quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Simulacros (ódio de classe,etc)

Simulacros*



24.Nov.13 :: Colaboradores
Por detrás de muita da opinião reaccionária está simplesmente o ódio de classe. É ele que permite compreender como a ideologia dominante incorpora – enquanto argumentação política (e até “técnica”) - as afirmações e os insultos mais absurdos e internamente contraditórios.


Aos portugueses já não basta terem no governo do país um bando apostado em fazer-lhes a vida negra. Ainda têm que levar com os António Barreto, César das Neves e outros Pulido Valente. E tudo na mesma semana.
Que tem esta gente em comum? O reaccionarismo, está claro. No nosso país há uma extensa amostragem de variantes de formulação do reaccionarismo: esta gente representa a variante específica do “ódio”. Não lhes basta situarem-se num campo, por opção e convicção. Todo o seu argumentário assenta no ódio ao campo oposto.
Uma recente definição psicológica do ódio diz que consiste numa “emoção profunda, duradoura e intensa exprimindo animosidade, raiva, e hostilidade em relação a uma pessoa, grupo ou objecto”. Assim, numa mesma infeliz semana, esse trio exprimiu-se em relação a Álvaro Cunhal, aos pobres e à Constituição da República no quadro da “reforma do Estado”. Pulido Valente sobre Álvaro Cunhal, que desejava em Portugal “uma segunda Bulgária”; César das Neves sobre os pobres, que no fim de contas não o são, só fingem sê-lo (e, pior ainda, que quem defenda o aumento do salário mínimo “é criminoso”); Barreto sobre a Constituição, que “há décadas está desajustada do país real”. O que estes reaccionários se arrogam denunciar são, portanto, simulações: a simulação de um projecto patriótico e internacionalista, a simulação da pobreza, a simulação de uma lei fundamental.
Quando Barreto (e Soares) tomou em mãos a tarefa de destruir a Reforma Agrária, ela era bem real. Mas ainda hoje argumenta que o que combatia era a “colectivização da terra à maneira soviética”, coisa que nunca existiu. É necessário precisar que para estes reaccionários real não é necessariamente o que existe, mas aquilo que tem que existir. Para esta gente real é o latifúndio, a terra a quem a trabalha é simulação; real é a pobreza e a exploração, mas os pobres e os explorados são simuladores; real é o atraso e a dependência nacional, mas uma posição patriótica é simulação. A sopa dos pobres é real, mas quem lá vai é simulador.
Uma coisa é certa: mais dia, menos dia, o movimento real de transformação do estado das coisas actual colocará esta gente no lugar que merece.
*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2086, 21.11.13
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