domingo, 23 de setembro de 2012

Colômbia na busca da Paz

 

sexta-feira, 21 de setembro de 2012


Comandante Timoleón Jiménez: "Estamos dispostos à busca da Paz"




Primeira entrevista exclusiva do Comandante Timoleón Jiménez
[FARC-EP], realizada por Carlos Lozano, diretor do semanário VOZ.
Timoleón Jiménez, Comandante-chefe do Estado-Maior Central das
FARC-EP, é a cabeça visível do legendário movimento guerrilheiro,
hoje comprometido na busca da paz democrática, mediante um
novo diálogo com o Governo Nacional. É a continuidade de uma
orientação da guerrilha das FARC-EP. Havia dito Manuel Marulanda
a VOZ, durante os diálogos do Caguán: “A paz é uma bandeira dos
revolucionários”.

Esta entrevista se dá num momento histórico, às portas de um novo
esforço para conquistar a paz em Colômbia. Aqui estão as respostas
de Timoleón Jiménez, concretas, precisas. Se poderia dizer, sem falso
otimismo, que a paz está mais próxima que antes, porém ainda há
muita marcha adiante. Todo o país espera que não seja uma nova
frustração.

Começa um novo processo de diálogo com um governo
de alguma maneira herdeiro da “segurança democrática”
uribista. Como o abordam as FARC?

- Nós sempre estivemos dispostos à busca de soluções diferentes à
guerra. Com Uribe não foi possível, por seu aberto desconhecimento
de nossa condição política. Santos não é só herdeiro da segurança
democrática, senão que, ademais, um de seus protagonistas
principais. De fato, com maquiagens ao nome, tem continuado
com ela. Porém, como ele mesmo diz, decidiu assumir os riscos de
dialogar e deu passos positivos nesse sentido. Qualquer colombiano
diria que o verdadeiro risco é a guerra e não o diálogo, por isso não
vacilamos em aceitar as conversações para buscar a paz.

Quanto ao modo de abordar o novo processo, diria que o fazemos
com grandes expectativas de alcançar o fim do conflito. O presidente
repete que não pensa cometer os erros do passado e confiamos em
que assim seja. Você sabe que o principal erro de todos os processos
anteriores foi o de chegar à mesa a exigir rendições, sem vontade
real de atender a solução das causas que deram origem e seguem
alimentando a confrontação.

A agenda contempla o tema da “deposição de armas”, que
seria o ponto de chegada de um acordo ou pacto de paz. Que
expectativa têm as FARC a respeito?

- Careceria de sentido iniciar um processo encaminhado a conseguir
a terminação definitiva do conflito sem contemplar a deposição

de armas como ponto de chegada. Deposição de armas consiste
na abolição do emprego da força, da apelação a qualquer tipo de
violências, para a consecução de fins econômicos ou políticos. É um
verdadeiro adeus as armas. Se conseguíssemos que em Colômbia
isso fosse uma realidade, nosso país daria um salto enorme para
adiante. Confiamos novamente em que a administração Santos e
todos os setores empenhados na violência como método de ação
econômica e política coincidam neste critério conosco.

Os “erros do passado”

O Presidente Santos tem dito que seu governo requer que este
processo de diálogo “não repita os erros do passado”; que
exista a garantia que vai conduzir ao fim do conflito; e que o
governo manterá os operativos militares e a pressão militar
sobre as FARC. Quais são os pressupostos da insurgência para
que o processo culmine com êxito?

- A oligarquia dominante em Colômbia, apoiada solidamente pelos
governos dos Estados Unidos, leva já quase 50 anos apostando
no extermínio das guerrilhas. Doze presidentes, um com mandato
repetido, prometeram invariavelmente nosso fim e dado mãos
livres ao aparato militar para cumpri-lo. Quando Santos ordena
incrementar as operações, não está dando satisfações aos setores
da extrema direita, o faz porque crê, com eles, como todos os
anteriores governos, que deveras poderá render-nos por obra da
força. Precisamente, é esse círculo vicioso que se necessita romper.

Se você observa o plebiscito geral de aprovação às conversações de
paz, se dará conta de que a imensa maioria dos colombianos não
compartilha a saída militar, entre outras coisas, porque, com maior
prudência que seus governantes, sabe que não será possível.

Nós partimos da ideia de que este processo será exitoso, na medida
em que essas grandes maiorias que se inclinam pela solução política
tenham oportunidade de falar, de mobilizar-se, de influir, de decidir a
respeito. E as estamos convidando a fazê-lo.

Em vários setores que apoiam o diálogo, se está propondo a
proposta de trégua, cessar-fogo e cessação de hostilidades.
Que opinam as FARC-EP?

- Estamos completamente de acordo. Sempre foi um de nossos
primeiros projetos ao produzir-se aproximações com os diferentes
governos. Desgraçadamente, a oligarquia colombiana se inclinou
para que os diálogos de produzam em meio à confrontação. Se o
despeje do processo estivesse acompanhado de um mecanismo dessa
natureza, outra haveria sido a sorte do mesmo.

- Em Colômbia, as classes dominantes, sua classe política e seus
meios de comunicação sofrem a mania de olhar só a um dos lados.
Informar da matança de 30 guerrilheiros num bombardeio aéreo
desperta seus aplausos, enquanto que as baixas oficiais em combate
são repudiadas como assassinatos. Com a dita manipulação, se
busca, ademais, pressionar-nos grosseiramente nas mesas de
diálogos.

O papel de VOZ

Carlos Lozano Guillén – Vocês, como meio alternativo de heroica
perdurabilidade, são, talvez, os que, de maneira mais honrada têm
informado ao país, desde décadas atrás, da infame perseguição
criminosa praticada em Colômbia contra esse tipo de organizações.
Dos arquivos de VOZ poderia elaborar-se a mais fidedigna história
dos crimes de Estado contra o povo deste país. O número de vítimas
em Colômbia se equipara ao espantoso holocausto judeu na Europa
ocupada pelos nazistas. Então, adquire singular importância o papel
dos diferentes movimentos sociais, sindicais, agrários, populares que
o Estado colombiano pretende ignorar ao abordar com migalhas de
maneira individual um que outro caso emblemático. Essa Colômbia
ignorada e vitimizada é a que tem que pôr-se de pé agora para
reclamar por seus mortos e desaparecidos, para exigir o fim definitivo
da guerra, para impedir que se consagre a impunidade, para exigir a
satisfação dos velhos clamores pelos quais foi violentada de modo tão
generalizado e atroz.

Que opina dos 6 a 8 meses que pressupõe o Presidente
Santos?

- Se trata de uma expectativa que ele está gerando por sua conta, na
contravia do pactuado na letra e no espírito do Encontro Exploratório.
Ali se concertou não pôr datas fatais, nem sequer a palavra meses,
assim que o expressado pelo Presidente nos indica o difícil que vai
ser este caminho que empreendemos. De passagem, evidencia
de maneira clara a estratégia que vão implementar: quando não
consigam algo na mesa, tentarão impô-lo na mídia. Para chegar a
Havana e realizar o Encontro Exploratório duramos dois anos, quando
inicialmente se acreditou que seria questão de semanas. E não foi
precisamente por causa da insurgência, tema do qual não quero dar
pormenores por respeito ao compromisso de manter, por enquanto,
em reserva os detalhes a respeito, ainda que pelas crônicas que têm
saído nos meios de comunicação, a contraparte parece haver-se
esquecido disso.

Um assunto dos colombianos

Que proposta política fazem as FARC-EP aos colombianos ao
começar o diálogo?

- Mobilizar-se em torno do término do conflito. A guerra ou a paz
são assuntos que nos concernem a todos os colombianos e estamos
obrigados a pronunciar-nos. O Governo pretende que os diálogos
se realizem exclusivamente entre seus porta-vozes e os nossos, de
modo discretíssimo, sem barulhos, como repete insistentemente.

Como quando Laureano Gómez e Lleras Camargo firmaram na Europa
os acordos de Sitges e Benidorm. Ademais, pretende que as FARC
demos lá a espadeirada a seus planos de governo, como o mais
conveniente para o país.

Quer dizer, que se desconheça outra vez a população colombiana,
que se pactue à sua revelia o que em verdade só interessa e convém
às transnacionais, banqueiros, empresários e terra-tenentes. Isso
não pode suceder mais neste país. As grandes maiorias devem ser
escutadas e atendidas. Nossa proposta aponta para isso.

Por que se decidiram as FARC a assumir esta nova tentativa de
paz? Fraqueza? Estratégia? Realismo?

- Os que afirmam que a pressão militar foi definitiva para mover-
nos a uma negociação política, esquecem que esta década de
guerra se desatou quando Pastrana pôs fim de maneira unilateral
ao processo de paz que se celebrava no Caguán. É o Estado quem
regressa à Mesa de Diálogos com as FARC, para o qual haverá feito
SUAS avaliações internas. Uma delas, assim não o faça pública, tem
que ser o reconhecimento de que o enorme esforço realizado para
vencer-nos tem resultado inútil. As FARC seguimos aí, combatendo,
resistindo, avançando. Agora, voltamos ao cenário natural da política,
os diálogos civilizados. É absurdo afirmar que nos obrigaram a
sentarmos à Mesa, quando foi o Estado quem se levantou furioso
dela. Dialogamos, porque a solução política tem sido sempre uma
bandeira nossa e do movimento popular.

Sérios golpes

Porém, então, não receberam as FARC golpes severos durante
estes dez últimos anos?

- Não se pode negar que recebemos sérios golpes. E sumamente
dolorosos. As mortes de quatro membros do Secretariado Nacional
não podem ser minimizadas. São muito duras também as mortes de
combatentes sob o fogo dos bombardeios. No entanto, assimilamos
com coragem todos esses casos. Nenhum dos atuais membros do
Secretariado conta com menos de trinta e cinco anos de experiência
guerrilheira, o qual pode aplicar-se também a quase todo o Estado-
Maior Central. As substituições não se improvisam. 48 anos de luta
contínua produziram uma formidável engrenagem. Seguimos adiante,
com dor na alma, porém mais versados e convencidos de nossas

razões. Em toda guerra há mortos. A campanha midiática insiste em
apresentar-nos como uma organização derrotada e sem futuro.

Igual tem sido sempre. Se se tratasse de fazer frente a uma força
vencida, não estariam trabalhando em incrementar ainda mais o pé
de força e o já de por si enorme arsenal adquirido. São verdades que
o Estado e a mídia ocultam deliberadamente.

Então, ainda que as FARC não executem ações do calibre das
de quatorze anos atrás, pode-se afirmar que a confrontação
continua sendo de grandes proporções? O ministro de Defesa
minimiza a vocês completamente e alega que a confrontação
persiste tão somente na área rural de dez municípios isolados
do país...

- As FARC-EP operamos e nos movemos nos mesmos territórios que
eles ocupam. O suposto controle exercido pelos comandos conjuntos,
forças de tarefa, brigadas e batalhões é posto em brasas com
frequência pela atividade das guerrilhas móveis. O número de baixas
das forças armadas vem subindo [em relação ao] de tempos atrás.
Claro, também nós recebemos golpes, muito mais propagandeados
pelos meios de comunicação. É que esse é o conflito. Uma guerra se
trava segundo as circunstâncias, não existem modalidades operativas
válidas para todas as situações. É óbvio que as condições de hoje não
são iguais as de uma década atrás, sobretudo por uso massivo da
aviação militar, porém se combate diariamente. Em todos os Blocos
das FARC se trabalha em função de variar essa equação em qualquer
momento. Seja como seja, a perduração do conflito implicará maior
morte e destruição, mais luto e lágrimas, mais pobreza e miséria para
uns e maior riqueza para outros. Imagine-se as vidas que seriam
poupadas nestes dez anos. Por isso buscamos os diálogos, a solução
incruenta, o entendimento por vias políticas. Com esse propósito,
vamos a Havana. Confiamos em que o Governo Nacional também
entende a necessidade de pôr fim a tão longa violência praticada
contra o povo colombiano.


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