc" e então "várias imperfeições são introduzidas na estória para justificar padrões individuais observados" embora "não possa haver uma teoria geral das imperfeições".

Shaikh enfatiza que sob o capitalismo é o lucro que conduz o crescimento e que há flutuações cíclicas na lucratividade . Estas são expressas nos ciclos de negócios e de capital fixo inerentes à produção capitalista. As crises são normais no capitalismo. A história dos sistemas de mercado revela padrões recorrentes de ascensões e queda ao longo de séculos, provenientes precisamente do mundo desenvolvido. As crises chave sob o capitalismo são "depressões", tais como as da década de 1840, a "Longa Depressão" de 1873-1893, a "Grande Depressão" da década de 1930, as "Crises de Estagflação" da década de 1970 e agora a Grande Crise Global.

Shaikh considera que superficialmente a última crise, a Grande Recessão, parece uma crise de financiarização excessiva. Mas isto deixa de identificar a causa real da crise. Keynesianos e pós keynesianos argumentam que a causa da crise actual é desigualdade e desemprego, de modo que há uma necessidade de manter uma proporção estável de salário e de utilizar a política orçamental e monetária para manter o pleno emprego. Mas Shaikh argumenta que tais políticas não funcionariam, pelo menos nos EUA, pois os pós keynesianos erraram as causas da crise, causa essa que é o movimento na lucratividade – o factor dominante sob o capitalismo.

O livro de Fred Moseley, Money and Totality , é uma defesa profunda da teoria do valor de Marx e a sua relevância para as leis do movimento no capitalismo moderno. Moseley conduz o leitor perfeita e cuidadosamente através de todas as interpretações competitivas da teoria do valor e do preço de Marx e mostra que uma análise marxista apresenta um único sistema realista do capitalismo. Se interpretarmos uma real macroeconomia capitalista monetário como um sistema único, então é perfeitamente possível (com todas as advertências de problemas de mensuração e de dados) executar análises empíricas para verificar ou não as leis de Marx do movimento do capitalismo. Testar teoria e leis com evidências é agora o nome do jogo. Fred Moseley permite-nos fazer isso com a confiança de que estamos a testar uma teoria lógica e consistente que é verificável empiricamente .

Ah, esquecia. Há também o meu livro, The Long Depression . 
O original encontra-se em thenextrecession.wordpress.com/2016/12/21/best-books-of-2016/ 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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