quinta-feira, 17 de julho de 2014

Quatro de Julho, Dia da Independência dos EUA: a história oculta

Silvia Arana

17.Jul.14 :: Outros autores
Um outro ponto de vista sobre a interpretação histórica da declaração da independência dos EUA em 4 de Julho de 1776. Embora se trate de um texto que não pretende formular uma tese aprofundada, recorda alguns factos com interesse acerca do processo de formação da classe dominante naquele país.


A história oficial dos Estados Unidos proclama que os “pais fundadores” lutaram contra a monarquia inglesa para instaurar uma república livre, soberana e justa para todos os habitantes da nova nação. É surpreendente verificar-se quão monolítica tem permanecido esta visão, tanto dentro como fora do país do norte. Entretanto, houve e continuam surgindo novas perspectivas históricas que questionam a história oficial.
Em A People’s History of the United States (1980), Howard Zinn sustenta que a principal motivação dos colonos europeus na América do Norte para se declararem independentes da monarquia inglesa não foi o ideário democrático mas o afã de expansão sobre os territórios indígenas. Explica que depois de 1763, com o triunfo da Inglaterra sobre a França na Guerra dos Sete Anos, e com os franceses expulsos da América do Norte, restavam apenas dois rivais à ambiciosa elite social e política das colonias: os ingleses e os indígenas. Os ingleses, para aplacar os indígenas, tinham declarado que as terras a oeste dos montes Apalaches estariam fora do alcance dos colonos europeus (Proclamação de 1763). De maneira que a expansão da elite colonial sobre as terras indígenas unicamente poderia realizar-se se as Treze Colonias se tornassem independentes de Inglaterra.
O historiador Gerald Horne, no seu novo livro The Counter-Revolution of 1776: Slave Resistance and the Origins of the United States of America (2014) afirma que o alicerce em que os EUA assenta não foi a liberdade mas a escravidão. Diz que, em 1776, as Treze Colonias se levantaram contra a Inglaterra para defender a escravidão, usando como vitrina decorativa as palavras liberdade e igualdade. Segundo Horne, o 4 de Julho de 1776 representa uma contra-revolução. O detonador da revolta teria sido a percepção, entre os colonos europeus, de que Londres se encaminhava no sentido da abolição da escravatura. O caso Somerset, decidido em Londres em 1772, parecia indicar que a abolição não só seria ratificada na metrópole como seria extensiva às colonias, e isto seria devastador para as principais fortunas dos colonos baseadas não somente nas plantações esclavagistas mas também no tráfico de escravos.
Em entrevista a salon.com, Horn reflectiu sobre a razão pela qual o ‘mito da criação dos EUA.’ tem sido e continua sendo aceite sem questionamentos de maior. Pensa que o facto positivo de que muitos europeus tenham encontrado na nova república um santuário contra a perseguição religiosa foi crucial para ocultar outros factos graves: que os EUA cometeram genocídio contra a população indígena e escravizaram centenas de milhares de africanos. [1]
Podemos agregar um par de dados significativos: George Washington, o primeiro presidente dos EUA, foi proprietário de esclavos e o homem mais rico de las colonias e da nova república fundada em 1776. O segundo presidente dos EUA, John Adams, foi também um reconhecido defensor da escravatura.
Horne defende que embora o Quatro de Julho represente um triunfo contra a monarquia, é também o aniversário da instauração do primeiro país com um sistema de apartheid. A tendência abolicionista presente no movimento independentista foi derrotada por um longo período que culminou em 1861 na Guerra Civil, a mais cruenta na história dos Estados Unidos.
É apropriado recordar as palavras de Frederick Douglass, líder da luta contra a escravatura, escritor e estadista afro-americano, nascido em escravidão. Em 1852, Douglass, convidado a discursar em celebração do Dia da Independência, denunciou que aos afroamericanos fora negada a liberdade, a igualdade e a independência:
“¡Estou excluído deste glorioso aniversario! O vosso alto grau de independência apenas sublinha a incomensurável distancia que existe entre nós… A rica herança de justiça, liberdade, prosperidade e independência, legada por vossos pais, ficou confinada entre vós, não foi compartilhada, pelo menos comigo… Este Quatro de Julho é vosso, não é meu. Celebrai vós; eu estou de luto.”
Nota:
[1] “White Supremacy and Slavery: Gerald Horne on the Real Story of American Independence”, entrevista de Elias Isquith, Salon.com: http://www.salon.com/2014/05/30/white_supremacy_and_slavery_gerald_horne_on_the_real_story_of_american_independence/
Rebelión publicou este artigo com a autorização da autora mediante uma licença de Creative Commons, respeitando a sua liberdade para o publicar em outras fontes.
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