Havana (Prensa Latina) Poucos no mundo atrevem-se a negar o
horror do Holocausto, mas as crises econômicas ou o afã por demonizar o
comunismo parece levar a uma perigosa amnésia na Europa: capaz de
tolerar o neofascismo e a revisão do ocorrido na II Guerra Mundial. A
segunda conflagração mundial deixou sem vida nos campos de concentração
fascistas em toda Europa mais de 20 milhões de pessoas, para além dos
cinco ou seis milhões de judeus exterminados, mas é o Velho Continente
onde ressurgem com mais força as tentativas de esquecimento.
Apesar da existência de grandes "monumentos" ao genocídio em Aschwitz,
na mesma Polônia ou na vizinha República Checa, são cada vez mais fortes
as tentativas de demonizar os verdadeiros protagonistas da II Guerra
Mundial ou de, ao menos, suavizar as atrocidades do fascismo hitleriano.
Um pequeno esclarecimento para as memórias europeias: a alta chefatura
do exército nazista alemão dispôs como um de seus principais objetivos a
subjugação de 500 milhões de pessoas e a exterminação da maior
quantidade de judeus e eslavos possíveis, a quem também consideravam
como uma raça débil.
Depois de massacrar quase 200 mil judeus
somente na Alemanha, o regime hitleriano criou os campos de extermínios
para cremar corpos de prisioneiros, um método mais "eficiente" e rápido
que asfixiar com gás tóxico.
No entanto, no Velho Continente, 22
países abstiveram-se e foram incapazes de ratificar em junho deste ano
uma resolução da ONU para condenar as tentativas de revisão da história
na II Guerra Mundial e de reivindicar o fascismo.
Estados
Unidos, o rei da democracia para pedi-la, exigi-la e impô-la, considerou
que a resolução coartava a "liberdade de expressão", isto é, a
liberdade de propagar uma corrente que representa as mesmas ideias do
extermínio e da exclusão hitleriana.
Depois da queda do campo
socialista europeu, muitos se deram à tarefa de reescrever a história e
reduzir a zero qualquer coisa que poderia destacar as bondades do
socialismo para, pelo contrário, tratar de demonizar ou, no menor dos
casos, atenuar a experiência positiva do sistema saliente.
Isso
se fez mais evidente nos próprios países ex-socialistas, sobretudo, em
nações como a República Checa ou Polônia, em que se chegou a proibir por
lei os símbolos alusivos à época socialista ou da extinta União
Soviética.
Os poloneses chegaram a impor proibições para ocupar
cargos públicos a quem a seu momento pertenceram a órgãos de segurança
na época socialista, enquanto mostram mais tolerância, sob o pretexto da
liberdade de expressão, para os neofascistas.
Ademais, chegou-se a ilegalizar a militância em organizações ou partidos comunistas.
Nas pequenas repúblicas com costa no mar Báltico, em sua maioria
reverteu-se o curso da história ao mudar os termos do que ocorreu em II
Guerra Mundial e situar aos fascistas e seus cúmplices nacionalistas
como lutadores pela liberdade, enquanto chamam de ocupantes o Exército
soviético e julgam os antifascistas.
Tais tendências são
observadas enquanto a União Europeia (UE), incansável veladora dos
direitos humanos, observa impassível as violações que são cometidas
contra a comunidade russa na Estônia ou Lituânia, onde constitui quase
50 por cento da população.
Vilna considera os russos como
pessoas sem cidadania, sem direito a votar ou de gozar das prerrogativas
do resto dos lituanos num caso de segregação sem precedentes na Europa
de pós-guerra e sobre o qual a UE prefere calar.
O bloco
comunitário também guarda silêncio sobre as regulações para permitir e
inclusive festejar a criação das formações lituanas de apoio às SS,
enquanto os monumentos aos lutadores contra o fascismo são eliminados ou
transladados a lugares recônditos das cidades.
Como nos tempos
da grande depressão da década de 1930, agora a crise econômica e a
precariedade social se convertem em caldo de cultivo para a ascensão de
formações ultradireitistas como ocorreu na Áustria e depois na
Dinamarca, enquanto avança na França, Alemanha e Hungria.
No
entanto, a formação de um estado de opinião capaz de levar a aceitar a
corrente neofascista possui várias facetas e uma delas poderia estar
relacionada com a assinatura da Declaração de Praga.
O
revanchismo e o afã por reduzir ao mínimo as bondades do socialismo
desatam em seu texto uma condenação ao comunismo que em todo momento,
através da figura de Joseph Stalin, tratam de equiparar com os desmandes
do fascismo.
A declaração, aprovada pelo Parlamento Europeu,
propõe, inclusive, uma revisão dos livros de texto para incluir os
supostos crimes cometidos pelos comunistas, destaca o professor Joseph
Slaviansky.
Para chegar a essa posição prepara-se a opinião
pública. De acordo com o site Global Research, em muitos casos
empregam-se comerciais que tratam de "sanear" a imagem do fascismo ou
suas atrocidades.
De acordo com a mencionada fonte, existem
comerciais de produtos para emagrecer, os quais, para acentuar a
efetividade de sua aplicação, empregam símbolos do sofrimento humano
como os campos de concentração.
Outros anúncios referem-se à
efetividade de uma companhia de gás que apresentam simultaneamente
imagens de câmeras de gás utilizadas nos campos de extermínio.
Precisamente, o mencionado tipo de propaganda é o que propõe proibir a declaração da ONU de junho deste ano.
O documento contou com o apoio de 120 nações incluídas Síria, Cuba, a
República Popular Democrática de Coreia, Israel, Paquistão e Irã, apesar
das acusações de Tel Aviv de que este último reduz a importância do
Holocausto.
A resolução expressa profunda preocupação pela
glorificação do nazismo e pelo tratamento como "lutadores pela
liberdade", dado a antigos membros da SS, um órgão repressivo da
inteligência fascista.
Global Research destaca que a tendência
na Europa é pôr ao mesmo nível as atrocidades perpetradas pelas forças
fascistas contra a população civil, em especial, a judaica, com os
métodos que teria empregado Stalin dentro da União Soviética.
O
objetivo em longo prazo é levar tudo o que é relacionado com o comunismo
a um regime de ilegalidade total e desterrar qualquer indício dos
aspectos positivos da vivência socialista na Europa, comentam
especialistas.
De fato, considera-se que negar a mera existência
do Holocausto é um delito muito menor que o de tratar, com comerciais
de duvidosa reputação, manejar os verdadeiros horrores causados pelas
câmeras de gás ou a dor das pessoas exterminadas nesses centros de
morte.
A isso se soma a propaganda em meios audiovisuais na
Europa, nos quais, sob o manto de conseguir uma maior objetividade do
ocorrido na II Guerra Mundial, se tergiversam abertamente os
acontecimentos nessa conflagração mundial. A preparação pública pela via
citada também permitiu a ascensão a estratos políticos e inclusive ao
poder de organizações abertamente xenófobas ou neofascistas na Europa,
ao mesmo tempo em que leva a uma tolerância de assuntos que, disfarçados
de uma flexibilidade na visão do mundo, sempre foram considerados como
genocídio.
Há uns anos, na Ucrânia, por exemplo, chegou-se a
incluir num concurso televisivo sobre as 100 personalidades mais
importantes da história desse país a líderes como Stepan Bandeira, do
agrupamento fascista UPA, vinculado a massacres cometidos contra
ucranianos judeus ou comunistas durante a II Guerra Mundial.
A
curta memória ou amnésia política da Europa levou à necessidade de
propor na ONU uma resolução sobre a glorificação do fascismo, em
especial, depois da aprovação da Declaração de Praga, à qual se uniu a
maioria dos estados ex-socialistas europeus.
*Chefe da Redação Europa da Prensa Latina
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