segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Anticomunismo pavloviano*

Anticomunismo pavloviano*

Filipe Diniz
23.Nov.14 :: Colaboradores
Tal como na experiência de Pavlov, há alguma gente que desata de imediato a salivar se ouve dizer “PCP” e “muro de Berlim”. E tem generosas tribunas nos media para desabafar, mesmo nos lugares mais insuspeitos.

Um jornal diário trata de “soviéticos” aviões russos que recentemente sobrevoavam o Atlântico. Um canal de televisão por cabo dedicado ao turismo fala de Kiev, “capital da Ucrânia ocupada pela União Soviética desde finais do séc. XIX”. Nos EUA, o Partido Republicano assenta boa parte do seu recente sucesso eleitoral no ataque à gestão “socialista” de Obama. São exemplos, política e historicamente delirantes, que ilustram o plano em que fundamentalmente opera o anticomunismo: o plano do irracional, o plano do condicionamento subliminar.
É assim que alguma gente desata de imediato a salivar se ouve dizer “PCP” e “muro de Berlim”. Bastou que o “Avante!” – e muito bem – expusesse os elementos essenciais da realidade histórica e política do “muro de Berlim”, do processo que conduziu à sua “queda”, das consequências dessa “queda” (que os povos de todo o mundo sofrem com crescente violência) para se levantar um coro de insultos. Sem um único argumento.
Ou talvez com um argumento: o da história “escrita pelos vencedores”. Ignoram estes anticomunistas pavlovianos que tal história é provisória. Podem agora insultar o PCP de “esquizofrenia política” ou de “reescrita” e “branqueamento” da história. Com a imposição da sua versão do passado querem sobretudo impor a sua versão do presente, um presente em que os trabalhadores e os povos fiquem indefesos e amarrados à exploração. Escreve uma inquieta comentadora que o PCP “permanece hábil a explorar a pobreza e as desigualdades como combustível para alimentar a sua lunática luta de classes”.
Se estivessem tão seguros da sua “história”, a primeira coisa que fariam seria preservar fisicamente o “muro”. O arquitecto Rem Koolhaas, que desde jovem o estudou enquanto realidade urbana, afirmou que o desola “que a primeira coisa a desaparecer depois da queda do muro foi qualquer vestígio dele próprio, […] simplesmente em nome da ideologia”. Porque a Berlim posterior a 1989 se reconstrói segundo um modelo que evoca a cidade que se desenvolveu entre 1870 e 1930, ou seja, entre Bismarck e a ascensão do nazismo. A reescrita da história reescreve a cidade.
A luta de classes constrói o futuro.
*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2138, 20.11.2014
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