Isabella Alho
SÃO PAULO (SP) – Tornou-se muito comum vermos pessoas, jovens principalmente, em carros, motos e bicicletas trabalhando com serviços de entregas e transportes de aplicativos de celular. Atualmente, são 4 milhões de trabalhadores realizando esse tipo de serviço no Brasil. Só em São Paulo, segundo a Companhia de Engenharia e Tráfego (CET), o número de motos nas ruas aumentou 17,7% de 2018 para 2019 – um possível reflexo dessa busca por emprego.
O discurso é de que esses serviços aumentam o número de empregos no país bem como tornam os trabalhadores empreendedores autônomos, seus próprios patrões e patroas. Garrett Camp, cofundador da Uber, discursou na festa de aniversário da empresa que: “somos a melhor opção para quem quer ganhar a vida dirigindo carros. Graças a tecnologia, criamos o posto de trabalho mais flexível do mundo, sem horário e sem chefe. Uma cidade com Uber é mais próspera”. Essas são mentiras das grandes empresas capitalistas para explorar a força de trabalho e mascarar a miséria e a crise.
A verdade é que o desemprego aumentou no Brasil mesmo com a Uber e os demais aplicativos. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), a taxa de desocupação no fim de 2018 era de 11,6% e, no fim de 2019, 11,8%. Das pessoas ocupadas, o número de trabalhadores sem carteira assinada cresceu 5,9%. Isso não significa que o emprego aumentou, significa, na realidade, que a precarização do trabalho aumentou e os entregadores são um reflexo disso.
Os trabalhadores de empresas como a Rappi, Uber, iFood, entre outras, têm uma jornada de trabalho extensa, perigosa, mal remunerada, instável, sem carteira assinada, sem benefícios como 13º salário e ainda outras desvantagens. É o que diz o trabalhador e estudante de administração, Breno da Silva de 24 anos: “eu não conseguia pagar a faculdade e o aluguel, nenhum estágio pagava o que eu precisava para viver. Essa foi a única solução. Só que estudar ficou mais difícil, as vezes eu levo o livro na mochila pra pausar para estudar. Não temos hora de almoço nem de janta já que os pedidos são todos nessas horas e temos número máximo de corridas que podemos não aceitar.”
Portanto, dizer que o trabalhador do delivery é seu próprio chefe é uma mentira. Se os entregadores realmente tivessem autonomia para escolher como funcionam seus dias de trabalho, com certeza, não deixariam de lado as refeições e nem os estudos. Os patrões de verdade, os donos dessas empresas, estão lucrando muito com o desemprego e a precarização do trabalho no país. A empresa Uber, por exemplo, tem um valor de mercado registrado de U$82,4 bilhões (Santini, 2019) – dinheiro que só é possível ser levantado explorando trabalhadores.
Os efeitos da chegada desses aplicativos de entregas e transportes não se limitam a precarização do trabalho, o avanço dessas empresas ameaça também o transporte público. “Desejamos sentar com os prefeitos para ajudá-los a crescer e criar empregos. Não é tão difícil. Apenas pedimos que deixem para trás leis do passado”, disse o co-fundador da Uber.
A aliança entre os governos e as empresas é essencial para o avanço da política capitalista de privatização de transportes. Nos Estados Unidos, a Uber já desenvolve sistemas de transporte público-privados em parceria com os governos locais substituindo as redes e linhas coletivas. Em San-Joaquin, na Califórnia, as linhas de ônibus diminuíram e os governos locais subsidiam as corridas de Uber dos cidadãos. O preço das passagens deixou de ser controlado pelo poder público e é totalmente decidido pela multinacional dificultando o acesso das pessoas de baixa renda.
Na prática, isso significa que a empresa decide em quais áreas da cidade e quais são as pessoas que têm direito de se locomover. O planejamento urbano e as decisões de mobilidade estão submetidas não mais ao poder público, mas sim a Uber – empresa que não está preocupada com universalização dos transportes e sim com o aumento dos seus lucros. Além disso, o banco de dados de deslocamentos, origem e destino, cartões de crédito, etc., fica nas mãos das empresas de transportes interessadas diretamente na privatização dos serviços.
“Com esse cenário de precarização e privatização não há outra saída senão ocupar as ruas. As péssimas condições de trabalho dos entregadores e de todos os trabalhadores é uma expressão da degradação do capitalismo que se torna ainda mais violento: o fascismo. O fascismo é uma ferramenta da burguesia para garantir seus lucros através da intensa exploração do trabalho. Devemos trabalhar para que cada greve – como a grande greve nacional dos entregadores do dia 1º de julho deste ano – exija não só a melhoria das condições de trabalho, mas também a derrubada do governo Bolsonaro e dos militares que representam o capitalismo na sua forma mais cruel.”
0 comentários:
Postar um comentário