domingo, 5 de julho de 2015

Carlos Lopes Pereira / Lágrimas de crocodilo também na Tunísia*

Lágrimas de crocodilo também na Tunísia*

Carlos Lopes Pereira
04.Jul.15 :: Outros autores
O imperialismo bombardeia, invade, ocupa e destrói estados como o Iraque e a Líbia. Tenta fazer o mesmo com a Síria. Massacra populações civis. Para atingir os seus objectivos, cria, arma e treina organizações terroristas como a Al-Qaida ou o Estado Islâmico. E, depois, quando há atentados brutais e sanguinários como os da Tunísia, atribuídos àqueles grupos, derrama lágrimas de crocodilo e «esquece-se» da sua responsabilidade directa.


A Grã-Bretanha vai reforçar ainda mais as medidas internas de segurança e anunciou uma resposta de «grande alcance» contra o «terrorismo» islâmico.
A ameaça surgiu depois do ataque, na sexta-feira, a uma estância turística perto de Susa, na Tunísia, que custou a vida a uma trintena de cidadãos britânicos. Um jovem tunisino, empunhando uma metralhadora, disparou sobre turistas na praia, matando 38 pessoas e ferindo outras quatro dezenas.
Identificado como Seifeddine Rezgui, de 23 anos, foi abatido pelas autoridades tunisinas e, segundo o El País, de Madrid, não terá actuado sozinho. A polícia tunisina já deteve vários «suspeitos» que poderiam ser coniventes no atentado. O Ministério do Interior pediu ajuda à população para capturar «dois perigosos terroristas», cujos nomes e fotografias foram divulgados através dos media.
Um jornal tunisino, Le Temps, dá pormenores sobre o jovem Rezgui. Originário de Gaafour, uma pequena aldeia no Noroeste do país, a 80 quilómetros da capital, frequentou o Ensino Superior na cidade santa de Kairuan. Antes de ser associado a círculos islâmicos radicais, «dançava break-dance e gostava do Real Madrid». Em redes sociais como o Twitter e o Facebook, manifestava desde há muito simpatias pela «guerra santa» do Islão.
À radiotelevisão BBC, o primeiro-ministro David Cameron disse que o extremismo islamita «declarou guerra à Grã-Bretanha» e ataca os cidadãos britânicos em casa e no estrangeiro. «Somos um seu objectivo», afirmou, referindo-se ao grupo Estado Islâmico (EI), que reivindicou a autoria do atentado. Cameron prometeu uma resposta de «grande alcance» e defendeu o seu envolvimento na luta contra o EI no Iraque – e na Síria –, onde a aviação britânica é a que mais bombardeamentos efectua, depois da norte-americana. E onde, no terreno, há centenas de conselheiros militares ingleses.
A ministra do Interior britânica, Theresa May, visitou já o hotel Imperial Marhaba, nos arredores de Susa, onde ocorreu a carnificina, e falou de «um desprezível acto de crueldade». O governo de Londres, explicou, está decidido a derrotar os autores do ataque. «Os terroristas não vencerão», garantiu May, que se reuniu com os seus homólogos da Tunísia, Alemanha, França e Bélgica, países que também contam vítimas mortais em Susa.
Hipocrisia ocidental
O jornal The Guardian noticiou entretanto que o governo britânico vai acelerar as medidas securitárias, previstas no programa eleitoral com que os conservadores obtiveram a maioria absoluta nas legislativas de Maio. Visam combater as mensagens «extremistas» nas redes sociais e proibir actividades de organizações «extremistas, não necessariamente violentas».
Também na Tunísia estão a ser adoptadas novas medidas de segurança, «dolorosas mas necessárias», nas palavras do presidente Beyi Caid Essebi, de 88 anos, que lidera o processo de normalização constitucional no país, após a conturbada «primavera árabe» que eclodiu em 2011.
O governo – nomeado há seis meses e desgastado por greves laborais e protestos populares – mobilizou centenas de polícias e soldados para vigiar praias, museus e outros locais turísticos. Ao mesmo tempo, determinou o encerramento de 80 mesquitas salafistas e de associações laicas democráticas e proibiu homens com menos de 35 anos de viajar para a vizinha Líbia. Ali se movimentam grupos radicais islâmicos que alegadamente recrutam e treinam jovens «terroristas» tunisinos.
Estas medidas não impediram a debandada da Tunísia de milhares de turistas ocidentais. A ministra do Turismo, Selma Elloumi, classificou o ataque de Susa como «uma catástrofe económica», que afundou as esperanças do país norte-africano de recuperar das consequências do ataque ao Museu do Bardo, em Tunes, em Março, igualmente contra turistas (22 mortos).
É claro que a Grã-Bretanha aplaude tais medidas de cariz autoritário. Na edição de domingo, The Observer escrevia que «é no melhor interesse do Ocidente fazer tudo o que pode para evitar que a Tunísia siga os passos da Líbia para a instabilidade crónica, despertando uma nova vaga de migrantes no Mediterrâneo».
Aqui, importa denunciar a hipocrisia ocidental, também na Tunísia.
No quadro da sua política imperialista, os Estados Unidos, apoiados pelos seus aliados habituais – como a Grã-Bretanha – bombardeiam, invadem, ocupam e destroem estados como o Iraque e a Líbia. Tentam fazer o mesmo com a Síria. Massacram populações civis. Para atingir os seus objectivos, criam, armam e treinam organizações terroristas como a Al-Qaida ou o Estado Islâmico. E, depois, quando há atentados brutais e sanguinários como os da Tunísia, atribuídos àqueles grupos, derramam lágrimas de crocodilo e «esquecem-se» da sua responsabilidade directa…
*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2170, 2.07.2015
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