M.K. Bhadrakumar [*]
16.Jan.12 :: Outros autores
A situação no Oriente Médio aproxima-se rapidamente do ponto crítico e o início do conflito já aparece nas cartas. Na Síria, o imperialismo prepara-se para passar da actual interferência em questões internas a uma intervenção segundo o “modelo Líbio”, com a Turquia a desempenhar provavelmente um papel central. No Irão a escalada militar acelera, também sob a pressão de Israel, e aí os EUA caminham para intervir directamente.
A situação no Oriente Médio aproxima-se rapidamente do ponto crítico e o início do conflito já aparece nas cartas. Isso, em resumo, foi o que disse Nikolai Patrushev, secretário do Conselho de Segurança Nacional da Rússia (e ex-diretor do FSB, a organização que sucedeu a KGB) em entrevista à imprensa russa.
Patrushev é sem dúvida figura-chave do establishment político e das relações internacionais russas. Ninguém duvida de que falou bem reflectidamente, com o objetivo de enunciar a profunda ansiedade do Kremlin ante a evidência de que o mundo está a poucos passos de uma conflagração no Médio Oriente de consequências imprevisíveis no plano da segurança regional e internacional e da política mundial.
Patrushev, claro, tem acesso a inteligência de alto nível e falou baseado em dados que estão jorrando dos satélites e dos espiões e diplomatas russos. O Kremlin disparou um sinal de alerta.
As entrevistas foram dadas em idioma russo. Posso entretanto reproduzir passagens. Patrushev disse: “Há informações de que membros da OTAN e de alguns estados árabes do Golfo Pérsico, agindo segundo o cenário que se viu na Líbia, trabalham para transformar a actual interferência nas questões internas da Síria em intervenção militar directa.”
Foi específico. “As principais forças de ataque não serão francesas, nem britânicas nem italianas mas, provavelmente, turcas.” Disse que o primeiro passo será criar uma zona aérea de exclusão sobre a Síria, para criar um santuário em território sírio próximo da fronteira turca, para entrada de mercenários que possam ser apresentados como rebeldes sírios. Em resumo, é intervenção ocidental ao estilo “líbio”; e conduzida pela Turquia.
Patrushev disse que a escalada militar alcançará provavelmente também o Irão e há “real perigo” de ataque pelos EUA, destacando que tensões sobre a Síria hoje são, de facto, tensões relacionadas com a questão iraniana. “Querem castigar Damasco menos pela repressão à oposição e mais por a Síria se ter recusado a romper relações com Teerão.”
Sobre a situação iraniana, Patrushev disse: “Já se veem sinais de escalada militar no conflito, e Israel está empurrando os americanos para a guerra. Há perigo real de um ataque militar norte-americano contra o Irão. Nesse momento, os EUA veem o Irão como seu principal problema. Querem converter o Irão de inimigo em parceiro apoiante; e, para conseguir isso, o plano é mudar o actual regime, pelos meios que forem necessários.”
E qual será a provável resposta dos iranianos? Patrushev avalia: “Não se pode descartar que os iranianos sejam capazes de cumprir as suas ameaças de suspender exportações do petróleo saudita pelo Estreito de Ormuz [1] , se sofrerem ataque militar directo.”
Patrushev também se referiu às políticas dos EUA para com a Rússia, China e Índia.
Disse que os EUA estão “persistentemente buscando manter a sua dominação económica, política e militar no mundo”. Põe sob essa luz a instalação dos sistemas de mísseis antibalísticos dos EUA na Europa. “Hoje, [a instalação dos mísseis antibalísticos] talvez não seja grave ameaça à Rússia, mas o objectivo daquela ação, no longo prazo, é reduzir nosso potencial estratégico. Pelo que sei, os planos para uma barreira global de mísseis de defesa norte-americanos também estão sendo negativamente avaliados em Pequim.”
“Apesar das mudanças radicais no alinhamento global de forças, como resultado da modernização, os EUA insistem em manter sua dominação económica, política e militar em todo o mundo. No presente, é importante para os EUA eliminar o que veem como ameaças a essa dominação – e ameaças que vêm da China, como creem os EUA.” (…)
Eis onde a Índia foi mencionada na entrevista de Patrushev: “A administração americana designou a região da Ásia-Pacífico como prioritária em política externa. Os americanos tentam utilizar a Índia como o contrapeso principal ao poder crescente da China e para este objectivo estão a estimular a ideia de cooperação estratégica especialmente estreita com Deli ” [ênfase acrescentada].
Como “amigo de longa data” da Índia, Patrushev, evidentemente, não falaria contra a abordagem dos indianos e as atitudes de ’sedução’ de Tio Sam. Em vez disso, falou da “vizinhança alargada” da Índia:
“Simultaneamente, os EUA buscam acesso directo aos recursos e às facilidades de transporte na vasta área do Cáucaso, do Cáspio e da Ásia Central. Há inúmeras declarações de políticos norte-americanos sobre a necessidade de pôr sob controlo dos EUA a energia, a água e outros recursos da Rússia.”
Mas, apesar de tudo, Patrushev não ignorou a importância que Moscovo dá às relações Rússia-EUA, porque “os EUA são líderes do mundo ocidental e, faça a OTAN o que fizer, as estratégias da OTAN são sempre modeladas em Washington.”
Além disso, “Os nossos países [Rússia e EUA] têm vários e importantes interesses coincidentes em matéria de segurança. Por exemplo, estamos combatendo juntos contra o terrorismo, de entre outras coisas ao tornar acessível a rota do norte para atender as necessidades das forças dos EUA no Afeganistão; estamos enfrentando juntos o crime organizado e o comércio ilegal de armas, narcóticos e substâncias psicotrópicas, e cooperamos também em tentar manter a segurança das informações” – concluiu Patrushev, com boa dose do humor russo, ao acentuar o carácter profundíssimo da actual “parceria” entre Rússia e EUA.
13/Janeiro/2012
[1] Ver Geopolítica do Estreito de Ormuz: Marinha dos EUA pode ser derrotada pelo Irão no Golfo Pérsico?
[*] O autor foi embaixador da Índia em Moscovo.
O original encontra-se em blogs.rediff.com/…
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
Patrushev é sem dúvida figura-chave do establishment político e das relações internacionais russas. Ninguém duvida de que falou bem reflectidamente, com o objetivo de enunciar a profunda ansiedade do Kremlin ante a evidência de que o mundo está a poucos passos de uma conflagração no Médio Oriente de consequências imprevisíveis no plano da segurança regional e internacional e da política mundial.
Patrushev, claro, tem acesso a inteligência de alto nível e falou baseado em dados que estão jorrando dos satélites e dos espiões e diplomatas russos. O Kremlin disparou um sinal de alerta.
As entrevistas foram dadas em idioma russo. Posso entretanto reproduzir passagens. Patrushev disse: “Há informações de que membros da OTAN e de alguns estados árabes do Golfo Pérsico, agindo segundo o cenário que se viu na Líbia, trabalham para transformar a actual interferência nas questões internas da Síria em intervenção militar directa.”
Foi específico. “As principais forças de ataque não serão francesas, nem britânicas nem italianas mas, provavelmente, turcas.” Disse que o primeiro passo será criar uma zona aérea de exclusão sobre a Síria, para criar um santuário em território sírio próximo da fronteira turca, para entrada de mercenários que possam ser apresentados como rebeldes sírios. Em resumo, é intervenção ocidental ao estilo “líbio”; e conduzida pela Turquia.
Patrushev disse que a escalada militar alcançará provavelmente também o Irão e há “real perigo” de ataque pelos EUA, destacando que tensões sobre a Síria hoje são, de facto, tensões relacionadas com a questão iraniana. “Querem castigar Damasco menos pela repressão à oposição e mais por a Síria se ter recusado a romper relações com Teerão.”
Sobre a situação iraniana, Patrushev disse: “Já se veem sinais de escalada militar no conflito, e Israel está empurrando os americanos para a guerra. Há perigo real de um ataque militar norte-americano contra o Irão. Nesse momento, os EUA veem o Irão como seu principal problema. Querem converter o Irão de inimigo em parceiro apoiante; e, para conseguir isso, o plano é mudar o actual regime, pelos meios que forem necessários.”
E qual será a provável resposta dos iranianos? Patrushev avalia: “Não se pode descartar que os iranianos sejam capazes de cumprir as suas ameaças de suspender exportações do petróleo saudita pelo Estreito de Ormuz [1] , se sofrerem ataque militar directo.”
Patrushev também se referiu às políticas dos EUA para com a Rússia, China e Índia.
Disse que os EUA estão “persistentemente buscando manter a sua dominação económica, política e militar no mundo”. Põe sob essa luz a instalação dos sistemas de mísseis antibalísticos dos EUA na Europa. “Hoje, [a instalação dos mísseis antibalísticos] talvez não seja grave ameaça à Rússia, mas o objectivo daquela ação, no longo prazo, é reduzir nosso potencial estratégico. Pelo que sei, os planos para uma barreira global de mísseis de defesa norte-americanos também estão sendo negativamente avaliados em Pequim.”
“Apesar das mudanças radicais no alinhamento global de forças, como resultado da modernização, os EUA insistem em manter sua dominação económica, política e militar em todo o mundo. No presente, é importante para os EUA eliminar o que veem como ameaças a essa dominação – e ameaças que vêm da China, como creem os EUA.” (…)
Eis onde a Índia foi mencionada na entrevista de Patrushev: “A administração americana designou a região da Ásia-Pacífico como prioritária em política externa. Os americanos tentam utilizar a Índia como o contrapeso principal ao poder crescente da China e para este objectivo estão a estimular a ideia de cooperação estratégica especialmente estreita com Deli ” [ênfase acrescentada].
Como “amigo de longa data” da Índia, Patrushev, evidentemente, não falaria contra a abordagem dos indianos e as atitudes de ’sedução’ de Tio Sam. Em vez disso, falou da “vizinhança alargada” da Índia:
“Simultaneamente, os EUA buscam acesso directo aos recursos e às facilidades de transporte na vasta área do Cáucaso, do Cáspio e da Ásia Central. Há inúmeras declarações de políticos norte-americanos sobre a necessidade de pôr sob controlo dos EUA a energia, a água e outros recursos da Rússia.”
Mas, apesar de tudo, Patrushev não ignorou a importância que Moscovo dá às relações Rússia-EUA, porque “os EUA são líderes do mundo ocidental e, faça a OTAN o que fizer, as estratégias da OTAN são sempre modeladas em Washington.”
Além disso, “Os nossos países [Rússia e EUA] têm vários e importantes interesses coincidentes em matéria de segurança. Por exemplo, estamos combatendo juntos contra o terrorismo, de entre outras coisas ao tornar acessível a rota do norte para atender as necessidades das forças dos EUA no Afeganistão; estamos enfrentando juntos o crime organizado e o comércio ilegal de armas, narcóticos e substâncias psicotrópicas, e cooperamos também em tentar manter a segurança das informações” – concluiu Patrushev, com boa dose do humor russo, ao acentuar o carácter profundíssimo da actual “parceria” entre Rússia e EUA.
13/Janeiro/2012
[1] Ver Geopolítica do Estreito de Ormuz: Marinha dos EUA pode ser derrotada pelo Irão no Golfo Pérsico?
[*] O autor foi embaixador da Índia em Moscovo.
O original encontra-se em blogs.rediff.com/…
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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