quarta-feira, 27 de março de 2013

A globalização e os clássicos do imperialismo, Edmilson Costa *


1
A globalização e os clássicos do imperialismo
Edmilson Costa *
A globalização em curso na economia mundial vem provocando um conjunto de
fenômenos novos em toda a vida social da humanidade – na economia, na política, nas
relações capital-trabalho, na cultura e nas tradições dos povos. Portanto, trata-se de um
processo que coloca para todos os marxistas uma série de questões novas, bem como o
desafio de procurar compreender os dados dessa realidade de uma forma aberta, não
dogmática, visando extrair desse fenômeno as conseqüências analíticas e teóricas desta
fase do capitalismo contemporâneo.
A globalização representa hoje uma fase nova do capitalismo, período em que
este modo de produção atingiu plenamente seu amadurecimento e se transformou num
sistema mundial completo
. Até o período anterior à globalização, o capitalismo era
completo apenas em relação a duas variáveis da órbita da circulação – o comércio
mundial e a exportação de capitais. Mas, ao expandir a mundialização para as esferas
produtiva e financeira, bem como para os outros setores da vida social, o sistema
unificou globalmente o ciclo do capital, fechando assim um processo iniciado com a
revolução inglesa de 1640 (Costa, 2002).
Até meados da década de 50, a burguesia dos países centrais capturava a mais-
valia dos países periféricos na órbita da circulação, por meio do comércio internacional
ou da exportação de capitais. No entanto, após a internacionalização da produção, a
burguesia dos países centrais deu um salto de qualidade: passou a criar
generalizadamente o valor fora de suas fronteiras nacionais
1
, descentralizando assim o
ambiente de apropriação direta da mais-valia, num movimento que envolve atualmente
todo o planeta. Com a criação e apropriação do valor em escala global, a burguesia dos
países centrais tornou-se, pela primeira vez na história do capitalismo, uma classe
exploradora direta do conjunto do proletariado mundial. Além disso, ao produzir
internacionalmente e internacionalizar também as finanças, o modo de produção
capitalista amadureceu efetivamente a reprodução do capital em escala internacional,
possibilitando a constituição de um ciclo mundial único na economia mundial.
1
Michalet. C. Albert. Capitalismo Mundial. São Paulo: Paz e Terra, 1984. Este autor foi o primeiro a
identificar a criação do valor fora das fronteiras nacionais dos países centrais, mas sua análise não se
referia ao processo de globalização atual.
2
Os resultados mais visíveis da globalização da produção são os novos ramos
industriais, como as tecnologias da informação, a microeletrônica, a robótica, a
engenharia genética, a nanotecnologia e a biotecnologia, a internet, entre outros, cuja
configuração possibilitou ao capitalismo reestruturar o sistema produtivo e iniciar uma
terceira revolução industrial. Esses novos ramos produtivos, a exemplo do que ocorreu
no passado, estão substituindo os velhos setores típicos da segunda revolução industrial,
como o metal-mecânico, plástico e químico e se transformando nos pólos dinâmicos da
nova produção capitalista.
A indústria dos tempos atuais já começa a desenhar um perfil inteiramente
diferente do passado recente e seu desenvolvimento no futuro não muito distante terá
grande impacto na vida social, em todos os seus domínios. A classe operária da terceira
revolução industrial terá um perfil inteiramente novo: será uma classe polivalente, mais
qualificada e mais instruída, devendo a ela se incorporar a nova categoria dos cientistas
assalariados dos novos ramos industriais (os ferramenteiros dos chips, os engenheiros
da genética e da biotecnologia, os web designs da internet, os físicos da
nanotecnologia), fatos que terão profundas repercussões na luta de classe em nível
mundial.
Com a globalização financeira, a órbita das finanças passou a hegemonizar toda
a dinâmica do sistema capitalista. Para se ter uma idéia da magnitude do mercado
financeiro mundial, basta dizer que hoje circula diariamente nas várias praças mundiais
cerca de US$ 1,8 trilhão de dólares (Roberts, 2000) e a massa de capitais em operação
nos mercados financeiros já alcança US
$
118 trilhões (Mckinsey, 2005), montante
correspondente a mais de duas vezes o PIB mundial. Essa massa de recursos
basicamente especulativos tem a possibilidade de se movimentar pelo mundo ao longo
das 24 horas do dia. O capital especulativo conseguiu romper a barreira do espaço e do
tempo ao se auto-acrescentar continuamente, fenômeno que lhe proporcionou relativa
autodeterminação nunca vista na história do capitalismo e transformou as atividades
desta área na principal arena de negócios do sistema capitalista.
Essa imensa massa de recursos, totalmente desregulamentada, tem a capacidade
de mudar decisões dos Bancos Centrais, alterar as políticas econômicas governamentais,
as políticas sociais e o mercado de trabalho (Chesnais, 1996). O mais grave é que a
dinâmica especulativa, desligada de uma base material, cresce de maneira exponencial,
3
aumentando a criatividade e a agressividade dos mercados financeiros, sendo que a
própria dinâmica financeira realimenta o frenesi especulativo.
No entanto, a globalização atual é um fenômeno que nasce sem a possibilidade
de se viabilizar plenamente, ao contrário da primeira e da segunda revolução industrial,
em função das limitações estruturais do modo de produção capitalista nesta etapa da
história. A terceira revolução industrial possibilitou ao sistema inovações tecnológicas
radicais que proporcionaram às forças produtivas um enorme desenvolvimento. No
entanto, o capital não possui atualmente condições para desenvolver plenamente todo o
seu potencial produtivo, em função da insuficiência global de demanda. Ou melhor,
quanto mais o capitalismo tem possibilidades potenciais de desenvolver suas forças
produtivas, em conseqüência da inserção de ciência na produção, mais sua ação está
limitada por suas próprias contradições.
A inserção de tecnologia sofisticada na produção e a nova gestão empresarial
possibilitaram a reestruturação da produção e do gerenciamento fabril, pouparam
trabalho vivo nos centros dinâmicos da produção mundial, aumentaram a taxa de lucro e
reduziram o poder do movimento sindical oriundo da segunda revolução industrial, mas
em contrapartida encilharam o sistema num emaranhado de contradições, que se
expressam mais claramente no fato de que cada unidade de trabalho vivo poupada
representa uma nova dificuldade para a realização das mercadorias, colocando em
conflito estratégico a questão produção-demanda. Retoma-se assim, (só que agora em
bases ampliadas), a contradição original do sistema, que se expressa entre o caráter
social da produção e a apropriação privada de seus resultados.
Com a terceira revolução industrial, parece que o sistema se aproxima de um
limite da reprodução enquanto potencialidade material, uma vez que se o capitalismo
chegasse a produzir de acordo com suas potencialidades haveria uma crise de
superprodução. Mesmo levando em conta a produção destrutiva (material bélico e
semelhantes) ou os gastos governamentais em mercadorias inúteis socialmente, a
globalização emerge num momento em que a crise está instalada tanto no setor
produtivo, quanto agrícola ou de serviços, posto que a alavancagem desses setores não
encontraria demanda solvável para suas mercadorias.
Isso explica o fenômeno da financeirização da riqueza, que se apresenta como o
contraponto funcional da incapacidade do sistema desenvolver plenamente as suas
forças produtivas. Os capitais excedentes, impedidos de se reproduzirem na esfera
4
produtiva, buscam agora desesperadamente uma fuga para a frente na órbita da
especulação. Nesta nova aventura desesperada, o capital especulativo carrega consigo
todos os outros setores do capital para a lógica da órbita financeira e, com esse
movimento, aprofunda a crise geral do capitalismo, pois no longo prazo é impossível a
reprodução do capital, sem obedecer a lei do valor.
A criação da riqueza majoritariamente na órbita financeira é uma aventura sem
futuro, uma miragem capaz de levar, no curto prazo, os capitalistas ao delírio e ofuscar
sua visão global. No entanto, quanto mais aprofundam esse modelo, mais ampliam as
possibilidades de uma crise maior do sistema. Como a história tem demonstrado, quanto
maior o descolamento entre a esfera de criação do valor (a produção) e órbita da
circulação (especialmente o setor parasitário da especulação financeira), mais severa e
destrutiva tende a ser crise do sistema. Portanto, a globalização, mesmo sendo um dado
da realidade, tem seus limites estruturais oriundos da própria lógica do capital.
Ressalte-se a esse respeito que Lênin, o mais genial quadro teórico do século
XX, escreveu que o imperialismo seria a ante-sala do socialismo. Todavia, parece que
houve certo otimismo nesta previsão, uma vez que naquela época o capitalismo
monopolizado estava apenas iniciando o seu processo de amadurecimento internacional,
não reunindo, portanto, as condições plenas para as transformações dialéticas que
viriam a ocorrer com a globalização. Somente agora o capitalismo fecha o ciclo do seu
desenvolvimento histórico. Nessa perspectiva, pode-se dizer que agora estamos muito
mais próximos de uma transformação radical desse modo de produção do que no início
do século XX.
Como tudo na natureza segue a lei da dialética, podemos afirmar que o sistema
capitalista teve seu desenvolvimento efetivo com a revolução industrial, passou por uma
fase superior com a segunda revolução industrial e amadureceu completamente com a
globalização contemporânea. Portanto, agora que já cumpriu o papel histórico de
desenvolver internacionalmente as forças produtivas e a órbita da circulação, tende a
sofrer transformações profundas que mudarão a sua qualidade enquanto modo de
produção, a exemplo do que ocorreu com as outras formações sócio-econômicas
anteriores.
Seu aparente esplendor globalizado esconde um conjunto de contradições
originais que se reproduzem agora em bases ampliadas com a globalização. Portanto,
para compreender o fenômeno da globalização e as possíveis transformações de um
5
sistema agora completo deve-se também atentar para o fato de que uma transformação
qualitativamente nova só poderá ser efetiva se for viabilizada a partir do coração do
sistema, onde potencialmente a luta de classes tem condições de pulsar mais
intensamente.
É bem verdade que os elos débeis continuarão cumprindo um papel essencial
para o enfraquecimento geral do capital, enquanto forma global de dominação. Mas a
sua crise profunda só poderá configurar um estatuto terminal quando atingir o núcleo do
poder, o coração da
Tríade Imperial.
Em outras palavras: a crise geral do capitalismo só
estará madura quando atingir os Estados Unidos, a União Européia e o Japão.
Os clássicos e o imperialismo
Desta forma, estamos diante de um conjunto de fenômenos novos. Resta saber se
esses fenômenos configuram uma mudança de patamar da história do capitalismo ou se
trata apenas de uma evolução natural das forças produtivas. Entendemos que estamos
vivenciando uma nova fase do capitalismo, semelhante à que ocorreu no final do século
XIX, início do século XX, com a fusão do capital bancário e industrial e a emergência
dos monopólios. Sinteticamente, estes fatos podem demonstrar esta tese:
a)
a globalização produtiva alterou o lócus de extração do valor, a partir do qual a
burguesia dos países centrais passou a capturar, de maneira generalizada, a mais-
valia fora de suas fronteiras nacionais. Os velhos monopólios transformaram-se
em destacamentos avançados do grande capital, estando hoje presentes
fisicamente em todos os continentes;
b)
o processo de fusões e aquisições não só se assemelha ao passado, como indica
uma cosmopolitização burguesa, se não ainda em termos mundiais, pelo menos
do ponto de vista dos blocos econômicos;
c)
o comércio intra-firma responde atualmente por cerca de 40% do comércio
mundial, fato que subverte as chamadas vantagens comparativas, uma vez as
relações comerciais passam a ser baseadas exclusivamente no interesse das
corporações transnacionais;
d)
Na área financeira, a lógica da especulação subordinou todas as outras atividades
econômicas, inclusive o setor produtivo e os orçamentos nacionais (Plihon,
1998), ressaltando-se que o capital especulativo pode hoje movimentar-se
on
6
line
24 horas por dia, o que quebra as barreiras do espaço e do tempo, situação
que nem mesmo os mais delirantes especuladores sonhavam há duas décadas.
Os fenômenos que procuramos identificar não se referem apenas à evolução
natural do sistema capitalista, mas constituem uma situação qualitativamente nova.
Assim, estamos num ambiente em que as teorias que expressavam os fenômenos
relativos à segunda revolução industrial não respondem mais plenamente à conjuntura
objetiva da globalização. Isso significa que as teorias elaboradas pelos clássicos do
imperialismo (Hobson, Bukharin, Rosa de Luxemburgo, Kaustky, Hilferding e Lenin) já
não podem mais explicar plenamente os fenômenos da globalização. Eles escreveram
sobre seu tempo; não tinham obrigação, nem estavam interessados em adivinhar o
futuro. Mas o lastro em que desenvolveram as teorias e o método dialético são fonte
fértil para que os marxistas de nossa época dêem prosseguimento à sua obra teórica.
Elegendo a obra de Lenin,
O imperialismo, fase superior do capitalismo
, como
síntese paradigmática da interpretação do imperialismo oriundo da segunda revolução
industrial, procuraremos analisar os eixos fundamentais daquela obra para aferirmos
qual a aderência que ainda possui à realidade atual. Lênin elencou cinco traços
fundamentais que caracterizavam a nova fase do capitalismo: 1) a concentração da
produção e do capital e o aparecimento dos monopólios; 2) a fusão do capital industrial
com o capital bancário e o aparecimento da oligarquia financeira; 3) a exportação de
capitais, ao contrário da exportação de mercadorias; 4) a formação das associações
monopolistas que partilharam economicamente o mundo entre si; 5) a partilha territorial
do mundo entre as potências mais importantes (Lenin, passim, 1975).
Lênin enfatizou ainda que o imperialismo não era uma nova formação sócio-
econômica, mas a fase superior do capitalismo
.
Nesse sentido, afirmava que esta fase
seria marcada pelo capitalismo parasitário, em decomposição e agonizante, a ante-sala
do socialismo. Vejamos como se apresenta cada uma dessas características no mundo
atual:
A concentração da produção e do capital
continuam sua marcha histórica,
como Marx já havia identificado anteriormente, baseado na própria lógica da
acumulação. No entanto, o que distingue a época atual do período de Lênin é que as
corporações transnacionais passaram a extrair diretamente, e de maneira generalizada,
o valor fora de suas fronteiras nacionais, tornando a burguesia dos países centrais
7
exploradora direta do proletariado mundial, ao contrário do que acontecia anteriormente
quando se apropriava da mais-valia mediante o comércio mundial ou a exportação de
capitais.
Em conseqüência da globalização, impôs-se ao grande capital a necessidade de
uma remonopolização global, através de um processo intenso de mega-fusões e
incorporações em todos os seus estamentos – industrial, bancário e de serviços. Isso está
dando um caráter novo à luta pela hegemonia entre os blocos do grande capital:
precisam unificar novamente sua estratégia, não só para reorganizar-se diante da
globalização, impor uma nova disciplina ao mundo do trabalho, mas principalmente
para contrarrestar a tendência decrescente da taxa de lucro que caracterizava a
conjuntura mundial após a Segunda Guerra.
A exportação de capitais
hoje difere significativamente do período da segunda
revolução industrial e mesmo no período de ouro do Walfare State. No período inicial
do imperialismo, a exportação de capitais era destinada à construção de estradas de
ferro, minas, portos e outros equipamentos de infra-estrutura, sem que houvesse grandes
inversões na área fabril, até mesmo porque não era interessante para os países centrais a
industrialização da periferia. Isso pode ser constatado pelo fato de que apenas alguns
desses países conseguiram realizar sua industrialização, assim mesmo muito
tardiamente. Somente com a internacionalização da produção é que os capitais
migraram para a construção de plantas fabris nos países da periferia, mas aí já se tratava
de um processo novo, a globalização da produção.
Outro fenômeno que chama a atenção na exportação de capitais da atualidade é o
fato de que cerca de 80% do investimento direto externo (IDE) não está direcionado aos
países da periferia, mas aos países centrais, ressaltando-se ainda que vem decrescendo a
participação dos países periféricos neste tipo de investimento (Chesnais, 1996; World
Investment Report, 2001). Se a exportação de capital está se desenvolvendo
centralmente entre os próprios países imperialistas, a relação de subordinação pode ter
uma nova leitura, e não deve ficar restrita à tradicional subordinação entre os países
imperialistas do passado e suas colônias ou nações satélites. É bem verdade que a
subordinação é a lógica da relação centro-periferia, mas o montante de recursos dessas
operações direciona o centro do fenômeno para outras regiões e não para a periferia.
8
Todavia, o aspecto mais importante da exportação de capitais hoje não se
verifica na esfera produtiva, mas essencialmente na órbita financeira. A partir do final
dos anos 60, constata-se crescentemente a
privatização da liquidez internacional,
ao
contrário do período anterior, quando a maioria dos empréstimos era oriunda de
entidades financeiras multilaterais. Essa privatização foi fruto de um movimento do
capital norte-americano no sentido de burlar as leis restritivas a saídas de capitais do
País. Para tanto, os bancos começaram a criar títulos com valor em dólar americano,
mas emitidos fora dos EUA, mecanismo que foi crescendo como uma bola de neve e
formando um peculiar mercado de moedas, que posteriormente transformaria a Europa
e, especialmente, Londres, no principal centro financiador das atividades mundiais
(Moffit, 1984).
É importante ressaltar que, com o mercado de eurodólares, processa-se uma
mudança profunda na exportação de capitais, movimento que viria se expressar mais
claramente com o endividamento dos países da periferia. Posteriormente, com a
desregulamentação do período Reagan-Tatcher, a exportação de capitais tomaria um
novo rumo. A transformação qualitativa do IDE em instrumento para a realização de
fusões e aquisições dá um sentido novo à exportação de capitais. “Para ampliar os
lucros a oligarquia financeira mudou o seu centro de gravidade, reduzindo os
investimentos diretos na produção, o que amplia o caráter parasitário do imperialismo”
(Costa, 1989). Se o centro de gravidade da exportação de capitais já estava alterado com
a formação da dívida externa dos países da periferia, a desregulamentação veio
intensificar de maneira extraordinária esse processo.
A partilha econômica e territorial do mundo
também se desenvolve de maneira
bastante diferenciada do período inicial do imperialismo. Está em curso, com uma série
de problemas, a formação dos blocos econômicos nas principais regiões do mundo.
Estes blocos refletem, de um lado, os problemas e contradições da luta inter-burguesa e
do desenvolvimento desigual capitalismo, e de outro, uma surda luta de resistência
contra a tentativa norte-americana de construir uma ordem unipolar, tendo a nação
yanque como centro. Como se trata de um processo em construção, não se pode
visualizar ainda o desfecho definitivo. Mas, de qualquer forma, a partilha territorial do
mundo hoje tem aspectos radicalmente diferentes dos tempos dos primeiros
monopólios.
9
Registre-se que há uma desesperada dos Estados Unidos no sentido de se
transformar numa potência hegemônica incontestável e, a partir desta posição, tirar o
máximo proveito da nova ordem econômica internacional e realizar uma recolonização
sofisticada dos países da periferia. Trata-se de uma recolonização que não inclui a
ocupação geográfica no sentido clássico (a não ser em regiões rebeldes, ou ainda onde
for determinante para os interesses americanos, como atualmente no Iraque ou
futuramente na Amazônia), mas a busca do controle econômico-financeiro dessas
regiões.
Finalmente, a
tendência à decomposição e ao parasitismo
, identificado por
Lenin como sendo uma das características da oligarquia financeira, mantém a sua
essência, mas foi aprofundada de maneira extraordinária e revela aspectos novos e
relevantes. A oligarquia financeira ampliou o seu parasitismo e muitos Estados
imperialistas transformaram-se em nações rentistas (Chesnais, 2000). Circula hoje
diariamente na órbita financeira US$ 1,8 trilhão (Roberts, 2000) e o montante de
negócios nesse segmento é de US$$ 118 trilhões, duas vezes o PIB mundial (Mckinsey,
2005). A transferência de recursos dos países da periferia para os países centrais nos
últimos 25 anos, por conta principalmente dos mecanismos impostos pelo capital
financeiro, pode ser considerada semelhante à extorsão realizada no período colonial, o
que por si só dá uma dimensão do rentismo institucionalizado de nossa época.
Como se sabe, a financeirização da riqueza ou o rentismo institucionalizado, é
uma expressão degenerada da acumulação de capitais e demonstra um aprofundamento
sem precedentes do parasitismo da nova burguesia. A “valorização” da riqueza pela via
financeira cria uma contradição entre a velocidade de expansão da órbita financeira e o
crescimento do setor produtivo, tornando assim a defesa da riqueza por esta via uma
aventura sem futuro, pois haverá inevitavelmente um momento de ruptura desse
processo para compatibilizá-lo com a economia real, o que deverá ter conseqüências
dramáticas tanto para especuladores quanto para a ordem econômica capitalista.
Paradoxalmente, a globalização está construindo as bases para a sociedade da
abundância, em função da terceira revolução industrial e do aumento da produtividade
do trabalho. “Mas como o capitalismo não tem compromisso com o progresso social,
não será capaz de satisfazer as necessidades da população do planeta. Mesmo assim,
essas forças produtivas sofisticadas, pela primeira possuem condições de dar lastro para
a sociedade da abundância de bens e serviços. Caso a humanidade obtenha uma
10
transformação estrutural do capitalismo, já possui as bases materiais da sociedade
comunista” (Costa, 1993).
BIBLIOGRAFIA
CHESNAY,
François. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996.
_________________ (Org.). A Mundialização Financeira. São Paulo: Xamã, 1998.
COSTA,
Edmilson. A globalização neoliberal e as novas dimensões do capitalismo
contemporâneo. Tese de Pós-doutoramento. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas –
Unicamp, 2002.
________________. Imperialismo. 2ª. Ed. São Paulo: Global, 1989.
LENIN,
Wladimir. Imperialismo, fase superior do capitalismo. Lisboa: Edições Avante,
1975.
MCKINSEY COMPANY.
U$ 118 trillion and counting: taking stock the world ́s
capital markets. 2005. http//:www. mckinsey.com. Acesso em 5/72005.
MICHALET,
Charles Albert. Capitalismo Mundial. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
MOFFIT,
Michel. O dinheiro do mundo – de Bretton Woods à beira da insolvência.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
PLIHON,
Dominique. Desequilíbrios mundiais e instabilidade financeira: a
responsabilidade das políticas liberais. Um ponto de vista keynesiano. In A
mundialização financeira. São Paulo: Xamã, 1998.
ROBERTS,
Richard. Por dentro das finanças internacionais. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editores, 2000.
UNCTAD
(United Nations Conference on Trade and Development). World Investment
Report, 2001.
*
Edmilson Costa,
doutor em Economia pela Unicamp, com pós-doutorado no IFCH-
Unicamp. Professor da Universidade Zumbi dos Palmares, é autor de I
mperialismo
(Global, 1989), A
Política Salarial no Brasil
(Boitempo 1997) e
Um Projeto Para o
Brasil
(Tecno-Científica, 1998) e diretor de pesquisa do Instituto Caio Prado Jr.
Anterior Proxima Inicio

0 comentários:

Postar um comentário