quarta-feira, 17 de julho de 2013

Egito: Deposição de Mursi foi golpe revolucionário popular, diz PC egípcio


Queda foi um grande revés contra imperialismo norte-americano na região, afirmou Salah Adli, secretário geral do partido

Na entrevista concedida ao “Nameh Mardom”, órgão central do Comitê Central do Patido Tudeh (Comunista) do Irã, o secretário geral do Partido Comunista Egípcio, Salah Adli, analisa a deposição de Mohamed Mursi, presidente do Egito e membro da Irmandade Muçulmana. Para Adli, após a eleição de Mursi, "as massas descobriram sua natureza autoritária, seu caráter fascista, sua defesa dos interesses dos setores mais reacionários e parasitas do capitalismo e sua inabilidade de governar um estado do tamanho do Egito" e por isso houve uma segunda etapa da revolução, iniciada com a queda de Hosni Mubarak: "O que aconteceu não é um golpe militar de forma alguma, mas um golpe revolucionário da população egípcia que quer se livrar de um governo fascista."
Efe (16/07/2013)

Apoiadores de Mursi protestam no Cairo contra deposição do presidente, eleito após a derrubada de Hosni Mubarak

Além disso, sustenta o político egípcio, a campanha capitaneada pelo Movimento “Tamarod ” (Rebelião), que recolheu mais de 20 milhões de assinaturas contra o presidente egípcio, teve amplo respaldo da população. " Todos os partidos, sindicatos e organizações participaram da coleta de assinaturas, e a campanha se espalhou pelas ruas das cidades, fábricas, escolas e universidades e vilas em todas as províncias do Egito", garantiu.

De acordo com ele, os próximos passos reafirmam o caráter transformatório pelo qual passa o país, que são o de "se opor à dependência dos EUA; a recusa a a sucumbir à hegemonia sionista, a alteração dos acordos de Camp David; o reestabelecimento do papel nacional do Egito na região árabe africana em níveis nacionais e internacionais e o aprofundamento do relacionamento com países e populações do terceiro mundo".

Q1: Nas recentes declarações do Partido Comunista Egípcio (do dia 3 de julho) o senhor fez referência ao fato de que um movimento massivo de protesto é feito de várias classes e estratos. Como as classes e estratos da sociedade egípcia se mobilizaram na segunda onda da revolução de 30 de junho?
Salah Adly:  Desde a eclosão de revolução no dia 25 de janeiro de 2011, os movimentos de protesto não têm diminuído e as manifestações de milhões de pessoas não cessaram, isto é, o estado revolucionário das massas sempre esteve ali, diminuindo algumas vezes e se acendendo outras. Os protestos dos trabalhadores e as greves também tiveram uma escalada. Depois do sucesso de [Mohamed] Morsi  da chegada ao poder da Irmandade Muçulmana, as massas descobriram sua natureza autoritária, seu caráter fascista, sua defesa dos interesses dos setores mais reacionários e parasitas do capitalismo e sua inabilidade de governar um estado do tamanho do Egito.

Além disso, a traição dos interesses da sua terra e a vontade deles de agir como o maior intermediário para manter os interesses da América  e de Israel na região foram expostos. Eles concluíram a trégua em Gaza e deram à América e a Israel até mesmo o que o regime cliente de Mubarak [o ditador deposto em 2011]  tinha dado. O projeto sectário e obscurantista deles, que é hostil à democracia, à ciência, à cultura e à tolerância, se tornou muito evidente. Mais importante, as massas descobriram a falsidade do uso de slogans religiosos para mascarar seus planos a serviço do projeto do Grande Oriente Médio e do “caos criativo.”

Dessa forma, o número de protestos sociais (greves, manifestações pacíficas e piquetes) chegou a 7400 – número aceito por Mohamed Morsi – durante o ano passado. A taxa de desemprego chegou a 32%, sendo que a maior parte dos desempregados tem títulos universitários ou médios. A dívida externa aumentou de $34 bilhões para $45 bilhões. A dívida doméstica aumentou em 365 bilhões de libras egípcias durante o reinado de Morsi no ano passado. O número de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza aumentou para mais de 50% da população.

Resumidamente, a maior parte das classes e estratos da sociedade – e suas forças liberais, nacionalistas e esquerdistas, assim como os movimentos da juventude, a maior parte deles de orientação esquerdista e nacionalista, somados à maior parte das instituições estatais, especialmente o exército, o judiciário, a imprensa e a polícia – sentiu que existia um grande perigo na permanência da Irmandade Muçulmana no poder dada a sua busca ardente pelo monopólio do poder e por excluir qualquer um que não esteja do lado deles, com exeção dos seus aliados entre os grupos terroristas que se escondem atrás da religião.

Até largas seções da média e da alta burguesia egípcia nos setores do turismo, indústria, comércio, agricultura e construção temeram por seus interesses no caso da continuidade do governo da Irmandade Muçulmana, que estava criando uma atmosfera de caos, insegurança e instabilidade.

Divulgação
O Movimento “Tamarod ” (Rebelião) conseguiu coletar mais de 22 milhões de assinaturas para a retirada da confiança em Morsi e para apoiar a convocação de eleições presidenciais antecipadas.
[Salah Adli: "o que aconteceu no dia 30 de junho é uma segunda onda da revolução egípcia"]
Todos os partidos, sindicatos e organizações participaram da coleta de assinaturas, e a campanha se espalhou pelas ruas das cidades, fábricas, escolas e universidades e vilas em todas as províncias do Egito.
A grande importância dessa campanha é que ela foi capaz de envolver os cidadãos egípcios ativamente no movimento revolucionário para derrubar o governo da Irmandade Muçulmana.

Ela também restabeleceu o caráter democrático e pacífico da ação revolucionária e formou as bases para remover a capa sagrada da falsa legitimidade das urnas como o único critério para legitimidade e para o sistema democrático. O chamado para recolher assinaturas foi acompanhado pelo chamado por manifestações em todas as principais praças do Egito no dia 30 de junho como um teste central da credibilidade dessa campanha e da base fundamental para a legitimidade revolucionária das massas para derrubar esse regime fascista e frustrar o projeto do Estado religioso.

A resposta das massas da população egípcia foi ótima e as maiores manifestações na história do Egito, e até na história do mundo, aconteceram. Isso foi confirmado pelo índex do “Google Earth”. Mais de 27 milhões de protestantes saíram ao mesmo tempo em todas as províncias do Egito, representando várias classes e estratos da sociedade egípcia, encarando os protestos que não excederam 200 mil pessoas da Irmandade Muçulmana e de seus aliados em uma pequena praça do Cairo. Assim, os egípcios estavam de um lado e a Irmandade Muçulmana do outro lado, isolada. Essa é a realidade do cenário. Essa é a realidade sobre a qual qualquer avaliação da situação ou qualquer análise político-científica deve ser baseada.

Nós acreditamos que o que aconteceu no dia 30 de junho é uma segunda onda da revolução egípcia que é mais forte e profunda do que a primeira onda de 2011. Aconteceu para corrigir o caminho da revolução e tomá-lo de volta das forças da extrema direita religiosa que tinha conspirado para roubar a revolução e usar essa onda para servir seus objetivos fascistas e reacionários e os esquemas do imperialismo global.

Q2: Qual é o nível de participação das classes laborais e dos trabalhadores nesses protestos? Por que os trabalhadores participam da batalha com o Islã político por direitos democráticos?
SA: Os slogans básicos da revolução de janeiro eram: pão, liberdade, justiça social e dignidade humana. É uma ligação essencial com a revolução democrática nacional e veio depois de um longo período histórico que começou na metade dos anos 70 do século passado, com o domínio do grande capitalismo dependente e um ciclo completo de regressão, atraso e tirania. Durante esse período, as forças reacionárias, em aliança com o imperialismo mundial e a reação árabe, conseguiu fortalecer um clima que permitiu que a corrente do Islã político – especialmente a Irmandade Muçulmana – se espalhasse e ascendesse. As forças à esquerda foram enfraquecidas, os trabalhadores foram deslocados e as grandes indústrias foram liquidadas a fim de desferir um golpe contra qualquer possibilidade de alcançar um desenvolvimento abrangente.
Na verdade, os trabalhadores se envolveram na maior parte da escalada de protestos desde 2006 e estão participando de todas as manifestações populares como parte do povo e não como uma organização de classe. Isso acontece por causa da falta de organizações sindicais fortes e de federações devido a um grande legado de tirania e de repressão governamental para controlar as federações e sindicatos. É também devido às grandes mudanças no mapa de classes e na natureza da composição da classe trabalhadora nos vários setores, que se deu durante o período passado.

Indústrias de pequeno e médio porte controladas pelo setor privado foram usadas como argumento, quando os trabalhadores foram impedidos de formar sindicatos. A classe trabalhadora não emergiu na revolução em uma forma clara de classe. Como resultado da falta de união efetiva entre as forças de esquerda e sua fraqueza durante o período anterior por muitas razões, que não temos espaço aqui para mencionar, o movimento trabalhista não apareceu de uma maneira efetiva e influente proporcional ao tamanho de sua participação e de seus grandes sacrifícios na revolução.

É importante esclarecer que os trabalhadores do setor público descobriram que as práticas e atitudes da Irmandade Muçulmana não eram diferentes das orientações do regime de Mubarak, eram na verdade piores. A Irmandade Muçulmana implementou algumas políticas de continuação do programa de privatizações e de liberação dos preços, e não aumentou o salário mínimo mesmo apesar de essa ser uma das primeiras demandas da revolução. Eles até reduziram os impostos dos empresários, continuaram a privatização dos serviços e se recusaram a implementar o programa de seguro de saúde. Eles insistiram em vender e hipotecar os ativos do Egito e suas instituições através do projeto de “laços islâmicos” que eles correram para aprovar no Conselho Shura [a câmara alta do parlamento, equivalente ao Senado], controlado pela Irmandade Muçulmana.

A posição mais perigosa foi a recusa de passar a lei para assegurar a liberdade de formação de sindicatos, que eles tinham acordado com todas as forças políticas e sindicatos atuantes antes da revolução, e a substituição dos homens de Mubarak na União Geral dos Trabalhadores Egípcios, controlada pelo governo, por seus próprios homens. Essa é a base social e democrática para o viés favorável da classe trabalhadora contra o domínio da Irmandade Muçulmana e contra as forças do Islã político, somada às outras razões que mencionamos antes.

Qualquer um que imagine que os trabalhadores só se revoltam por questões factuais ou econômicas está errado. Os trabalhadores estão mais atentos para os perigos do projeto da extrema direita religiosa e suas práticas fascistas de direita em todos os campos democráticos, políticos, econômicos, sociais e nacionais.

Q3: Nas suas declarações, o Partido Comunista Egípcio caracteriza os acontecimentos atuais como uma revolução... Qual é a natureza, as tarefas e as demandas urgentes da revolução?
SA: Sim, o que está acontecendo agora é uma revolução. É precisamente a segunda grande onda da revolução de janeiro de 2011, já que a primeira onda foi abortada porque foi roubada pela Irmandade Muçulmana apesar do fato de que ela não participou da convocação r produção. É uma revolução democrática com uma orientação social e patriótica clara. Está continuando, e muitos estratos sociais e diversas forças políticas (liberais, nacionalistas e esquerdistas) tomaram parte nela. Com a continuação da onda revolucionária, a verdade sobre as várias posições se tornou mais clara e as orientações dessas forças e sua vontade de continuar no caminho da revolução vão sendo revelados.

A primeira tarefa democrática da revolução é promulgar uma nova Constituição civil democrática que realce os direitos humanos, os direitos das mulheres e os direitos sociais para as classes trabalhadoras, e que não negue o direito de as pessoas escolherem seu sistema político e econômico no futuro de acordo com a balança das forças. Assim, a tarefa de derrubar uma Constituição sectária, reacionária e distorcida, em vez de apenas emendá-la, é uma tarefa fundamental para as forças democráticas e progressistas no momento presente.

Uma das tarefas da revolução democrática é também a liberdade de formar sindicatos, partidos políticos e associações sem a interferência do governo, rejeitando a formação de partidos políticos de base sectária e religiosa, [promovendo] a igualdade total entre homens e mulheres em termos de direitos e deveres, a igualdade perante a lei e a criminalização da discriminação religiosa e de outras formas de discriminação.

Uma das tarefas sociais é formular um plano de desenvolvimento social abrangente que seja baseado em estimular os setores produtivos com a necessidade de distribuição equitativa do produto em desenvolvimento e riqueza para beneficiar os pobres e trabalhadores para que seja possível alcançar as demandas sociais urgentes. Algumas das prioridades entre essas demandas são determinar um salário mínimo e máximo e ligado aos preços; o cancelamento das dívidas de pequenos agricultores; a redistribuição dos itens do orçamento para aumentar o gasto em saúde e educação; o fornecimento de habitação para pessoas de baixa renda; o aumento de impostos para os ricos; a recuperação da posse das corporações do setor público que foram pilhadas e a luta contra a corrupção.

As tarefas nacionais são: se opor à dependência dos EUA; a recusa a a sucumbir à hegemonia sionista, a alteração dos acordos de Camp David; o reestabelecimento do papel nacional do Egito na região árabe africana em níveis nacionais e internacionais e o aprofundamento do relacionamento com países e populações do terceiro mundo.

Q4: Os atuais acontecimentos no Egito significam uma rejeição do “Islã político” ou apenas uma rejeição da “Irmandade Muçulmana” pelas pessoas do Egito?
SA: A Irmandade Muçulmana é a organização mais efetiva e influente entre as forças do Islã político. Todas as organizações, incluindo os grupos Salafi e Jihadistas, eram aliadas da Irmandade Muçulmana e se posicionaram ao lado deles na última batalha para defender o regime deles porque sabiam que a sua derrota representaria a grande derrota do projeto islâmico sectário que é apoiado pelos EUA como uma alternativa para o colapso dos regimes autoritários. Apenas o partido Salafi al-Nour foi excluído da aliança na última batalha devido a considerações relacionadas à sua associação com a Arábia Saudita, apesar de nós estarmos cientes de que é um partido reacionário e sectário que é hostil aos direitos humanos e aos direitos das mulheres e das minorias, incluindo outras seitas islâmicas. Isso ficou evidente quando eles incitaram o crime dos assassinatos de xiitas e o arrastamento de seus corpos no horrível massacre que aconteceu em um vilarejo no mês passado.

Nós acreditamos que a batalha não terminou e que é necessário que haja uma lista política, social e cultural para esmagar a resistência deles e mudar o clima geral que tem sido o corrente por décadas.

Mas nós queremos chamar atenção para o fato de que o que está acontecendo no Egito hoje não é apenas um confronto da Irmandade Muçulmana e de seus aliados entre as forças da direita religiosa com as instituições de segurança do Estado. Eles estão de fato confrontando o povo do Egito de todas as seitas e correntes bem como todas as instituições estatais, incluindo o judiciário, a mídia e a cultura. Em bairros e vilarejos, a Irmandade Muçulmana vai agora confrontar as massas do povo egípcio, já que eles certamente perderam o apoio de grandes segmentos de pessoas ao longo dos últimos dois anos. Mas o exército e as forças de segurança terão um papel importante em confrontar as milícias terroristas armadas deles.

Em resumo, nós vemos que o que aconteceu é uma grande derrota para o projeto da direita religiosa em geral, e não apenas para o projeto da Irmandade Muçulmana. Terá grandes implicações na região no período que seguirá.

Q5: Qual sua visão sobre os argumentos que dizem que a deposição de Morsi não é democrática porque ele foi eleito legalmente e a nova Constituição foi ratificada através de um plebiscito? Houve um golpe de Estado do exército egípcio contra Morsi?
SA: Aqueles que depuseram Morsi são mais de 22 milhões de cidadãos do Egito: pessoas que assinaram um documento que continha o nome dos signatários, número de identidade, e o nome da província, escrito à mão e não pela internet, em um plebiscito sem precedentes que culminou na “grande tomada” das praças por mais de 27 milhões de manifestantes no dia 30 de junho, e que continuou por 4 dias consecutivos. Foi Morsi quem deu um golpe na legitimidade quando ele emitiu sua declaração constitucional ditatorial em novembro de 2011. Foi Morsi quem devastou os direitos humanos quando seus defensores terroristas sitiaram o Tribunal Constitucional, quando a milícia dele torturou protestantes em frente do Palácio al-Ittihadyah [o palácio presidencial], como foi mostrado por investigações feitas pelo escritório do promotor público, e quando os homens dele mataram manifestantes em frente da sede do Partido da Liberdade e da Justiça (o braço político da Irmandade Muçulmana) nos termos de ordens explícitas do líder do grupo e deputado dele, como confessaram os assassinos frente ao promotor público.

Foi Morsi quem renegou a promessa que ele tinha anunciado no dia que conseguiu emendar a Constituição e formar um governo de coalizão. Ele e o grupo dele insistiram em se submeter às condições do Fundo Monetário Internacional e também declararam Jihad contra a Síria em uma conferência de forças terroristas jihadistas sem consultar o exército e o Conselho de Defesa Nacional.
Efe (08/07/2013)

Desde a deposição de Mursi, enfrentamentos entre simpatizantes e opositores do presidente deixaram mortos e feridos

Dessa forma, todos os partidos e forças políticas, e até o Partido Salafi al-Nour, que pulou fora do navio antes que ele afundasse, apoiaram eleições presidenciais antecipadas. Esse chamado não é um golpe contra a democracia, em vez disso emana do coração da democracia popular quando qualquer presidente trai as promessas que fez ao povo e o programa que foi base para que as pessoas o elegessem.

Limitar a causa da democracia às “urnas eleitorais” é uma pilhagem completa da essência da democracia e uma rejeição explícita do direito das pessoas se revoltarem contra seus governantes autocráticos e os regimes fascistas que usam a religião para esconder sua natureza reacionária e sua orientação capitalista de direita.

A defesa de Morsi pelos EUA e pelos países ocidentais capitalistas e a representação do tema como um “golpe militar” contra a “legitimidade constitucional” é uma posição formal que esconde o fato de que o imperialismo internacional morre de medo das revoluções populares e da habilidade delas de transcender os estreitos limites da democracia burguesa que representam, em essência, a forma ideal de atender os interesses dos empresários e dos monopólios e de seus agentes locais em controlar os destinos das populações dos países de Terceiro Mundo.

O que aconteceu não é um golpe militar de forma alguma, mas um golpe revolucionário da população egípcia que quer se livrar de um governo fascista. O que o exército fez foi colocar em prática a vontade das pessoas e protegê-las das tramas da Irmandade Muçulmana e de seus aliados terroristas armados que querem inflamar a luta sectária e as guerras civis, dividir o exército egípcio e destruir as instituições do Estado egípcio para servir os interesses do imperialismo e do sionismo na região.

Que tipo de golpe militar é esse em que dezenas de milhões de pessoas estão nas ruas? Que tipo de golpe militar é esse em que o chefe do Tribunal Constitucional já assumiu o poder, que é quem foi exigido pela Frente Islâmica de Salvação, que inclui todas as forças de oposição com suas várias orientações e o movimento “Tamarod” (Rebelião) da juventude, e foi sancionado pelas massas do povo egípcio? Que tipo de golpe militar é esse no qual um governo feito de pessoas civis qualificadas será formado e que terá poderes totais durante um período que não exceda um ano e que terminará com a promulgação de uma constituição civil democrática e eleições presidenciais e parlamentares que todos fazem questão de que aconteçam?

Que tipo de golpe militar é esse que permite o direito a protestos pacíficos mesmo dos seus opositores e que não impõe um estado de emergência? A declaração de Al-Sisi, o chefe do exército egípcio, na qual ele dá o mapa para a fase de transição, só foi feita depois do diálogo e consenso com os representantes do povo egípcio, incluindo a juventude do movimento “Tamarod” (Rebelião), os representantes de Frente Islâmica de Salvação, o sheik de Al-Azhar, o Papa de Alexandria e uma representante das mulheres. Os egípcios celebraram nas maiores praças, bairros e vilarejos essa grande vitória do povo egípcio e a observância do exército nacional.

Nós deveríamos, como foi ensinado pelo marxismo, partir da realidade concreta e não confinar nossa visão às ideias rígidas pré-determinadas e a fórmulas prontas. Não é digno de nota que a mídia ocidental fechou os olhos para tudo isso e insiste que o que está acontecendo é um golpe de estado?

Ainda assim, estamos cientes da necessidade de estar alerta e prestar atenção durante a próxima fase para garantir que o papel militar nessa fase seja limitado à proteção das pessoas e à segurança nacional egípcia e que o exército cumpra suas promessas de não interferir diretamente em assuntos políticos, e da necessidade de as pessoas continuarem nas praças para assegurar a implementação das suas demandas na fase de transição.

Q6: Qual é a sua avaliação da posição dos EUA em relação aos acontecimentos no Egito?
SA: Os EUA foram surpreendidos pela revolução de janeiro de 2011, mas estavam se preparando para cenários de mudança no Egito antes disso, quando sentiram que o regime Mubarak tinha envelhecido. Então o país interveio imediatamente depois que ele foi derrubado para formar uma aliança pelo poder com a Irmandade Muçulmana depois que eles asseguraram que iriam cumprir os interesses dos EUA, garantindo a segurança de Israel e dando continuidade à política econômica neoliberal que é contra os interesses das massas populares.

Mas os EUA descobriram depois de um tempo a extensão da inabilidade da Irmandade Muçulmana em lidar com os temas de governança, sua falta de pessoal qualificado e sua insistência em se aliar aos grupos jihadistas em vez de se aliar às foças liberais e de unir a grande classe dos capitalistas com seus variados estratos em um sistema estável baseado na transferência de poder que gira na órbita dessa classe e assegura os interesses da América. Os EUA estavam ao mesmo tempo interessados em garantir os interesses e privilégios da instituição militar para garantir sua lealdade.

Mas os EUA estavam ao mesmo tempo com medo da continuação da situação revolucionária no Egito, a escalada crescente de protestos e da rejeição popular do governo de Irmandade Muçulmana. Assim, fez pressão sobre a Irmandade Muçulmana para fazer reformas, e também fez pressão sobre as forças liberais de oposição, especialmente aquelas que representavam os interesses do grande capital: o Partido Wafd, o Partido dos Egípcios Livres, e o Partido da Constituição para apressar as eleições parlamentares, e a aliança deles com as forças de esquerda para rejeitar as orientações revolucionárias dos movimentos juvenis que acreditavam que os objetivos da revolução e a erradicação do regime da Irmandade Muçulmana só poderiam ser alcançados com uma revolução popular grande contra ele e com o boicote das eleições.

Quando o “Tamarod” (Rebelião), e sua ideia genial de tirar a legitimidade de Morsi, foi bem sucedido, colocou a todos em um dilema quando grandes porções da população e das forças políticas responderam . Isso colocou um fim à hesitação de todos os partidos e forças, eles se reuniram atrás da opção popular de derrubar Morsi e conduzir eleições presidenciais antecipadas. Essa demanda cresceu pelo chamado para derrubar o regime da Irmandade Muçulmana, mudando a Constituição e corrigindo o curso da revolução através de uma nova legitimidade revolucionária e uma nova fase de transição em uma base apropriada.

A Irmandade Muçulmana, os norte-americanos, o exército, e até as forças da oposição política e da juventude, não imaginavam que a resposta da população seria deste poderoso tamanho, o que forçou todos eles a implementar a vontade do povo.

Nós sabemos que os EUA exerceram pressão de maneira flagrante sobre os líderes do exército das forças políticas liberais para não derrubarem Morsi e apenas fazer grandes reformas. Mas era tarde demais e todos perceberam que o povo tinha falado e que a alternativa seria a escalada de uma guerra civil, a escalada do terrorismo e dos conflitos sectários, uma porta aberta para a intervenção externa.

A chegada a este ponto crítico levou à deposição de Morsi e à intervenção do exército de uma maneira que serve aos objetivos da revolução neste ponto. É digno de nota que essa é a primeira vez que o exército egípcio desobedeu ordens da América porque se deu conta da natureza dos grandes perigos que iriam cair sobre ele e sobre sua terra natal caso se negasse a dar apoio à revolução.

As forças democráticas e nacionais perceberam que os líderes do exército têm interesses e privilégios que querem preservar, e eles também têm um papel no poder sem uma intervenção política direta. Nós acreditamos que isso tem de ser levado em consideração com ênfase em corrigir gradualmente as coisas durante a próxima fase.

Nós esperamos que os EUA, no período crítico atual, encoraje conspirações para inflamar rebeliões e contendas e para encorajar esses grupos a incitar o caos para conseguir os esquemas de “caos criativos” e transformar o Egito em outro Iraque. Isso é o que aconteceu e foi revelado na conspiração de sexta-feira, dia 5 de julho. Essa conspiração foi chamada pela juventude de “a Agressão Tripartite – EUA – Israel – Irmandade Muçulmana” contra o povo do Egito. O plano focava em abortar a revolução,   restabelecer Morsi, espalhar o caos e o terror através de manifestações que ocupariam as praças da Libertação fazendo uso de armas e terrorismo, lançando uma campanha de rumores e uma guerra de desinformação sem precedentes no Egito com o fim de criar divisões entre a população e o exército e dentro do próprio exército, e conspirar com os grupos jihadistas no Sinai para declar essa uma área liberada em conluio com Israel e os grupos islâmicos em Gaza.

O Egito viveu horas críticas depois do discurso de terrorismo e intimidação feito pelo líder do grupo fascista, a Irmandade Muçulmana, para seus apoiadores em na praça de Rabi’a al-Adawiyya, em Nasr City, no Cairo. Esse era o sinal para o começo dessa grande conspiração que ia se voltar contra a vontade popular. A CNN, assim como os canais de TV da BBC árabe tiveram um perigoso papel nesse esquema. Mas o povo e o exército foram capazes de frustrar essa conspiração e o vergonhoso papel da América e a traição da Irmandade Muçulmana contra seu povo e sua terra natal foi exposta. Esse foi um grande golpe contra os esquemas da América e do imperialismo na região, e reafirmou o triunfo da revolução e da vontade do povo contra as forças contrarrevolucionárias.

Q7: Qual a sua avaliação do recém-nomeado presidente interino, Adly Mansour, e o que ele deveria fazer imediatamente?
SA: Ele é um juiz e é conhecido por sua integridade e competência, e não professou nenhuma posição política ou adotou certos vieses. O discurso que ele fez depois de tomar posse como presidente interino do período de transição foi um discurso bom e positivo. Ele ressaltou que foi “o povo sozinho” que o autorizou, e que os poderes concedidos a ele eram honorários, mas que a real autoridade vai residir no primeiro ministro que será escolhido por consenso entre as forças nacionais e as forças sociais. Uma das prioridades do governo será deter o colapso econômico, implementar demandas urgentes dos trabalhadores e fornecer segurança.

Nós enxergamos a necessidade da continuidade da pressão pública nas praças, o que foi confirmado pela declaração de Al-Sisi, protegendo o direito a manifestações pacíficas. Isso para garantir que não haja nenhum desvio do que foi acordado e para garantir o sucesso dessa fase difícil de transição.

Q8: Quais sãos os principais desafios que o seu partido enfrenta, especificamente em relação a outras forças polícias e em criar uma aliança unificada?
SA: O principal desafio é a necessidade de unir as forças da esquerda em primeiro lugar para confronter as grandes tarefas que estamos enfrentando nessa fase. As mais importantes são:

1) Garantir a conquista dos objetivos e tarefas da fase de transição.
2) Conquistar um consenso sobre um candidato único para as forças nacionais e democráticas lutarem a batalha das eleições presidenciais.
3) Formar uma frente de forças esquerdistas. nasseristas, movimentos de de juventude e sindicatos; preparar listas conjuntas para lutar pelas eleições parlarmentárias e locais que virão; e fazer pressão para garantir que não haja nenhum passo atrás em corrigir o caminho da revolução na fase de transição.
4) Procurar completar e desenvolver a estrutura do partido, renovar o partido com sangue novo e desenvolver seu program para que que nós possamos encarar os grandes desafios que nós estamos enfrentando.

* Essa entrevista com Salah Adli, secretário geral do Partido Comunista Egípcio, foi conduzida por “Nameh Mardom”, o órgão central do Comitê Central do Patido Tudeh (Comunista) do Irã.

Tradução: Kelly Cristina Spinelli

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