Hanói (Prensa Latina) Passada a temporada das monções asiáticas
para dar passo à estação seca, volta de novo a ameaça de incêndios nos
bosques da Indonésia, os quais de maneira recorrente afetam também com a
fumaça e cinzas que desprendem, aos vizinhos Malásia e Singapura, no
convertido em cíclica crise regional.
Calor e sequidão são dois incômodos parceiros destrutivos na natureza
florestal dos ambientes mediterrâneos, nos quais grande parte da
vegetação se adapta com estratégias de reflorestamento ou de germinação
depois do sinistro. No fim das contas, trata-se de um fenômeno com o
qual há que conviver.
Bem diferente resulta, diferentemente,
quando os homens os provocam e este é principalmente o caso dos fogos
frequentes em cinco das ilhas do arquipélago indonésio, sobretudo em
Sumatra, a sexta em extensão do mundo, separada de Malásia e Singapura
por uma tênue faixa marítima.
Em 1982-83, 1997-98 e 2002, os
piores períodos reconhecidos, milhões de hectares de bosque de montanha e
de planície, de floresta e de pântano arderam, enquanto os animais e a
população fugiam em massa. Em algumas ocasiões o nevoeiro que cobriu uma
área tão grande como a Europa interrompeu a aviação e a navegação por
meses e causou sérios problemas de saúde.
Ainda que com menor
intensidade, em junho passado os incêndios provocaram um índice de
contaminação de 371, considerado de nível perigoso pela Organização
Mundial da Saúde (OMS) na cidade-estado de Singapura que ocultou seus
arranha-céus, entre outros muitos efeitos.
"Trata-se da pior
contaminação vivida", disse o ministro de meio ambiente, Vivian
Balarkishman, para uma população de cinco milhões de habitantes, quem
ademais pediu a Indonésia que atue "de maneira decisiva e urgente para
tratar o problema na sua origem".
Na Malásia a situação tomou
parecidos ribetes, com índices de ar insalubre contaminado de 114 pontos
no sul da península e em Riau, a zona de Sumatra onde se originaram os
incêndios; 10 mil residentes sofreram severas infecções respiratórias.
Cinzas, fumaça e neblina desataram a pior crise de poluição entre os
três países na qual não faltaram reproches e exigências a Indonésia, que
adotou suas próprias medidas de emergência, consistentes na instalação
de efetivos militares, equipes de bombeiros em lugares de sinistros e a
injeção de chuvas artificiais em nuvens.
A raiz do acontecido,
autoridades ambientais celebraram uma cúpula de emergência encaminhada a
encontrar soluções permanentes ao repetido contratempo, que a julgar
pelas alternativas propostas passa por um sistema de intercâmbio de
informação preventiva, mapas e buscas satelitais de focos.
A
Indonésia comprometeu-se por sua vez a salvar obstáculos parlamentares e
conseguir a pendente ratificação do Acordo da Associação de Nações do
Sudeste Asiático (Asean) sobre Poluição Transfronteiriça, que
permitir-lhe-ia aceder a mais recursos humanos e equipas e se aproveitar
do monitoramento satelital para executar respostas rápidas.
No
entanto, para além de todas essas necessárias medidas de coordenação
recorrendo a meios tecnológicos de ponta, o nódulo do problema se situa
em inescrupulosos interesses de companhias privadas que desde faz tempo
recorrem a queimas de árvores em alarmantes dimensões para fomentar
investimentos.
Denunciadas inúmeras vezes por organizações
ambientalistas, ao menos Jacarta reconheceu poucas semanas atrás
semelhante profundidade e anunciou o eventual processamento de duas
dessas empresas, ao mesmo tempo em que retoma no órgão legislativo uma
aletargada proposta de modificação da lei vigente com o fim de endurecer
as sanções a infratores.
Dando certo, depois de uma década de
adormecimento, e segundo disse Assinam Subagyo, um membro proeminente da
comissão de agricultura e florestais, aplicar-se-ão sentenças de 15
anos de prisão e multas equivalentes a 10 milhões de dólares aos que
usem fundos provenientes das áreas protegidas, junto com o confisco de
propriedades.
Os legisladores adiaram em abril a primeira
discussão da iniciativa depois que grupos ambientalistas objetaram-na
com a preocupação de que, uma vez feita, a lei seja usada para julgar
membros de comunidades indígenas, que viveram por gerações nas zonas
arborizadas, em vez de se centrar nos poderosos depredadores.
Cobiça por diante, dezenas de companhias dedicaram-se por anos a
devastação e queima de árvores para extrair carvão vegetal de alto valor
e substituir o arrasado por mais benéficas plantações oleaginosas,
madeireiras e caucheiras, sem se atentar às consequências ecológicas e
humanas.
Um relatório publicado depois do desastre de 1997-98
assinalou que além do forte impacto dos incêndios florestais nas
pequenas economias, são grandes geradores de gases tóxicos que
contaminam o ar ao espalhar na atmosfera e uma fonte de gases de efeito
estufa e reativos.
A OMS advertiu sobre os resultados da fumaça
sobre a saúde, citando os riscos de contrair câncer a curto e longo
prazo, bem como de infecções respiratórias agudas, uma das principais
causas de mortalidade entre crianças pequenas, ante um episódio que por
então se fez sentir no Brunei, Indonésia, Malásia, Filipinas, Singapura e
Tailândia.
Em Papua Ocidental, Indonésia, com a destruição dos
bosques, 200 mil pessoas viram-se expostas à escassez de alimentos, e
423 delas morreram de inanição e cólera.
Durante meses
reduziu-se drasticamente o fluxo de turistas, um importante ponto de
suas economias, procedente da Europa e outros países asiáticos, em
procura justamente das ofertas da indústria sem fumaça, ao
interromper-se os voos comerciais.
Semelhantes temores se
concentram agora outra vez à medida que se aproxima a temporada mais
vulnerável para que se manifeste em toda sua gravidade um problema
atiçado sem cessar pelo afã desmedido de enriquecimento a todo custo,
causa de raiz a sufocar.
*Corresponsável da Prensa Latina no Vietnã.
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