1 – RECORDAR O PASSADO
É sabido que quem esquece as lições do passado está
destinado a repeti-lo. Por isso vale a pena debruçar-nos sobre
situações ocorridas aquando da instauração do
fascismo salazarista e situações atuais. Trazer à
memória aqueles tempos dramáticos não parece irrelevante
tanto mais que persiste o seu branqueamento, parecendo que o único
problema seria a "censura", apresentada sobretudo nos seus aspetos
mais ridículos.
Perante o golpe militar de 28 de maio de 1926, no mesmo dia, um então
pequeno partido, o PCP, é o único a caracteriza-lo como um golpe
fascista. No golpe participavam o comandante Mendes Cabeçadas, um
histórico da instauração da Republica, deseja manter o
regime constitucional republicano, mas está conotado com a direita; o
general Gomes da Costa, homem da Grande Guerra, assume-se como líder da
direita, aspira a uma ditadura presidencialista.
Carmona só adere ao movimento a 2 de junho. É quase um burocrata
militar, mas é o homem de confiança da oligarquia. Evidenciara-se
como procurador no Tribunal Militar que julgou os responsáveis pelo
golpe contra a Republica em 18 de abril de 1925, ao assumir não o papel
de acusador mas de defensor: "Por que estão sentados no banco dos
réus? Porque a Pátria está doente e manda julgar e acusar
os seus melhores filhos". (TCP – 153 ou S FN, vol.1, p.288). Pode
dizer-se que traía as suas funções, o Estado e a
Constituição que tinha a obrigação de defender. Num
julgamento similar, os sediciosos do "19 de julho" são
também ilibados, ante os protestos da esquerda.
Mendes Cabeçadas assume de início a presidência e a chefia
do governo, um golpe de Gomes da Costa demite-o e prende-o a 17 de junho;
Carmona é nomeado chefe do governo. Gomes da Costa em 9 de julho
é também demitido e exilado para os Açores. Carmona
torna-se assim o chefe da ditadura fazendo-se eleger Presidente da Republica,
como candidato único, em 1928. A então "Ditadura
Militar" passa a "Ditadura Nacional". Estava escancarada a porta
à instauração do fascismo.
O "paternal" Carmona intensifica a repressão, a máscara
de tolerância que pusera para os golpistas absolvidos não se
aplica aos democratas: milhares de adversários são presos, muitos
deles deportados para Angola e Timor: políticos, militares republicanos,
sindicalistas, comunistas.
Como se chegou aqui? Em 1924, o governo de direita de Álvaro de Castro
para equilibrar as contas públicas aplica medidas de
"austeridade", muito semelhantes às atuais: despedimento de
funcionários públicos, fecho de tribunais, redução
de efetivos e despesas militares, extinção ou
redução de pessoal em consulados, cortes nas diversas despesas do
Estado.
Perante a contestação, o governo cai numa moção de
confiança. A 22 de novembro de 1924 toma posse José Domingues dos
Santos
[1]
, um homem da esquerda republicana. A sua noção de
equilíbrio das contas públicas é diferente. Promove a
remodelação e intervenção no sistema
bancário para "o desviar das operações
especulativas" e "repatriar fortunas evadidas"; legisla a
expropriação de terras declaradamente deixadas incultas;
apresenta um projeto de reforma agrária; pretende canalizar os recursos
do país para aplicações produtivas, tem um programa de
justiça social, assistência e previdência. (TCP p.149 e S
FN, vol1, 262) Revoga a "lei das associações", que
proibia as federações sindicais e impunha
autorização policial para reuniões sindicais. (HP vol.6 p.
230) Anuncia o reconhecimento da URSS. (idem p. 627)
PCP, Sindicatos, Cooperativas Operárias, o Socorro Vermelho, apoiam o
governo em grandes manifestações em Lisboa. Numa delas, na
praça do Município, Domingues dos Santos declara: "O governo
da Republica colocou-se abertamente ao lado dos explorados contra os
exploradores" "O povo tem sido explorado pelo alto comércio e
pela alta finança". (TCP p.150)
A União dos Interesses Económicos (UIE) desencadeia intensa
campanha de insídia contra o governo, Domingos dos Santos reage, a
Associação Comercial de Lisboa é encerrada por
rebelião. A UIE faz campanha contra os "políticos",
"os exagerados impostos", protesta porque "o povo que vive
mal" e proclama que "é preciso impormo-nos aos
políticos". O populismo atual ao serviço da oligarquia
não se exprime de maneira diferente.
Domingues dos Santos, procura construir um bloco baseado no antifascismo,
porém a 11 de fevereiro o governo cai. A direita do seu partido, o
Partido Democrático (PD), com o objetivo prioritário de
"combater a Legião Vermelha" retira-lhe a confiança.
(HP p.631e 628). O novo governo "moderado", também do PD,
tenta conciliar medidas do anterior com os desejos da UIE. (TCP p.149) Nas
eleições seguintes ainda em 1925 o PD tem maioria absoluta;
monárquicos e católicos perdem lugares.
A direita "liberal" e a UIE apostam decididamente no golpe. Temem a
ascensão da esquerda e a mobilização popular bem viva com
Domingos dos Santos. Querem a passagem urgente do liberalismo
oligárquico praticado pela maioria dos governos republicanos,
anti-populares e instáveis, para a ditadura oligárquica, dominada
pelos interesses dos monopólios e latifúndios. O seu lema era a
"Salvação da Pátria", isto é, dos seus
exclusivos interesses como se viu. Hoje, o lema é a
"Salvação Nacional", os objetivos não são
muito diferentes.
2 –O PAPEL DE CARMONA E OS OBJETIVOS DA OLIGARQUIA
Carmona foi PR de julho de 1926 a abril de 1951, data do seu falecimento. A
propaganda fascista fazia dele uma personagem bondosa, um simpático e
inofensivo "corta fitas" fazendo festinhas às crianças.
Esta imagem é falsa. Carmona tornou-se de facto um adorno do
salazarismo, depois de ter colocado Salazar no poder absoluto e ser instaurado
o fascismo.
O papel político de Carmona foi o de um exemplar intriguista, eliminando
a contestação republicana e simples vestígios de
democracia até a ditadura ser implantada com o apoio da oligarquia
financeira, monopolista e latifundiária e da hierarquia católica.
Salazar contestado pelos sectores civis e militares republicanos deve a sua
ascensão a Carmona: tinha sido o homem escolhido pela UIE e pela alta
hierarquia católica, mesmo a nível do Vaticano.
Um padre encarregado de informar confidencialmente o Papa sobre a
situação da Igreja e sobre as personalidades que pudessem ajudar
a sua causa estava em Portugal. É este padre que diz a Salazar: "A
mim não me enganas. Por detrás dessa frieza, há uma
ambição insaciável". Perante as
hesitações de Salazar em aceitar o cargo de ministro das
Finanças em 1928, insta-o a "que não pode furtar-se ao
cumprimento do seu dever" (S FN, vol 1, p.330 e 337)
A Republica deixara as contas públicas equilibradas, a ditadura entre
1926 e 1928 leva-as ao descalabro. Salazar, é promovido a "mago das
finanças" com poderes absolutos, a democracia "suspensa"
e a repressão assumida como forma de gestão pública.
Sob a mão de Carmona lugares chave nas forças armadas, no
aparelho de Estado, nas forças de segurança, são entregues
a apoiantes do fascismo. A nível político tratava-se de
estabelecer um consenso anti-operário como a UIE pretendia, liquidando o
sindicalismo e o PCP que alargava a sua influência.
De 1927 a 1933, portanto sete anos sob o domínio direto de Carmona,
há registos de 1.972 presos e 1.511 deportados, um total de 3.483
pessoas; além de 200 mortos em combates e 990 feridos. Porém,
pelo menos os quantitativos de presos e deportados estão grandemente
subavaliados. Assim, por exemplo, em anos de intensa repressão, os
registos são claramente insuficientes: em 1926 não há
quaisquer registos de presos ou deportados; em 1930 20 presos e 20 deportados,
que se referem unicamente a uma nota de 3 de dezembro; em 1932 ano de grande
repressão, apenas quatro presos. Em 1928 contam-se 150 presos para o ano
inteiro, porém ente número refere-se a uma única data: a
revolta do 4 de julho!
Só com a criação da PVDE em 1933 (antecessora da PIDE)
há registos mais ou menos sistemáticos das prisões. Assim,
entre o golpe de 1926 e 1939, registam-se por motivos políticos mais de
13 mil presos e deportados, cálculo muito subavaliado que não tem
em conta as prisões, espancamentos, brutalidade policial e outras
vítimas extra judiciais no período. Há ainda registos de
1.500 deportados para as colónias ou para os Açores, 210 mortes
em combates e 24 nas prisões. (HP vol 7, p. 208)
Era esta a "salvação nacional" e a "ordem nas ruas
e nos espíritos" que o regime estabelecia. Carmona, concretizava
assim um programa fascista, protagonizado por Salazar. A sua ação
vai desenvolver-se em três frentes:
a) Repressão e perseguição aos democratas, destruir o
movimento sindical organizado e o PCP "a grande heresia dos tempos
modernos", no dizer de Salazar, justificando assim a
instauração de uma nova, mas não menos cruel,
inquisição.
b) Unir as direitas em torno de um projeto comum.
c) Neutralizar os militares republicanos mesmo de direita (SP p.70 e seguintes).
Ao contrário do que propaganda fascista veiculava, bem como o
branqueamento atual, de 1926 a 1932-33, viveu-se um período de intensa
contestação e luta contra o fascismo pelas correntes militares
republicanas, pelo movimento operário, pela intelectualidade
progressista. A sua derrota deve-se sobretudo a conceções de
"golpismo" alheado das massas e voluntarismo anarquista.
Devido à intensa luta contra a ditadura, além das
dissidências no seu interior, apenas em 1932 Salazar é chefe do
governo. Carmona apoia-o sempre, até ao ponto de rutura com seus
apoiantes da primeira hora. Em 1933, é plebiscitada nova
Constituição, num ambiente de censura,
perseguições, exílios. O "corporativismo"
fascista é formalmente instaurado, com a designação de
"Estado Novo".
3 - O QUE SE OBTEVE?
A teoria política de Salazar está bem expressa no seguinte: A
"adulação das massas" pela criação do
"povo soberano", não deu ao povo nem influência na
marcha dos negócios públicos, nem aquilo que o povo –
soberano ou não – mais precisa, que é ser bem
governado". (HP vol 7, p. 198) Sabemos o que foi ser "bem
governado", mas estas mesmas ideias estão presentes nas
objurgatórias de certos "comentadores".
O "Estado Novo" exprimia confessadamente o ódio classista
à iniciativa popular que a revolução republicana
permitira. O país mergulha na repressão, atraso, miséria:
foi o resultado da entrega do país aos "interesses
económicos".
O lema do clerical fascismo salazarista era: Deus, assente na
superstição e ignorância popular; Pátria, entregue
à oligarquia nacional e estrangeira com o povo submetido a cruel
repressão; Família, vegetando na pobreza, miséria,
tuberculose e alcoolismo.
Eis a "ordem" oligárquica: A propaganda fascista chamava a
isto: "Caminhando para uma vida melhor". Salazar falava na
"restauração e desenvolvimento dos valores
espirituais". Mas que valores espirituais? A propaganda esclarece:
pretende-se "contra as ambições doentias do homem das
cidades" a "simplicidade da vida nas aldeias" "onde a
miséria total é mais rara, não há dinheiro, falta
por vezes a roupa necessária, mas há sempre uma côdea de
pão e um caldo" (António Ferro). (P 30, p. 157)
O que se obteve foi uma "onda lamacenta de miséria", como
constatava a "Indústria Portuguesa" (P 30, p 123), e
repressão policial. Eis o êxito do "mago das
finanças".
Relatórios confidenciais das autoridades distritais dão conta
"do enriquecimento de alguns, da grande falta de trabalho, da
miséria cada vez maior" ou "da extrema situação
de miséria da classe operária no Alentejo (PPG, p 169). Um
relatório da DG Indústria falava da existência
miserável dos operários, escaveirados e maltrapilhos vivendo sem
quaisquer condições de salubridade (PPG, p. 208). Ao mesmo tempo
diplomatas franceses falam da fome e da "população
miserável" portuguesa, o embaixador britânico menciona a
corrupção e as condições caóticas do mercado
interno. (PPG, p. 276, 277)
"Centenas de milhares de indivíduos (os mendigos) fervilham por
toda a parte, bandos de pedintes infantis, legiões de prostitutas,
crianças a fazer a ronda dos caixotes do lixo" (PPG, p.343).
Marcelo Caetano referia-se no início dos anos 40 a: "analfabetismo,
alcoolismo, doenças contagiosas". (PPG, p. 368)
Em Braga o governador Civil relatava que a situação
económica apenas se tinha agravado para os pobres "desencadeando
calamidades quanto a habitação, mendicidade, jogo,
prostituição, hospitalização". (PPG, p. 344,
345)
A "obra grandiosa do Estado Novo" refletia-se na carência de
cuidados de saúde e hospitais, mortalidade infantil e maternal,
esperança média de vida ao nível do "terceiro
mundo". Eis o resultado do "equilíbrio das contas
públicas" hoje aplaudido pela direita. A filosofia era que
só eram pobres porque não queriam trabalhar; hoje porque lhes
falta "empreendedorismo".
O ensino público regride para três anos. Salazar explica:
"Considero até mais urgente a constituição de vastas
elites do que ensinar toda a gente a ler. É que os grandes problemas
nacionais têm de ser resolvidos, não pelo povo, mas pelas elites
enquadrando as massas" (SP, p.180) Vemos em todos estes aspetos, seja no
ensino seja na questão da pobreza e do desemprego, esteios do atual
pensamento da direita.
Em "Rumo à Vitória", de 1965, Álvaro Cunhal,
traça exemplarmente o quadro da situação de atraso,
repressão e miséria em que o país permanecia apontando
causas e soluções. Centenas de milhares de portugueses emigram,
em grande parte de forma clandestina, fugindo à miséria, à
repressão, à guerra colonial, ao desemprego nos campos. O
analfabetismo campeia. Em 1970, 15 % do PIB eram remessas de emigrantes.
O país sob o regime do "maior estadista" torna-se alvo de
troça e desprezo na Europa. Mesmo nos finais dos anos 60 a escassos
quilómetros de Lisboa, o ambiente era como se dizia "terceiro
mundista". Um francês manifestava então ao autor a sua
opinião sobre Portugal: "com este governo, vocês tornam-se o
museu dos povos primitivos na Europa".
Hoje propagandistas da direita exibem na TV gráficos elogiando o
"equilíbrio" das contas públicas nesse
período…
4 – ONTEM E HOJE
As semelhanças entre a política de direita e a do fascismo
são gritantes. Salazar definia então como princípio
fundamental para o trabalhador consciente "trabalhar mais e consumir
menos". (PPG, p.362) Eis em toda a linha expressas as políticas de
austeridade.
O objetivo da direita de "Reestruturar o Estado", não anda
longe do "Estado Novo", que se definia com "não
parasitário nem social, no sentido de ter como finalidade distribuir a
riqueza nacional", pois "o social não pode sobrepor-se aos
"interesses nacionais". (PPG 367) Argumentos muito semelhantes aos de
hoje para destruírem as funções sociais do Estado, sempre
colocadas em termos de "não há dinheiro", exceto para
satisfazer a especulação e a fraude e sem tributar o grande
capital.
A filosofia era que "a melhoria das condições de vida da
classe trabalhadora é sobretudo um problema de aumento da
produção e de organização dos mercados e não
um problema de redistribuição de riqueza". Aos trabalhadores
havia simplesmente que proporcionar "um salário humanamente
suficiente" (!) "criando no operariado a função de
colaborador consciente do seu chefe" (PPG 362) Formulações
que em nada se distinguem das que atualmente a direita difunde.
Com o movimento sindical perseguido, os trabalhadores sujeitos a
privações, o argumento dos "custos no trabalho" servia
para os trabalhadores serem levados a aceitar o que quer que fosse para
manterem o emprego.
O mesmo argumento encontramos hoje nas confederações patronais
para manterem a precariedade sem limites legais e liquidarem a
contratação coletiva já que, ontem como hoje, a direita
considera ser melhor ter emprego precário e mal pago que não ter
nenhum.
Como se vê, o objetivo ideológico da direita é sempre
procurar nivelar pelo mais baixo possível e que os explorados assumam
como estratégia de sobrevivência os critérios dos
exploradores.
O "diálogo corporativo" com "sindicatos nacionais"
de obediência ao governo e a prepotência patronal com o poder do
seu lado, foi uma ficção: desrespeito pelos horários de
trabalho, baixa de salários, despedimentos arbitrários,
condições de saúde e segurança desprezados.
A atual concertação social do governo da direita já pouco
ou nada se distingue da conciliação de classes que o
corporativismo pretendia. A negociação é inexistente ou
mera cosmética para o governo impor os ditames da oligarquia, agora
escudada na troika.
Os ordenados mínimos fixados em 1935, serviram (ontem como hoje) para o
patronato baixar salários. Em 1947 e em 1949, um homem do regime, Daniel
Barbosa, evidenciava que os salários tinham descido abaixo do
mínimo de sobrevivência. (PPG 356 e 357)
Numa "Mensagem ao sr. Presidente do Conselho" os Sindicatos Nacionais
nos anos 40 exprimiam "a miséria de muitos em contraste com poderio
financeiro e o enriquecimento desenfreado de um reduzido escol" e "o
crescimento da riqueza de alguns à custa de todos". Pediam
então para o governo "mudar de políticas". (PPG 364)
Faz-nos lembrar a UGT, nos seus apelos ao governo no mesmo sentido. Mas a UGT,
com linguagem muito mais suave…
Apesar da repressão fascista, as greves e reivindicações
sucedem-se, os grevistas são acusados de "minar a ordem
económica e social estabelecida". As gentes da
"situação" procuravam demonstrar a "sem
razão" das reivindicações operárias,
"ainda por cima por parte de sectores dos mais bem pagos". (PPG 377)
Eis o que nos traz aos dias de hoje, com a propaganda contra as greves e lutas
de "privilegiados" que têm contratos coletivos de trabalho e
salários acima da média, prejudicando os desempregados. A
hipocrisia política da direita parece não ter limites…
A crise que a oligarquia originou não é um acidente, é uma
consequência direta das suas políticas neoliberais tornando-se uma
oportunidade para combater a democracia, as iniciativas e ações
populares.
Ontem como hoje temos o "elogio da pobreza virtuosa", que o
desenvolvimentista Ferreira Dias contestava (PPG 424), com o governo a elogiar
"os sacrifícios dos portugueses", escamoteando, que esses
sacrifícios não são apenas inúteis mas
contraproducentes.
Apesar das duras condições em que eram realizadas, as lutas dos
trabalhadores conseguem melhores condições e melhores
salários, obrigam o regime a recuar. O temor pelo seu recrudescimento e
pela crescente influência do PCP, obriga o governo a cedências.
Certos sectores industriais compreendem que o aumento da produtividade e da
produção de mais-valia, não era compatível com as
condições de semi-escravatura dos trabalhadores e vão
aceitando reivindicações de melhores condições de
trabalho e salários. Compare-se com a atual situação na
"concertação social" acerca do aumento do
salário mínimo: apesar do acordo das confederações
patronais não é aceite pelo governo.
5 - HOJE E ONTEM
Cavaco e a sua "salvação nacional" foi uma tentativa de
comprometer o PS num mesmo programa político dominado pela direita,
instituindo o partido único neoliberal. Declara então: "os
portugueses tirarão as suas ilações sobre os agentes
políticos se não houver acordo". A direita diz que
"foram lançadas sementes"…De quê?
Cavaco tentava assim criar um sucedâneo da União Nacional
salazarista ou da ANP marcelista, com políticas à partida
definidas pela agenda de total submissão à troika e aos
"mercados" da especulação e usura, sempre em nome do
"superior interesse nacional".
Passos Coelho, a quem o PS dispondo-se ao "consenso" ofereceu
credibilidade e uma renascida segurança, tirando o governo e o
próprio PR do atoleiro para onde as suas políticas os tinham
levado, fala sem pudor em "união nacional". Não
é uma maneira de falar, é muito pior: é uma maneira de
pensar, associando-se ao branqueamento e à difusão de
expressões conotadas com o salazarismo.
Situação que conduziria, tal como no salazarismo, a
eleições sem permitirem alternativas políticas, à
Constituição alterada de acordo com os desejos da oligarquia,
podendo ainda ser subvertida por leis avulsas.
O PS não entende que a UE é uma entidade reacionária, que
já se encaminhou para o domínio neocolonial-neofascista da
potência hegemónica, a Alemanha. Os tratados da UE estabeleceram
uma "contra revolução preventiva" "uma
construção visando contrariar preventivamente os reveses que a
ordem capitalista poderia ter da parte dos movimentos sociais e
políticos da classe trabalhadora" " A UE é "uma
entidade política de soberania fragmentada, que não vê a
sua unidade política senão garantida pela burocracia de Bruxelas
submetida à finança internacional" (EFFE p.27 e 90)
A Revolução de ABRIL trouxe para Portugal respeito,
admiração, progresso. Hoje, a política de direita faz-nos
regressar a situações da ditadura. O desprezo pelo nosso
país exprime-se no qualificativo de PIGS, preguiçosos e
gastadores, que a direita europeia pôs a circular para os povos mais
vulneráveis submetidos às suas iníquas políticas.
P. Coelho, assume-se como defensor dos interesses dos especuladores
internacionais: "O país não precisa de gente que acalente a
perpétua vontade do Norte da Europa passar a pagar as nossas
dívidas" – declarou em julho perante o CN do PSD, a que a
comunicação social assistiu. Sublinhe-se a expressão de
conteúdo fascista: "o país não precisa de
gente". Eis como um governo sem legitimidade real trata os que se
opõem às suas políticas de submissão aos interesses
estrangeiros.
O governo neoliberal de Cavaco criou nos anos 80 as condições
para a destruição da indústria e da agricultura e o
desmantelamento das pescas, a troco das transferências de verbas da CE
(UE). A condecoração de ex-pides e a recusa de
subvenção a Salgueiro Maia, mostraram ser o homem com que a
oligarquia mais podia contar.
Neste contexto, não surpreende que António Borges (ex-assessor do
governo e ex-quadro superior da megafraudulenta Goldman Sachs), que afirmara
"não ser possível fazer reformas com a gritaria da
oposição", tenha merecido elogio fúnebre como
"um dos maiores economistas da sua geração". No
entanto, a morte de Urbano Tavares Rodrigues, um dos maiores escritores da sua
geração, internacionalmente prestigiado, tenha sido ignorada em
Belém.
Hoje, um governo com o apoio de Cavaco, assume-se perante a atual
"UIE" como o garante do projeto anticonstitucional, formalizando a
destruição do projeto económico e social da
revolução portuguesa. Um governo que encaminha o país para
o subdesenvolvimento económico, político, social e cultural, numa
via semelhante à do fascismo: um país sem cidadãos, ou
antes, cidadãos marginalizados, potencial ou realmente perseguidos.
Pelo espírito de sacrifício e dedicação sem limites
à causa da liberdade e do progresso do nosso povo e do nosso
país, o PCP tornou-se "na longa noite fascista" o Partido da
esperança. Esperança que hoje se expressa na defesa dos valores
de ABRIL.