As sanções contra Rússia e o pico petrolífero
por Jorge Figueiredo
O governo Obama conseguiu arrebanhar os relutantes governos da União
Europeia e obrigou-os a imporem sanções contra a Rússia.
Contrariando os interesses dos seus próprios países, os governos
da UE acataram servilmente o diktat estado-unidense. Assim, no fim de Julho,
após longas negociações para o estabelecimento de
"consenso", estes acordaram um esquema de
sanções em Três Níveis
: acesso ao mercado de capitais; embargo ao comércio de armas e bens que
possam ser utilizados para fins militares; e acesso a tecnologias de
produção e exploração de petróleo.
Neste artigo será analisado este último "nível",
passando por cima do pretexto absurdo alegado pelos EUA/UE para aplicar as
referidas sanções. Acusar a Rússia de um crime cometido
pelos fantoches ucranianos dos EUA é uma monstruosidade. A verdade vem
sempre ao de cima e hoje já está claro que
o avião malaio foi derrubado por caças do regime de Kiev
– mas a máquina mediática prostituída, orquestrada
pelo imperialismo, continua a insinuar a "culpa" russa e/ou das
Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk. Tal como na
fábula do lobo e do cordeiro, o primeiro diz: "Não importa
que você não tenha sujado a água do meu rio, se não
foi você foi o seu pai ou seu primo e vou aplicar-lhe
sanções". Este cinismo descarado é um indício
do desespero da elite estado-unidense diante da perspectiva (próxima?)
do fim da hegemonia do dólar. Ela tem de inventar crises
políticas e militares a fim de fazer esquecer a crise da sua moeda. E os
governantes europeus, tal como prescreveu a Sra. Nuland
("Fuck the UE"),
abanam o rabo.
Entretanto, abstraindo aspectos conjunturais do caso, será mais interessante examinar as consequências a médio longo prazo no domínio da energia desta viragem nas relações internacionais. Tudo indica que a nova Guerra Fria agora iniciada poderá ter consequências profundas quanto aos hidrocarbonetos. O mundo – a Europa em particular – poderá ter de pagar um pesado preço pela guinada de Obama na política externa.
Os media corporativos, bem amestrados, desencadeiam agora uma histeria
anti-russa. Até
The Economist,
considerada respeitável, já se comporta como imprensa amarela e
publica uma foto de Putin
com uma uma teia de aranha ao fundo. Pretendem eles que a Rússia seria
severamente atingida pelo embargo a exportações de
"tecnologias sensíveis" para a exploração e
produção de petróleo. Mas não é verdade e
é bem possível que o governo Obama tenha marcado um auto-golo.
Uma análise recente da Reuters apresenta três conclusões principais: a) a Rússia tradicionalmente dependeu da tecnologia ocidental por uma questão de comodidade, mas agora será obrigada a tomar outro caminho e desenvolver tecnologias por si própria, o que levará a uma gradual erosão do monopólio ocidental sobre as mesmas (no deep offshore, no Árctico, etc); b) a China aproveitará a situação e em última análise pode tornar-se a vencedora – já se fala no petro-yuan ; c) as sanções podem significar o fim da liderança tecnológica ocidental no sector do petróleo.
Há muitos peritos que questionam o bom fundamento da política alardeada por Obama. Vale a pena citar a opinião da Peak Oil News:
Entretanto, abstraindo aspectos conjunturais do caso, será mais interessante examinar as consequências a médio longo prazo no domínio da energia desta viragem nas relações internacionais. Tudo indica que a nova Guerra Fria agora iniciada poderá ter consequências profundas quanto aos hidrocarbonetos. O mundo – a Europa em particular – poderá ter de pagar um pesado preço pela guinada de Obama na política externa.
Uma análise recente da Reuters apresenta três conclusões principais: a) a Rússia tradicionalmente dependeu da tecnologia ocidental por uma questão de comodidade, mas agora será obrigada a tomar outro caminho e desenvolver tecnologias por si própria, o que levará a uma gradual erosão do monopólio ocidental sobre as mesmas (no deep offshore, no Árctico, etc); b) a China aproveitará a situação e em última análise pode tornar-se a vencedora – já se fala no petro-yuan ; c) as sanções podem significar o fim da liderança tecnológica ocidental no sector do petróleo.
Há muitos peritos que questionam o bom fundamento da política alardeada por Obama. Vale a pena citar a opinião da Peak Oil News:
"Os convencidos que elaboram a política externa no Departamento de Estado talvez não entendam que a produção de petróleo russa acaba de alcançar um pico pós-URSS e de qualquer forma terá de entrar em declínio. O efeito das sanções (dos EUA e UE) será acelerar o declínio [da produção] da Rússia, forçando em alta os preços mundiais do petróleo assim que o escasso petróleo dos EUA atingir o seu máximo e entrar na sua inevitável queda livre por volta de 2017-2020. A Rússia, nessa altura, ainda será um exportador de petróleo e beneficiará de preços mais elevados (talvez o suficiente para compensar a perda de produção resultante das sanções). Mas os EUA, que ainda continuarão a ser um dos principais importadores mundiais de petróleo, enfrentarão então uma repetição do choque petrolífero de 2008 que contribuiu para o seu crash financeiro.
"Não há dúvida de que os peritos do Departamento de Estado acreditam sinceramente na recente jactância da América como uma nova super potência energética capaz de abastecer a Europa com petróleo e gás para substituir as exportações da Rússia. Talvez os europeus tenham sido suficientemente loucos para caírem também nesta ilusão. Mas isto demonstrar-se-á serem apostas altamente arriscadas. Só se pode esperar que todos os actores acordem destas alucinações antes de o jogo se tornar realmente feio".
Assim, tudo indica que o Departamento de Estado e o governo dos EUA
estão a acreditar na sua própria propaganda da
"revolução" do
shale oil
e
shale gas.
Correndo o risco de repetições, convém recordar que a
dita "revolução" tem pernas curtas pois 1) os
custos de
extracção do shale são elevados; 2) o esgotamento
dos
furos efectuados dá-se num prazo brevíssimo (pouco mais de um
ano); 3) para manter os níveis de produção desejados
é preciso estar constantemente a fazer novos furos; 4) a
tecnologia
exige grandes extensões de terra com baixa densidade demográfica;
5) os desastres ecológicos (poluição de
lençóis freáticos) e sísmicos estão bem
demonstrados. Assim, pode-se afirmar que dentro de poucos anos a tecnologia do
shale será considerada passado, uma moda que não deu certo (a
Shell já abandonou a sua pesquisa nos EUA, depois de mais de dez anos de
esforços).
Na verdade, a auto-suficiência em petróleo dos EUA não
passa de um mito e a auto-suficiência em gás natural é
conjuntural. Quanto à possibilidade de um boom exportador americano de
gás natural, trata-se de uma balela difundida pelo governo Obama e
propalada por jornalistas ignorantes: a escassez de instalações
de liquefacção e de terminais metaneiros de
exportação veda tal possibilidade. Demora pelo menos oito anos a
construção de cada uma destas instalações – e
possivelmente antes disso já terá declinado a "moda" do
shale. Além disso, nos países receptores também seria
preciso construir terminais metaneiros em quantidade suficiente (a
Ucrânia, por exemplo, não dispõe de nenhum). Assim, do
ponto de vista europeu, chega-se à conclusão de que não
há nada que possa substituir o gás russo.
Ao aplicar sanções selectivas contra a Rússia – tentando cuidadosamente excluir o gás natural – a UE na verdade deu um tiro no seu próprio pé. Submeteu-se ao diktat imperial e abandonou quaisquer veleidades de autonomia. Ora, isto significa uma quebra de confiança entre parceiros comerciais, o que não pode deixar de trazer consequência (sem mencionar a ruptura com os tão apregoados princípios do livre comércio e com as disposições OMC). Tal quebra de confiança leva a Rússia a uma grande comutação, à procura de outros mercados. O recente acordo de longo prazo com a China, cujas negociações se arrastavam há anos, já é uma consequência da hostilidade europeia. E o mais importante neste acordo é que o dólar e o euro estão dele excluídos: as vendas do gás natural serão em rublos ou em yuan. Isto tem consequências no panorama energético, político e monetário mundial. Mas os aprendizes de feiticeiro que fazem a História nem sempre percebem o que estão a fazer. Isso é verdadeiro tanto para o Sr. Obama como para os seus pobres serviçais da Comissão Europeia.
Ver também:
Ao aplicar sanções selectivas contra a Rússia – tentando cuidadosamente excluir o gás natural – a UE na verdade deu um tiro no seu próprio pé. Submeteu-se ao diktat imperial e abandonou quaisquer veleidades de autonomia. Ora, isto significa uma quebra de confiança entre parceiros comerciais, o que não pode deixar de trazer consequência (sem mencionar a ruptura com os tão apregoados princípios do livre comércio e com as disposições OMC). Tal quebra de confiança leva a Rússia a uma grande comutação, à procura de outros mercados. O recente acordo de longo prazo com a China, cujas negociações se arrastavam há anos, já é uma consequência da hostilidade europeia. E o mais importante neste acordo é que o dólar e o euro estão dele excluídos: as vendas do gás natural serão em rublos ou em yuan. Isto tem consequências no panorama energético, político e monetário mundial. Mas os aprendizes de feiticeiro que fazem a História nem sempre percebem o que estão a fazer. Isso é verdadeiro tanto para o Sr. Obama como para os seus pobres serviçais da Comissão Europeia.
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