Terceirização e corrupção
Do discurso à prática, verifica-se,
hoje, a terceirização da saúde e da educação, e não apenas das
atividades-meio; e casos e casos de corrupção, em que a terceirização
tem sido o meio utilizado para o enriquecimento ilícito.
O modo como esse mecanismo de corrupção
opera inicia-se, em geral, com a contratação emergencial, com dispensa
de licitação, de empresas prestadoras de serviços terceirizados ou de
falsas organizações sem fins lucrativos, que superfaturam os preços dos
contratos de prestação de serviços e servem, ainda, aos interesses
econômicos e eleitorais de um político que engendra a sua contratação.
Além do valor contratual superfaturado ser rateado entre as empresas e
o(s) administrador (es) público(s) e político(s) – ganhos financeiros –
há ainda o ganho eleitoral, pois cabos eleitorais são contratados como
empregados da empresa terceirizada, em burla ao concurso público e ao
princípio da impessoalidade da administração pública.
Um outro (falso) argumento
pró-terceirização é o de que a terceirização de serviços de saúde gera
mais eficiência. Os valores repassados às empresas prestadoras de
serviços e para pseudo-organizações sociais, se fossem empregados nos
serviços públicos, também gerariam eficiência. Há, portanto, uma
propaganda levada a efeito há muitos anos para o cidadão achar que a
terceirização é boa para o Estado brasileiro.
No entanto, o que o cidadão atento pode
observar é o contrário, pois terceirizar tem saído muito caro ao Estado
brasileiro: ou há superfaturamento de preços; ou empresas “somem”,
deixando os seus empregados sem o pagamento de verbas salariais e
rescisórias, e o Estado arca com a responsabilidade subsidiária por tais
débitos trabalhistas; ou a organização social cobra taxa de
administração e ainda superfatura valores de insumos e aumenta o número
de atendimentos/consultas realmente efetuados .
A verdade é que, ao escolher terceirizar
serviços, os administradores públicos, no caso específico da saúde e
educação, passaram a não investir em tais serviços. Hospitais
desaparelhados e anos sem fazer concurso público, ou seja, sucateamento
do sistema público de saúde, para que, quando a “solução” da
terceirização fosse dada, a população, desencantada com os problemas da
saúde pública, ficasse satisfeita com os hospitais terceirizados.
No caso das organizações sem fins
lucrativos, a justificativa estatal é que se trata de o Terceiro Setor
contribuir com o Estado para a realização de suas atividades essenciais.
Um exame do que ocorre na realidade destrói esse argumento.
Basta verificar-se que, se há alegação
de carência de recursos estatais para a prestação de serviços de saúde e
educação, só haveria real ajuda dessas organizações sem fins lucrativos
se elas trouxessem recursos financeiros adicionais para o Estado, de
modo a suplementar a capacidade financeira estatal, e, assim, juntos
prestarem os serviços de educação e saúde.
O que se observa, porém, é que essas
pseudoentidades sem fins lucrativos recebem recursos do Estado e não
entregam bens ou recursos financeiros para suplementar a capacidade
estatal de prestar serviços públicos. São contratadas, apenas, com a
alegação de que têm especialização naquela área, que sabem administrar
muito bem, que arregimentarão empregados sem as amarras do setor público
(leia-se concurso público) e que despedirão, com facilidade (sem
necessidade de processo administrativo prévio, com ampla defesa), os
empregados ineptos ou desinteressados. Em suma, essas organizações
sociais e congêneres vendem, tão somente, a terceirização, e, como
demonstram os processos judiciais, na grande maioria dos casos, no bojo
dessa terceirização encontra-se a corrupção.
Essa realidade deve ser muito bem analisada pelo cidadão, para que seja crítico em relação ao discurso da terceirização.
É urgente, portanto, que a sociedade
manifeste-se contra a terceirização nas atividades estatais típicas e
exija maior transparência nos contratos de prestação de serviços
terceirizados nas atividades-meio, exigindo-se, por exemplo, que nas
páginas de transparência sejam publicadas as planilhas de custos e
formação de preços dos contratos; as datas em que foram efetuados os
pagamentos das faturas; os nomes e CPFs dos empregados terceirizados
lotados em cada posto de trabalho, de modo a evitar-se empregados
fantasmas e a utilização do nome e CPF de um mesmo empregado em vários
contratos.
Ileana Neiva Mousinho, procuradora Regional do Trabalho
Fonte: A Verdade
0 comentários:
Postar um comentário