III.B.
GRAMSCI CONTRA TROTSKY
NO CAMPO TEÓRICO-DOUTRINÁRIO
Texto de Autoria
de
Portau Schmidt
von Köln
A
Enfermidade Gramsciana
no
Movimento Trotskysta Contemporâneo
e nas
Lutas de Emancipação do Proletariado
Polêmica
Trotsky e Gramsci : Gramsci e Trotsky
O SU-QI e a
Corrente Franco-Gramsciana
de Atualização,
Correção
e Superação do
Marxismo
(O Meta-Marxismo
de Actuel Marx)
Voltar ao Índice
Geral
O Capítulo III em destaque é composto pela presente página de Internet e pelas seguintes subdivisões :
Capítulo III. Introdução : Qual a Compatibilidade entre os Posicionamentos de Gramsci e de Trotsky
Capítulo III.A. : O Stalinismo de Gramsci no Campo Político-Partidário
Capítulo III.C. : A Lógica Filosófica de Gramsci contra o Socialismo Científico de Marx e Engels
Capítulo III.D. : A Via ao Socialismo Democrático-Pacifista da “Guerra de Posição” de Gramsci
Reservando a possibilidade
de analisar mais adiante as implicações das citações de Gramsci aqui
apresentadas, indico, a seguir, sinteticamente, o que efetivamente escreveu e
expressamente doutrinou Gramsci, em seus Cadernos do Cárcere, sua obra maior e mais madura, elaborada
entre 1928 e 1937, acerca da doutrina marxista da Revolução Permanente, tal como defendida por Lev
Davidovitch Bronstein, Léon Trotsky:
“É necessário verificar se a famosa teoria de Bronstein
(i.e. de Trotsky) sobre a permanência do movimento (i.e. sobre a revolução
permanente) não é o reflexo político da teoria da guerra de manobra (recorde-se
a observação do General dos Cossacos Krasnov), em última análise o reflexo das
condições gerais-econômicas-culturais-sociais de um país em que os quadros da
vida nacional são embrionários e relaxados e não podem tornar-se “ trincheira
ou fortaleza ”.[1]
Nesse caso, poder-se-ia dizer que Bronstein, que aparece
como um “ocidentalista” era, pelo contrário, um cosmopolita, i.e.
superficialmente nacional e superficialmente ocidentalista ou europeu.
Ao invés disso, Ilitchi (i.e. Lenin) era profundamente
nacional e profundamente europeu.
Nas suas memórias, Bronstein recorda que lhe disseram que
sua teoria havia se demonstrado boa depois ... de quinze anos e responde ao
epigrama com um outro epigrama.[2]
Na realidade, a sua teoria, como tal, não era boa nem
quinze anos antes nem quinze anos depois : como ocorre com os obstinados,
acerca dos quais fala Guicciardini.[3]
Ele ( i.e. Trotsky ) adivinhou de grosso modo, i.e. teve
razão na previsão prática mais geral, tal como ao dizer-se que se está
predizendo que uma menina de quatro anos tornar-se-à mãe.
E, quando ela se torna mãe aos vinte anos, diz-se que “já
se o havia adivinhado”, não se recordando, porém, que, quando a menina tinha
quatro anos, queriam-na estuprar, seguros que haveria de se tornar mãe. ...
A teoria de Bronstein pode ser comparada àquela de certos
sindicalistas franceses acerca da greve geral e à teoria de Rosa(i.e. Rosa
Luxemburg), contida no opúsculo traduzido por Alessandri : o opúsculo de Rosa e a teoria de Rosa
influenciaram, de resto, os sindicalistas franceses como resulta de certos
artigos de Rosmer acerca da Alemanha, contidos em “Vie Ouvrière(Vida Operária)”
(primeira série em pequenos fascículos) : depende em parte também da teoria da
espontaneidade”. [4][5][6]
Diante do presente texto, a conclusão necessária a ser extraída por todo lutador trotskista que conhece o significado histórico adquirido pela teoria da Revolução Permanente de Trotsky no quadro da Revolução de Outubro e de sua importância na luta contra o stalinismo, é a de que Gramsci não apenas se opõe, frontalmente, à teoria da Revolução Permanente, tal como surge defendida por Léon Trotsky - rejeitando-a impiedosa e ostensivamente -, senão que a ridiculariza, com pretensões de ironia sardônica, lançando mão da fábula da menina de quatro anos que pretendiam estuprar ...
No mesmo diapasão,
Gramsci
procura invalidar a teoria da Revolução Permanente, tal como
desenvolvida por Trotsky, a partir da dogmática político-doutrinária de Josef
Stálin, escrevendo, nitidamente, acerca do tema, em seus Cadernos
do Cárcere :
„Diferenças entre a França, a Alemanha e a Itália no
processo de tomada do poder por parte da burguesia (e Inglaterra).
Na França, tem-se o processo mais rico de
desenvolvimentos e de elementos políticos ativos e positivos.
Na Alemanha, o processo desenrola-se, em alguns aspectos,
em formas que se assemelham àquelas italianas, em outros, àquelas inglesas.
Na Alemanha, o movimento de 1848 fracassa pela escassa
concentração burguesa (a palavra de ordem de tipo jacobino foi dada pela
extrema esquerda democrática : „revolução em permanência“) e porque a questão
da renovação estatal encontra-se entrelaçada com a questão nacional. ...(p.
215)
A propósito da palavra de ordem „jacobina“, formulada em
1948-49, deve-se estudar seu complicado destino.
Retomada, sistematizada, elaborada, intelectualizada pelo
grupo Parvus-Bronstein (obs.: Gramsci refere-se aqui a Parvus e Trotsky),
manifestou-se inerte e ineficaz em 1905 e, em seguida : tornou-se uma coisa
abstrata, de gabinete científico.
Pelo contrário, a corrente que a antagonizou nessa sua
manifestação literária (obs.: Gramsci alude aqui à corrente de Stálin), sem
empregá-la „de propósito“, aplicou-a, de fato, em uma forma aderente à história
atual, concreta, viva, adaptada ao tempo e ao lugar, como decorrente de todos
os poros da dada sociedade que era necessário transformar, como aliança de dois
grupos sociais, com hegemonia do grupo urbano(p. 217).“[7]
Esposando os
mesmíssimos argumentos, dogmaticamente condensados e plasmados para serem
lançados, sistematicamente, por burocrátas da classe trabalhadora contra as
concepções de Trotsky, Stálin escreveu, em Acerca
das Questões do Leninismo, anos antes da redação dos Cadernos
do Cárcere, da seguinte forma, de maneira, digamos assim, ainda
mais criativa e inovadora do que Gramsci, posto que o fez em 1926,
enquanto que Gramsci apenas a partir de 1930 :
“Lenin foi o único marxista que
entendeu e desenvolveu corretamente a idéia da Revolução Permanente.
Lenin diferencia-se nessa questão
dos “permanentistas”(i.e. dos trotskystas) pelo fato de que os “permanentistas”
deturpam a idéia marxista da Revolução Permanente, na medida em que a
transformam em uma sabedoria livresca sem vida, enquanto Lenin a toma em sua
forma pura, tornando-a um dos fundamentos de sua teoria da revolução.”[8]
Eis aí como,
segundo a apreciação de Gramsci, Stálin, antagonizando „a idéia da Revolução Permanente, na medida
em que a transformam em uma sabedoria livresca sem vida“, aplicou-a,
efetivamente, „em uma forma aderente à história
atual, concreta, viva, adaptada ao tempo e ao lugar, como decorrente de todos
os poros da dada sociedade que era necessário transformar, como aliança de dois
grupos sociais, com hegemonia do grupo urbano“, tendo em vista que Parvus
e Trotsky haviam a transformado em „uma
coisa abstrata, de gabinete científico“.
Sua crítica amarga à Revolução Permanente - que foi, entretanto, defendida e aprimorada argutamente por Trotsky - é, portanto, coerente e compatível não com o trotskysmo, mas sim com aquela imensa síntese de sabedoria científica de autoria do próprio Gramsci, consignada em sua extensa produção intelectual, de que “um estúpido não pode compreender que ele mesmo é um estúpido”.[9]
Passemos ainda em revista o método segundo o qual Gramsci julgou correto examinar as questões concernentes ao internacionalismo e à política nacional :
“[Internacionalismo e Política Nacional] Trata-se de um escrito (estilo perguntas e respostas) de José Vessarione (i.e. Stálin), de setembro de 1927, sobre alguns pontos essenciais de ciência e arte política.[10]
O ponto que me parece dever ser desenvolvido é o seguinte : como, segundo a filosofia da práxis (na sua manifestação política), seja na formulação de seu fundador, seja especialmente nas precisões de seu maior teórico recente, a situação internacional deve ser considerada em seu aspecto nacional.
Realmente, a relação “nacional” é o resultado de uma combinação “original” única (em um certo sentido) que, nesta originalidade e unicidade, deve ser compreendida e concebida, caso se pretenda dominá-la e dirigí-la.
Certamente, o desenvolvimento é em direção do internacionalismo, mas o ponto de partida é “nacional” e, a partir desse ponto de partida, cumpre agarrar os movimentos.
É necessário estudar, portanto, exatamente, a combinação das forças nacionais que a classe internacional deverá dirigir e desenvolvê-la, segundo a perspectiva e as diretivas internacionais.
A classe dirigente o é apenas se interpretar, corretamente, essa combinação, da qual essa mesma é componente e, como tal, pode dar ao movimento, precisamente, uma certa direção, em certas perspectivas.
Sobre esse ponto, parece-me residir o dissídio fundamental entre León Davidovitch (i.e. Trotsky) e Vessarione (i.e. Stálin), como intérprete do movimento majoritário.
As acusações de nacionalismo são inaptas, se se referem ao núcleo da questão.”[11]
Aqui, encontramos mais uma vez Gramsci em face de Trotsky, em seus Cadernos do Cárcere, dessa vez, entretanto, defendendo, mais ostensivamente, as posições teórico-doutrinárias de quem considerou ser “il più recente grande teorico” em matérias de internacionalismo, i.e. Josef Stálin.
Considerando os posicionamentos de Trotsky como prenhes de elementos vagos, cosmopolitas e puramente ideológicos, in senso deteriore, i.e. no pior sentido, Gramsci louva os posicionamentos de Stálin no domínio relativo a como conceber a problemática do internacionalismo no sentido de uma ”politica realistica”.[12]
No que tange à posição defendida por Trotsky acerca da industriaização da União Soviética, escreve o pensador e protagonista da stalinização do antigo Partido Comunista Italiano :
“A tendência de Léon Davidovitch (i.e. Trotsky) estava,
estreitamente, conectada com essa séria de problemas (i.e. relacionados com a
racionalização da produção e do trabalho), o que não parece ter sido colocado
bem à luz.
Seu conteúdo essencial, desse ponto de vista, consistia
na vontade “excessivamente” resoluta (portanto, não racionalizada) de dar
supremacia, na vida nacional, à indústria e aos métodos industriais, de
acelerar, com meios coercitivos exteriores, a disciplina e a ordem na produção,
de adequar os costumes às necessidades do trabalho.
Dada a colocação geral de todos os problemas conexos à
tendência, essa devia desembocar necessariamente em uma forma de bonapartismo,
daí a necessidade inexorável de destroncá-la (no original italiano :
stroncarla).
As suas preocupações eram justas, mas as soluções práticas
eram profundamente erradas : nesse desequilíbrio entre teoria e prática estava
inserido o perigo que, além disso, já havia se manifestado precedentemente, em
1921.
O princípio da coerção, direta e indireta, no ordenamento
da produção e do trabalho é justo, porém a forma que esse havia assumido era
errada : o modelo militar tinha se tornado um prejuízo funesto e os exércitos
de trabalho faliram.”[13]
Mais uma vez nessa
sede de seus Cadernos do Cárcere, Gramsci diverge, teórica e politicamente, não
apenas de Trotsky, senão ainda
de uma das principais orientações contidas no Programa da Oposição de Esquerda, em sua luta pela construção de um
socialismo internacionalista proletário-democrático na União Soviética e pela
derrubada impiedosa da burocracia stalinista.
Gramsci, com base em seus argumentos retro-apresentados, acusando
agora a oposição trotskysta de tendências bonapartistas, pretendeu legitimar
teoricamente a necessidade de seu aniquiliamento, de sua supressão, de sua
demolição, ou “da ruptura de seus troncos”
- para permanecer fiel à bastante sugestiva terminologia gramsciana -,
fundamentando, pelo contrário, a emergência e a consolidação do stalinismo
burocrático na União Soviética.
Como é possível
perceber diante de todo exposto, o trotskysmo distingue-se do gramscismo
diametralmente, na mesma proporção em que se distancia do stalinismo, já no que
tange à teoria da Revolução Permanente, já
no que concerne à concepção de internacionalismo, já no que
respeita às tarefas de construção do socialismo no Estado Soviético.
EDITORA DA ESCOLA DE AGITADORES E INSTRUTORES
“UNIVERSIDADE COMUNISTA REVOLUCIONÁRIA J. M. SVERDLOV”
PARA A FORMAÇÃO, ORGANIZAÇÃO E DIREÇÃO
MARXISTA-REVOLUCIONÁRIA
DO PROLETARIADO E SEUS ALIADOS OPRIMIDOS
MOSCOU – BUENOS AIRES - SÃO PAULO – PARIS
0 comentários:
Postar um comentário