Crise sistémica global2015: O mundo vira para Leste
por GEAB [*]
Tanto mais porque, em paralelo à ultrapassagem deste marco, os Estados Unidos, depois de terem tentado impressionar o planeta com um militarismo arrogante durante a crise ucraniana, revelam uma fraqueza estratégica importante na sua "gestão" da crise iraquiana. A política musculada, que parecia obrigar o mundo a ficar sob a tutela americana por um tempo indefinido, torna-se insuficiente. Estes dois indicadores permitem discernir um ponto de inflexão importante no desenrolar da crise sistémica global: a passagem de um mundo americano a um mundo chinês...
Europa, Rússia – Estabelecimento de um plano Marshall "à chinesa"
Notas: Este emergir evidente do actor chinês foi precipitado pela crise ucraniana. Se bem que a China tivesse interesse em ir amadurecendo o seu emergir de modo discreto, enquanto os russos mantinham a distância uma China inevitavelmente invasiva, e apesar de os europeus também manterem condições para um emergir suave deste mega-actor, a crise ucraniana acelerou a mutação e em parte escapou ao controle dos actores. Já fizemos notar que a crise ucraniana e a política de sanções pressionaram os russos a aceitar assinar um preço menos interessante do que esperavam no famoso acordo gasista russo-chinês. A Ucrânia fez com que os russos ficassem em desvantagem na negociação deste acordo com a China. Por estes dias, o primeiro-ministro chinês está em visita oficial à Europa e à Rússia [2] . Eles traz molhadas de contratos, projectos de investimentos e perspectivas de negócios [3] , um verdadeiro plano Marshall de reconstrução das economias europeias e russas, parcialmente destruídas pela guerra ucraniana [4] ... Um plano irresistível, certamente. Mas estarão agora reunidas as condições para sermos realmente cauteloso na preservação da nossa independência em relação a esta nova potência? Recordemos que o plano Marshall contribuiu para encadear a Europa do pós-guerra aos Estados Unidos. A City de Londres já foi salva da falência pela China que dela fez a primeira praça financeira fora do seu território a poder obrigações em yuan [5] . Por isso, a Inglaterra tornou-se uma fervorosa promotora da agregação do yuan aos Direitos Especiais de Saque (DES) do FMI. O próprio BCE começou a considerar acrescentar o yuan às suas reservas internacionais [6] . E a Europa encontra-se a desempenhar o papel que lhe cabe de facilitar da transição sistémica entre o mundo de antes e o mundo de depois da crise. Mas para desempenhar tal papel, teria sido preferível que fosse movida por uma visão [7] ao invés da cobiça do ganhou ou mesmo por simples reflexo de sobrevivência. Toda esta actividade entre a Europa, a Rússia e a China vai culminar nos próximos dias com a realização da cimeira ASEM, em Milão, dias 16 e 17 de Outubro. Este acontecimento tem toda a probabilidades de deixar uma marca nos livros de história, uma que vai reunir a Europa e a Ásia e proporcionar a plataforma de resolução da crise do Euro, da crise ucranianas, da crise euro-russa, da crise sistémica global... permitindo assim a transição para o mundo do pós crise. Teria sido mais "multipolarizante" que o acto fundador do mundo de depois fosse selado numa cimeira Euro-BRICS [8] , mas há urgência e, afinal de contas, três dos cinco BRICS estarão presentes (Rússia, Índia e China)... A cimeira ASEM tem em comum com a ideia de uma cimeira Euro-BRICS sobretudo o facto de ser representativa das novas realidades globais (peso económico, comercial, demográfico) e de não contar com os Estados Unidos, que doravante e até novo aviso apenas lança uma sombra sobre toda tentativa de adaptação do sistema mundial às novas realidades. O êxito deste encontro vai tornar evidente para todos o contraste entre as perspectivas oferecidas pela aliança com os Estados Unidos (que tratam sobretudo de questões de guerra) e aquelas oferecidas por uma aproximação estratégica com a Ásia (ou se trata sobretudo da questão da recuperação económica) [9] . Nossa equipe antecipa que as esperanças trazidas por esta cimeira terão nomeadamente como efeito dar o golpe de graça ao tratado transatlântico, o controverso TTIP [10] . Nossos leitores sabem que a nossa equipe não teme a irresistível ascensão do poder da China. Mas não é possível fazer antecipação sem por em perspectiva hipóteses de futuro que incluem mudanças de regimes, derivas próprias às posições dos todo-poderosos, endurecimentos conjunturais... Assim, face à chegada de um novo patrão na cena internacional, a Europa (e todo o mundo) deve ser capaz de simultaneamente acolher positivamente a nova realidade e cuidar de repensar as condições de preservação da sua independência. Nesta matéria, nossa equipe permite-se uma ponta de optimismo. As primeiras gerações de estudantes formadas na Europa (graças ao programa Erasmus e às dinâmicas trans-europeias em matéria de ensino superior) têm agora 45-50 anos, a idade em que se começa a influenciar, quer nos círculos políticos quer nos económicos. Sua capacidade para se integrar num mundo multipolar é infinitamente superior àquelas das elites saídas das gerações anteriores, formadas nacionalmente ou nos Estados Unidos, não falando no melhor dos casos senão o inglês. Graças ao Erasmus, a Europa tem todos os trunfos na mão para influir à escala global apesar da sua pequena dimensão relativa: multilinguismo, multiculturalismo natural que facilita a abertura ao mundo e a compreensão da complexidade, etc. Em conclusão, a emergência do mundo multipolar retoma seu curso de acordo com as antecipações do LEAP... A retomada terá sido apenas mais dolorosa e o mundo será um pouco mais chinês do que uma transição organizada teria permitido. (1) Menos espalhafatoso, mas ainda assim emblemático de uma mudança de paradigma, o facto de a China anunciar que adopta um novo modo de cálculo do PIB, integrando outros parâmetros além do crescimento. Uma decisão cuja pertinência objectiva e a base de aplicação (China) pode relegar o velho PIB à categoria das ferramentas da pré-história económica. O nevoeiro estatístico vai tender a baixar e a paisagem já não terá mais nada a ver com o que conhecemos! Fonte: Europe Solidaire, 09/10/2014. (2) Fontes: China Daily , 08/10/2014. (3) Fontes: Business Insider , 14/10/2014; China Daily , 09/10/2014. (4) A crise euro-russa e a política de sanções mútuas são evidentemente as causas principais da considerável desaceleração económica do continente nestes últimos meses. Esta realidade, que não é objecto de qualquer comentário na imprensa, foi no entanto posta em evidência pelos números catastróficos da economia alemã... como que por acaso nos últimos seis meses. Fontes: The Telegraph , 06/10/2014; International Business Times , 09/10/2014. (5) Fonte: Wall Street Journal , 09/10/2014. (6) Fonte: Malay Mail , 11/10/2014. (7) Ao promover activamente a emergência de uma mundo multipolar graças a uma aproximação Euro-BRICS tal como desde 2009 tem preconizado Franck Biancheri e o LEAP. (8) Tal como temos promovido activamente desde 2009. Ver projecto Euro-BRICS do LEAP. (9) O GlobalEuromètre o testemunha desde há alguns meses: muitas pessoas na Europa estão conscientes do facto de que as dinâmica do futuro se situam mais do lado dos BRICS que dos Estados Unidos. (10) O TTIP de que sempre antecipamos que não veria a luz, a não ser sob uma forma totalmente edulcorada (para que Bruxelas e Washington não percam a face), mas que o deslocamento ideológico "ocidentalista" destes últimos meses, desconectando a Europa da realidade e aniquilando sua capacidade de reacção natural aos acontecimentos, fez realmente correr o risco de uma assinatura forçada deste acordo.
15/Outubro/2014
[*] Global Europe Anticipation Bulletin. O original encontra-se em www.leap2020.eu/... Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ . |
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