ENTREVISTA / BRUNA MACHEL - Candidata a vice na chapa do Psol/UP diz o que faria na prefeitura de Campos num eventual governo de esquerda
Filha de um professor e sindicalista com uma trabalhadora do comércio, a designer Bruna Machel da Silva Moraes Azevedo, candidata a vice na chapa da candidata a prefeita Natália Soares (Psol/UP), demonstra que não está na política a passeio. Aos 33 anos, após integrar o PCB (Partido Comunista Brasileiro), participou de um movimento de arregimentação de forças entre estudantes e trabalhadores para criar a Unidade Popular, a mais nova sigla partidária do campo socialista em Campos. “Um partido do povo pobre em defesa do socialismo. Nosso presidente nacional, por exemplo, o Leonardo Péricles, é morador de ocupação urbana, homem pobre e negro, liderança que ajuda a ilustrar o tipo de organização que somos e queremos. Não compactuamos com este reformismo da conciliação de classes que tem marcados os partidos de esquerda no Brasil como o PT e do PC do B”, analisa Bruna, dentro da série de reportagens do Campos 24 Horas com candidato(a)s a vice. Ela reitera que num eventual governo Psol/UP, ela e a professora Natália irão governar juntas. (leia abaixo)
Nas assembléias, reuniões e movimentos de rua, Bruna solta o verbo com desembaraço em um discurso contundente e impregnado de firmeza ideológica na defesa do socialismo como ferramenta de transformação da sociedade, a partir de uma agenda que aprofunde o debate sobre os problemas estruturais da sociedade brasileira. “Esse princípio foi determinante para a construção da aliança, aliás. Se formos eleitas, quero estar constantemente nos bairros, nos equipamentos públicos, nas localidades rurais, ouvindo as pessoas, avaliando constantemente os acertos e erros e apontando os caminhos para fazer avançar a qualidade dos serviços ofertados para fazermos um governo verdadeiramente popular. Mas teremos outro grande desafio que consiste na revisão dos contratos com todas as terceirizadas e concessionárias”. (leia a entrevista completa abaixo)
Campos 24 Horas - Nas redes sociais, a informação sobre a chama Psol/UP é a de que, caso sejam eleitas, a candidata à prefeitura Natália e você irão governar juntas, não é isso? Como funcionaria esta governança?
Bruna Machel - Isso mesmo. Em nosso entendimento é possível fazer política com o máximo de horizontalidade, o que sinaliza respeito mútuo entre os partidos. Esse princípio foi determinante para a construção da aliança, aliás. No governo eu quero estar constantemente nos bairros, nos equipamentos públicos, nas localidades rurais, ouvindo as pessoas, avaliando constantemente os acertos e erros e apontando os caminhos para fazer avançar a qualidade dos serviços ofertados para um governo verdadeiramente popular. Mas teremos outro grande desafio que consiste na revisão dos contratos com todas as terceirizadas e concessionárias. Há muita irregularidade na prestação de serviços à população, a exemplo do transporte. Não haverá um contrato irregular, um serviço mal executado, que permaneça como está. A farra das terceirizações já trouxe muitos prejuízos aos cofres públicos e penaliza a população. Pretendo ajudar a liderar o processo de fortalecimento do papel da Prefeitura na prestação direta de serviços. (Leia mais abaixo)
C24H - Bruna, queria que falasse um pouco de você. Qual sua atividade profissional, como, quando e de que forma despertou para a militância, sua participação no movimento estudantil e o ativismo político até organizar um partido novo em Campos, a UP(Unidade Popular) ?
BRUNA - Olha, sou filha de professor da rede pública, sindicalista da educação, e de uma mulher batalhadora que passou boa parte da vida trabalhando no comércio, em loja de roupa e tecidos, essas coisas. Principalmente minha infância foi muito simples, depois de uma certa idade as coisas melhoraram um pouco, mas nunca tive uma vida fácil. Trabalhei em tudo que você pode imaginar: já fui vendedora, atendente, garçonete, agente de pesquisa no IBGE, encarregada na construção civil, e ao longo do tempo percebi que minha paixão era a comunicação, especialmente a área de designer gráfico. E a militância vem de muitas vias diferentes. O ativismo do meu pai com certeza influenciou, ele sempre foi organizado partidariamente. Mas quando ingressei na UFF, em 2010, tive acesso a debates interessantíssimos sobre sociedade que influenciaram diretamente no meu engajamento inicial no movimento estudantil e cultural da cidade. Entro para o PCB em 2010 e fico até 2013. Apesar do carinho pelo partidão, sua linha política e sua prática organizativa já não contemplavam minha forma de pensar a estratégia socialista para o Brasil. É em 2014 que me junto ao processo de legalização da UP, porque entendia ser preciso um partido que abarcasse todas e todos que querem lutar por melhores condições de vida, sem cair no “reformismo”, na conciliação de classes, mas que ao contrário, pautasse a necessidade histórica do socialismo e do poder popular. E exatamente isso que a UP apresenta em sua formulação política, nosso presidente nacional, por exemplo, o Leonardo Péricles, é morador de ocupação urbana, homem pobre e negro, liderança que ajuda a ilustrar o tipo de organização que somos. Um partido do povo pobre em defesa do socialismo. (Leia mais abaixo)
C24H - Quais os maiores problemas e desafios desta cidade que um eventual governo Psol/UP irá priorizar?
BRUNA - A saúde é um dos maiores problemas da atualidade, segundo a percepção do nosso povo. Digo isso por que em cada bairro que vou pergunto sobre o que deve ser prioridade e pelo menos 90% faz referência ao problema na saúde. São unidades básicas fechadas em meio à pandemia; falta ambulância para localidades distantes do centro;a marcação clinica por telefone também não funcionam. Precisamos de uma força-tarefa na saúde de Campos, que em primeiro lugar organize o funcionamento das Unidades Básicas de Saúde, priorizando a Estratégia de Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), no sentido da prevenção na ocorrência das doenças antes que elas se desenvolvam e também na contenção do agravamento de doenças crônicas muito comuns como o diabetes e hipertensão. Ou seja, investindo com inteligência em prevenção de doenças, desafogaremos o atendimento altamente especializado, que é muito mais custoso para os cofres públicos. (Leia mais abaixo)
C24H - Com a queda dos royalties, o Orçamento do município deve cair de R$ 1,7 bi para até R$ 1,5 bi segundo estimam especialistas. Só a folha de pagamento consome mais de R$ 1,1 bi. Como fazer para que haja recursos a fim de investir em outras áreas igualmente essenciais?
BRUNA - No primeiro ano de governo o desafio será colocar as contas em ordem, revisar contratos de concessionárias para identificar possíveis irregularidades na prestação de serviços e, se necessário, suspender esses contratos junto a Justiça. Para falar o português claro: Tem dinheiro público indo pelo ralo, essa é a verdade. Para ser ter uma ideia, a Prefeitura repassou para a iniciativa privada em 2019 mais de 40 milhões com manutenção da iluminação pública, sem que o serviço atendesse com qualidade à população. O que mais escutamos são reclamações de ruas escuras que causam insegurança na população. Ou seja, se gasta muito com serviços de má qualidade. Não é possível continuar desperdiçando verba pública, enquanto falta, por exemplo, investimento em saúde. Também vamos ampliar a arrecadação municipal por meio da elaboração de projetos que pleiteiem a captação de recursos estaduais e federais. (Leia mais abaixo)
C24H - Se vocês vencerem a eleição terão quadros para administrar esta cidade em situação crítica com tantos problemas desafiadores?
BRUNA - Nós temos bons quadros técnicos entre nós: economistas, especialistas em orçamento público, geógrafos, educadores... Pessoas que inclusive foram muito importantes para a construção do Programa.Temos o entendimento também que podemos aproveitar o potencial dos funcionários públicos que já são “prata da casa”. Ou seja, gente que já conhece bem a dinâmica da administração pública, que tem total condição de assumir papeis de liderança no governo. Mas o que nos diferencia mesmo é o corpo político. Temos militantes que realmente sabem onde o “calo aperta” no dia-a-dia do nosso povo. Faz toda a diferença ter lideranças políticas que sabem o que é passar sufoco para se manter na faculdade sem bolsa de estudo; Sabe o que é não ter creche no bairro para atender sua própria família, não por que leram em qualquer livro, mas por que vivem essa realidade. Eu e Natália, por exemplo, somos usuárias do SUS. Sabemos o que é chegar no posto e não ter médico ou o equipamento do dentista estar quebrado. Minha mãe em 2014 ficou internada no HGG, no corredor sofrendo por dois dias até conseguir vaga no leito. Em resumo: Campos já teve muito quadro técnico para executar brilhantemente planos para precarizar vida do trabalhador. É o tipo de receita do técnico neoliberal Paulo Guedes no governo Bolsonaro; foi também à receita do Felipe Quintanilha técnico do governo desastroso de Rafael Diniz em Campos. Isso nós não queremos. Estou convencida que Campos precisa é de liderança política comprometida com uma governança popular. (Leia mais abaixo)
C24H - A exemplo do que ocorre no país num todo, as esquerdas em Campos não conseguiram se unir em torno de uma candidatura unificasse essas correntes. Qual a sua visão sobre esta divisão que enfraquece o chamado campo popular ou progressista?
BRUNA - A UP apontou nacionalmente a necessidade da união da esquerda para enfrentar o imenso retrocesso que representa a extrema-direita, o bolsonarismo. Em Campos lançamos um manifesto propondo o diálogo entre os partidos de esquerda na perspectiva de uma aliança, chegamos até a conversar com alguns dirigentes partidários. Porém, o resultado foi à fragmentação. A necessidade de autoafirmação pode ter influenciado nas decisões dos partidos. No entanto, nas principais cidades e capitais a UP se coligou com o PSOL numa tentativa de expressar esse importante caminho da luta contra a opressão, a fome, a miséria e o desemprego.Temos muitos acordos programáticos. (Leia mais abaixo)
C24H - Por que um cidadão (ã) ou o trabalhador (a) deve votar num partido de esquerda?
BRUNA - Tem muita gente aqui cansada dos velhos grupos políticos que já tiveram a oportunidade de fazer por Campos e faliram o município. Nós vamos criar novas fontes de arrecadação e fazer o que eles não fizeram. Vamos abrir dois restaurantes populares, um no centro e outro em Guarus com preço único e barato. Vamos implementar tarifa zero para usuários da assistência/bolsa família e para estudantes universitários; Outra prioridade absoluta é enfrentar o problema do desemprego. Nosso plano é gerar trabalho e renda através de frentes de trabalho responsáveis pela zeladoria dos bairros e obras de infraestrutura, por exemplo. Transformaremos Campos em uma das melhores cidades do Brasil para se viver, não tenho dúvida. Já a direita o que tem a oferecer? Já provaram sua absoluta irresponsabilidade com o nosso povo. Veja um exemplo: a nível nacional Bolsonaro queria pagar 200,00 de auxílio emergencial. Daí, nós dos setores progressistas no Congresso, nas ruas e nas redes, pressionamos e conseguimos conquistar a variação de R$ 600,00 à R$ 1.200,00. Foi uma conquista nossa. (Leia mais abaixo)
C24H – Como a esquerda lida com este confronto com a direita que resvala até para o ódio. Na campanha, o presidente Bolsonaro disse que iria metralhar os petistas ou mandá-los para o exterior. E esse anticomunismo, como as esquerdas devem tratar este radicalismo de direita?
BRUNA - Foram décadas de falsificações históricas, até por que essa elite global financia a produção de livros, artigos, propagandas de todo o tipo, para tornar o comunismo uma peça de horror no ideário social. Dá pra entender as razões deles. Ao combater o comunismo estão garantindo que tudo permaneça como está. A alienação é algo poderoso para a manutenção da exploração. A ideologia capitalista acaba por domesticar a consciência das pessoas, impedindo de que elas reconheçam às razões reais da sua extrema miséria cultural e material. Eu acho que para nós, anticapitalistas, o processo eleitoral é um espaço importante para manter em evidência esse debate na sociedade, mostrar que há interesses antagônicos em jogo... Mostrar que socializar as riquezas socialmente construídas é o caminho para resolver os principais problemas da humanidade. (Leia mais abaixo)
C24H - Como você analisa ascensão de um presidente com as características de Jair Bolsonaro, um homem declaradamente de extrema direita que vive a elogiar a ditadura e ditadores? Onde foi que os democratas e as esquerdas e erraram?
BRUNA - Bolsonaro ganhou muito apoio entre camadas populares por ter passado a ideia de ser contra a velha política, certo? Esse possivelmente foi a maior fake news das eleições. Ele é justamente a expressão do que há de mais velho em nossa sociedade. Quem lhe deu sustentação política foram setores ultraconservadores ligados a igrejas neopentecostais; setores do empresariado que viam em Paulo Guedes o guardião de seus interesses;setores da mídia que, tomados pelo moralismo e pela ganância, deram palanque para seu discurso de ódio; além do apoio dos herdeiros da ditadura militar. Quero dizer que o bolsonarismo é muito maior que o Bolsonaro. Trata-se de um projeto que vai muito além da moralidade conservadora expressada em seu discurso, mas que envolve, principalmente, a radicalização da agenda de privatizações, o avanço da precarização do trabalho, perseguição ao sindicalismo e movimentos sociais, loteamento da Amazônia, entre outras coisas que lesam nossa pátria. Bolsonaro é a maior fraude que temos no Brasil. Um “patriota” que está vendendo o Brasil à preço de banana.
E sobre os erros da esquerda? O PT e o PC do B adotaram a linha da conciliação de classes, passando a ideia de que o Brasil estava em progresso e que todos, elite burguesa e povo trabalhador, podiam ganhar com isso. O resultado foi desarmar ideologicamente a classe trabalhadora, esvaziar seus espaços de organização, mal conseguindo resistir ao golpe institucional que depôs a presidente Dilma.
Há uma demanda histórica no Brasil por reforma urbana, reforma agrária, a auditoria da dívida pública, entre outras coisas, e nada disso foi pautado pelo governo PT/PCdoB. Esse pra mim foi seu maior erro: não confiar no poder de luta da classe trabalhadora, não ter encarado os problemas estruturais históricos do nosso país. Esse é um debate construtivo que precisamos aprofundar no campo da esquerda. (Leia mais abaixo)
C24H - Como você analisa os tempos atuais, com esse nível de intolerância e ódio ao se discutir política nas redes sociais?
BRUNA - Há intolerância nas redes por que há uma polarização profunda na sociedade. Não é algo que podemos controlar, é algo que está aí como resultado da luta de classes no Brasil e no mundo. Mas não podemos achar que política é como jogo de futebol, sabe? Achar que torcer para um lado ou para outro resolve o problema. Precisamos de mais gente fazendo política na vida real, se engajando em movimentos sociais e em partidos. Como disse Bertold Bretch: “O pior analfabeto é o analfabeto político”.
Concordo :Foram décadas de falsificações históricas, até por que essa elite global financia a produção de livros, artigos, propagandas de todo o tipo, para tornar o comunismo uma peça de horror no ideário social. Dá pra entender as razões deles. Ao combater o comunismo estão garantindo que tudo permaneça como está. A alienação é algo poderoso para a manutenção da exploração. A ideologia capitalista acaba por domesticar a consciência das pessoas, impedindo de que elas reconheçam às razões reais da sua extrema miséria cultural e material.
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